Dois dos cinco rapazes que foram mortos em um confronto com a Polícia Militar (PM) na madrugada desta sexta-feira (11), em Curitiba, eram irmãos e moravam no Jardim Ana Maria, na cidade de Colombo, na região metropolitana. Entre os jovens mortos também estavam dois adolescentes, um de 14 e outro de 17 anos.
Familiares de Thobias Rosa Lima, de 19 anos, e do irmão dele de 17 anos, estiveram nesta manhã no Instituto Médico Legal (IML) para fazer o reconhecimento dos corpos. Além dos irmãos, os corpos do outro adolescente de 14 anos, e de Ederson Miranda, 22, foram reconhecidos durante esta sexta-feira no IML. Apenas um corpo não havia sido identificado até as 17h20.
De acordo com a PM, os cinco jovens foram mortos depois de uma troca de tiros com policiais, que ocorreu no bairro Alto da Glória, em Curitiba. O grupo teria sido perseguido depois de ser flagrado em um Volkswagen Gol roubado e ainda teria furado uma barreira policial antes do tiroteio.
A irmã de Miranda, que não quis ter o nome divulgado, acredita que todos os ocupantes do Gol se tratam de amigos do irmão. Segundo ela, o jovem saiu de casa por volta das 23 horas de quinta-feira acompanhado de Lima e de outros dois conhecidos. "Somente o homem que dirigia o carro em que eles saíram é que eu não conhecia", conta. Ela acrescenta que não sabia para onde iam, e que não tinha conhecimento de que o veículo em que o grupo estava era roubado.
A mulher diz que o irmão era operário de uma construtora em Curitiba havia quatro anos, e que soube da notícia da morte dos amigos pelo rádio. "Ouvi de manhã que cinco jovens em um Gol branco tinham sido baleados e logo viemos para cá", relata.
Versão da polícia
As informações oficiais da PM dão conta de que o veículo foi identificado, por uma equipe do 20º Batalhão, como roubado, por volta das 23h30, na Rua Mascarenhas de Moraes, no Santa Cândida. "Os policiais, então, acionaram outras equipes pelo rádio, e deram início a um acompanhamento tático", descreve o coronel Jorge Costa Filho, comandante do policiamento da capital. Segundo ele, logo que perceberam os carros da PM, os ocupantes do carro dispararam contra os policiais.
O veículo teria percorrido diversas ruas do bairro, que o tenente-coronel não soube detalhar, antes de furar uma barreira que havia sido montada por uma equipe da Rondas Ostensivas Tático Móvel (Rotam) na Avenida João Gualberto, no Alto da Glória. "Um pouco mais a frente, na Rua Nicolau Maeder, o Gol bateu contra uma mureta. Os suspeitos desceram e pularam o muro de um terreno para sair do outro lado da quadra", conta Costa. "No entanto, já tínhamos equipes cercando todo o terreno e eles não conseguiram fugir".
Segundo o coronel, oito policiais participaram da troca de tiros, mas nenhum ficou ferido. O tiroteio terminou por volta das 0h30, com os cinco jovens baleados. Todos foram levados, nos próprios veículos da PM, ao Hospital Cajuru, onde chegaram mortos. O Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (Siate), do Corpo de Bombeiros, não chegou a ser acionado para deslocar ambulâncias para o local. "Nesses casos, fazemos o transporte nas próprias viaturas para atender os feridos o mais rapidamente possível", justifica Costa.
Documentos
Ainda de acordo com a PM, nenhum dos feridos portava documentos. Os corpos deram entrada às 3 horas no IML como "desconhecidos", com idade entre 20 e 25 anos. Além do veículo que os jovens utilizavam, os policiais apreenderam cinco revólveres calibre 38, com numeração raspada, que estariam de posse dos mortos.
Para a irmã de Miranda, um dos mortos no confronto, alguns detalhes da versão policial causam estranheza. Ela afirma que o irmão não tinha arma e que ele sempre saía de casa com documentos. "Pelo IML fomos informados que todos eles estavam sem documentação", diz. "Mas ele não deixou nada lá na casa dele. Ninguém sabe dizer onde foi parar".
Miranda era um dos mais novos de uma família de 12 irmãos e morava com Davi, um dos amigos com quem saiu na noite de quinta-feira. Embora estivesse separado, a ex-mulher dele esperava um filho seu, segundo a irmã. Os outros dois amigos que saíram junto com ele moravam em outra casa, a uma quadra.
Investigação
O coronel Jorge Costa Filho determinou nesta sexta-feira a abertura de um Inquérito Policial Militar (IPM) para investigar a conduta dos policias na ação que terminou na morte dos cinco suspeitos. Segundo ele, o procedimento é padrão em todo caso em que há confronto policial que resulta em morte de um civil. A investigação tem 40 dias de prazo para ser encerrada e será acompanhada pelo Ministério Público do Paraná (MP). De acordo com Costa, todos os oito policiais que participaram do tiroteio ficarão afastados das atividades nas ruas neste período. "Já estou com os oito revólveres comigo para a realização da perícia", conta.
O coronel conta que alguns detalhes da ocorrência, como o número de disparos realizados pelos policiais e pelos suspeitos, precisarão de tempo para serem revelados. O local, a data e as circunstâncias em que o veículo em que os jovens estava foi roubado também não foram detalhados pela polícia. "De imediato, identificamos apenas que se tratava de um carro com alerta de roubo", diz. "As informações preliminares são de que o automóvel foi levado no fim de agosto, aqui da região de Curitiba".
Apesar de ter inicialmente 40 dias de prazo, o IPM pode ser prorrogado por mais 20, caso o Comando de Policiamento da Capital julgue necessário. "Os procedimentos de documentação da PM são os mais rápidos de serem concluídos, mas temos de esperar laudos do Instituto de Criminalística e do IML". Caso sejam responsabilizados, os policiais militares podem responder pelos homicídios na Justiça comum.
Outros casos
Durante este ano a PM também teve outros casos de troca de tiros contra suspeitos. No mês de maio, uma tentativa de resgate no Fórum de São José dos Pinhais, na região metropolitana, terminou com a morte de William Lopez Clausen. No mês de junho, um rapaz acusado de praticar uma série de roubos em mercados de Curitiba e região trocou tiros com a polícia. Ele chegou a ser encaminhado ao Hospital Cajuru, mas não resistiu e morreu.
No dia 9 de abril, quatro homens foram mortos durante uma troca de tiros com a PM, após terem cometido um assalto no Jardim Social. No mesmo mês, manifestantes realizaram um protesto pela morte do repositor de supermercado Diogo Chote, de 24 anos, que foi atingido por quatro disparos. Na época, policiais afirmaram que houve uma troca de tiros.
Em março, seis homens de um mesmo grupo criminoso foram mortos pela PM, em três confrontos sucessivos em Colombo. No final do mês de fevereiro, um suspeito de assalto também reagiu a tiros a uma ação policial e foi morto.