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Dona Canô morre, aos 105 anos, na Bahia

Dona Canô ficou internada por seis dias e na sexta-feira recebeu alta | Eduardo Knapp/ Folhapress
Dona Canô ficou internada por seis dias e na sexta-feira recebeu alta (Foto: Eduardo Knapp/ Folhapress)

Claudionor Vianna Telles Velloso, 105 anos, a Dona Canô, morreu nesta terça-feira (25) em sua casa, na cidade de Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano.

O velório de Dona Canô será realizado a partir das 19h (de Brasília), no Memorial Caetano Veloso, em Santo Amaro (67 km de Salvador). O enterro será nesta quarta-feira (26).

"O clima está tenso, de muita comoção", disse uma amiga da família, de nome Rose (não quis falar o sobrenome). É ela quem está atendendo ao telefone celular de Mabel Velloso, uma das filhas de Dona Canô.

Ainda segundo Rose, a matriarca morreu por volta das 10h. A família já esperava pelo pior. Tanto que não fez a tradicional ceia de Natal, na noite de ontem, mesmo com todos reunidos, inclusive Caetano e Bethânia.

Na sexta, Dona Canô recebeu alta do Hospital São Rafael, em Salvador, onde apresentou um quadro de isquemia, embora tivesse sofrido uma "leve piora". "O maior desejo de D. Canô é passar este momento da sua vida no seu ambiente familiar", disse o boletim médico, acrescentando que ela havia atingido um estágio de estabilidade hemodinâmica e respiratória "minimamente satisfatório" para garantir a alta hospitalar com assistência domiciliar de "cuidados avançados".

"A idade avançada da paciente e a sua significativa restrição pulmonar e neurológica trazem para ela uma grande limitação funcional. Entretanto, o maior desejo de D. Canô é passar este momento da sua vida no seu ambiente familiar", dizia o texto.

Em 16 de setembro, quando completou 105 anos com grande festa em Santo Amaro da Purificação (a 67 km de Salvador), onde mora, disse não ter medo da morte. "Não tenho, não, meu filho. Acredito em Deus e sempre vivi com a minha família, com pessoas do meu lado, com a casa cheia. Acho que esse é o segredo [da longevidade]".

Figura ilustre Dona Canô nasceu no dia 15 de setembro de 1907, em Santo Amaro da Purificação, na Bahia. Mãe dos cantores Caetano Veloso e Maria Bethânia, dona Canô se tornou uma das personagens mais ilustres de Santo Amaro e do próprio Estado da Bahia. Casou-se em 1930 com José Teles Velloso, mais conhecido por Zeca ou seu Zezinho, funcionário público dos Correios, que morreu em dezembro 1983, aos 82 anos. Teve oito filhos, sendo a primogênita Maria Clara, e a cantora Bethânia a mais nova.

Influência política

Dona Canô ganhou mais prestígio em Santo Amaro (BA) do que qualquer político, empresário ou líder religioso da cidade. Na cidade de 60 mil habitantes, localizada no recôncavo baiano (a 71 km de Salvador), ela era considerada mais influente até do que seus dois filhos ilustres, Caetano Veloso e Maria Bethânia.

Em época de eleição municipal era assediada por políticos de todos os espectros, que buscavam seus conselhos. Dona Canô era a primeira a ser ouvida pelo prefeito quando o município precisava tomar uma decisão, e também recebia visitas de empresários que queriam sua bênção para se instalar na cidade. Sua casa, a de número 179 na avenida Vianna Bandeira, no centro, é ponto turístico de Santo Amaro. Dona Canô possuía uma forte e antiga amizade com o senador Antônio Carlos Magalhães (ACM) e, por extensão, com seu grupo de aliados, que mantiveram a hegemonia do poder no Estado durante décadas. Ela esteve presente na missa em homenagem em homenagem a ACM, que faria 80 em 2007, mas morreu em junho daquele ano. A amizade que desfrutou com o influente ACM permitiu a dona Canô conseguir diversos projetos de melhoria para Santo Amaro, como a reforma e iluminação da igreja matriz da cidade, ou a construção de um teatro com 380 lugares. O governo do Estado também lhe enviava, sempre que solicitado, doações de artigos como cadeiras de rodas, colchões e agasalhos, que Dona Canô distribuía para centenas de pessoas que se aglomeram na porta de sua casa. Apesar de tanta influência, a matriarca dos Velloso era humilde: "Se hoje me reconhecem é por causa dos meus filhos. Eu não sou nada", afirmou ela em entrevista à Folha de S.Paulo, em 2000. A ligação de Dona Canô com Lula também é notória. Em 2002, nas vésperas da votação que daria a Lula seu primeiro mandato presidencial, ela telefonou ao então candidato, e lhe parabenizou pela campanha, chegando inclusive a cantar o jingle da campanha de Lula no telefone, acompanhada de sua família. Desautorizando Caetano Lula também foi o motivo de uma das últimas polêmicas protagonizadas por Dona Canô, em 2009, desta vez envolvendo seu filho. Caetano disse em entrevista ao jornal "Estado de São Paulo" em 5 de novembro, que apoiava a candidatura de Marina Silva à presidência da República, porque ela "é inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro." A declaração obteve grande repercussão, o que fez Dona Canô manifestar intenção de ligar ao presidente para pedir desculpas, em nome de Caetano. "Lula não merece isso. Quero muito bem a ele. Foi uma ofensa sem necessidade. Caetano não tinha que dizer aquilo. Ele é só um cantor. Vota em Lula se quiser, não precisa ofender nem procurar confusão."

A polêmica foi encerrada poucos dias depois, quando Lula ligou pessoalmente para Dona Canô para perdoar Caetano pela declaração. "Não fique chateada, preocupada, porque gosto muito da senhora e gosto do Caetano também. Está tudo bem, essas coisas acontecem", disse o ex-presidente.

Sincretismo

Religiosa, liderou durante anos a Novena de Nossa Senhora da Purificação, popularmente conhecida como Novena de Dona Canô, tradição católica de quase três séculos que acontece sempre na última semana de janeiro. Essa devoção não a impediu de comandar também as baianas adeptas do candomblé na festa da lavagem da escadaria da igreja.

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