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Tereza dos Santos foi promovida a delegada em 1975, por força de decisão judicial | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Tereza dos Santos foi promovida a delegada em 1975, por força de decisão judicial| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

"Modernidade"

Dez anos depois, estado criou a primeira Delegacia da Mulher

O Diário Oficial do Estado publicou em 5 de novembro de 1985 um decreto que criava a Delegacia da Mulher. Por ainda ser a única delegada na época, Tereza dos Santos foi chamada para assumir a especializada. E trabalho era o que não faltava no expediente da unidade recém-inaugurada. Tereza calcula que mais de 40 queixas diárias eram registradas pela equipe. "Não era raro entrar às oito da manhã e ir embora às duas da madrugada. Muitas mulheres recorriam a nós. Tínhamos que dar tempo e espaço para as nossas ‘clientes’ desabafarem", recorda.

A criação de um órgão especial em defesa da mulher bateu de frente com costumes machistas que imperavam em boa parte da sociedade da época. "Era comum os maridos intimados se recusarem a depor porque ‘não pisavam em delegacia de mulher’. A gente era obrigada a mandar buscar. Quando fizemos disso uma rotina, todo mundo começou a vir". Tereza começou o trabalho com três escrivãs, uma detetive e 12 agentes. Hoje, a unidade de Curitiba funciona com três delegadas e 44 agentes. Outras 15 cidades do estado contam com delegacias da mulher.

51 mulheres ocupam o posto de delegada no Paraná. Algumas comandam divisões importantes, como Maritza Haisi, titular da Delegacia de Homicídios da capital. Ela entrou na polícia em 1994, ano em que Tereza se aposentou. "É uma carreira apaixonante. Homem ou mulher, estamos todos expostos às mesmas possibilidades e aos mesmos dramas."

O sonho de infância de Tereza Ermelino dos Santos era ser policial. Uma perspectiva pouco plausível para uma jovem negra e pobre nascida na provinciana Curitiba dos anos 40. Mas ela foi à luta. E conseguiu ir mais longe do que imaginava. Em 1975, ano em que a ONU instituiu o Dia Internacional da Mulher, Tereza se tornou a primeira delegada de polícia da história do Paraná. Sinal de que a sociedade da época começava a dar mais atenção para os anseios feministas.

A carreira policial começou uma década antes, em 1964, quando Tereza ainda estava no colegial. Entre o início como agente de segurança até a aposentadoria 30 anos depois, ela passou por diversas unidades da Polícia Civil. Como delegada, o primeiro posto foi em Londrina. As datas, confessa, não lembra muito bem. Passou também por municípios do interior, distritos de Curitiba e setores especializados. Alguns desses locais, como as Delegacias de Menores e de Costumes, nem existem mais.

Os problemas que hoje tomam boa parte do tempo e da energia da polícia praticamente não existiam. "Tráfico de drogas, por exemplo, era uma coisa rara. Mas acho que a essência da profissão não mudou", observa. Segundo ela, o trabalho básico sempre foi receber a denúncia, investigar e prender.

Sem sossego

Cedo, porém, Tereza percebeu que a ideia de uma mulher em cargo de chefia era um tanto quanto absurda para figurões da segurança pública. Como na época a lei permitia que apenas homens fossem promovidos além do posto de comissário (hoje extinto), ela virou delegada por meio de um mandado de segurança da Justiça.

Mesmo depois de empossada, no entanto, não teve sossego. "Sofri ‘tortura’ por parte da cúpula [da polícia]. A cada quinze dias vinha alguém dizer que eu podia ser exonerada, que a qualquer momento podiam tirar o meu cargo", conta. Dentro da delegacia, porém, a coisa era diferente. "Mesmo no trato com os bandidos, ser mulher não era um problema para mim. Com meus subalternos, muito menos. Todos sempre me respeitaram", garante.

Mesmo depois de deixar a polícia, Tereza não parou de trabalhar. Até pouco tempo atrás, esta senhora de 70 anos ainda atuava como advogada. Após quase 50 anos dedicados à lei, resolveu se aposentar e hoje vive em Aracaju (SE). De Curitiba restaram a saudade dos amigos e as boas histórias para contar.

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