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Lesões afetam aprendizagem

O médico pediatra e presidente do Conselho Municipal Anti­drogas de Foz do Iguaçu, Camilo Antônio de Lima, explica que a droga causa lesão nos neurônios e compromete o rendimen­­to escolar de crianças e ado­­­lescentes.

Segundo o médico, os primeiros neurônios atingidos são aqueles que surgem aos 7 anos e têm relação com o aprendizado cognitivo. Por isso, um dos primeiros sinais do uso de drogas é o desempenho escolar. A criança começa a ir mal na escola e surgem os déficits de aprendizado, por causa das lesões neurológicas.

Para Lima, é preciso diagnosticar a dependência química o mais cedo possível para que a criança e o adolescente sejam encaminhados ao tratamento. E essa tarefa cabe principalmente aos professores. "A criança que usa droga precisa de um olhar diferente. Ela tem uma doença e precisa ser socorrida o mais cedo possível", afirma.

A questão, segundo o médico, é complexa porque há casos de crianças e adolescentes que começam a usar drogas por influência da própria família. Em Foz do Iguaçu, outro problema é a inserção precoce de jovens no trabalho informal. Na rua, eles acabam tendo contato com traficantes e passam a usar entorpecentes. Os mais comuns são a maconha e o crack.

Difícil adaptação

Dois anos em busca de vagas

Há dois anos, a diarista Clarisse Moraes da Silva, 51 anos, tenta colocar o filho na escola. O adolescente de 16 anos foi apreendido por pequenos furtos, está inscrito no programa de Liberdade Assistida e tem dificuldades de aprendizagem. Ele já passou por entidades que atendem crianças e jovens especiais, mas a mãe recebeu um comunicado, informando que o filho não se adaptou. No ano passado, ao tentar colocar o jovem em uma escola municipal, o resultado também não foi promissor. "Toda escola que a gente leva ele é discriminado pelo tamanho e pela gordura", diz.

O menino, que parou de estudar na 3ª série, hoje faz tratamento no Centro de Apoio Psicossocial (Caps). Mas a mãe acha que isso não é suficiente. "Hoje gostaria que ele estudasse", conta.

O uso precoce de drogas e os problemas de aprendizagem comprometem a recuperação de adolescentes em conflito com a lei. Com dificuldades de concentração e déficit cognitivo provocado pelos entorpecentes, jovens de até 18 anos não conseguem frequentar a escola e cumprir as medidas socioeducativas estabelecidas pela Justiça. O diagnóstico é comum em meninos e meninas atendidos pelos programas socioeducativos Liberdade Assistida (LA) e Pres­tação de Serviço à Comunidade (PSC). Os adolescentes inscritos nestes programas têm de 12 a 18 anos, cometeram atos infracionais, mas cumprem pena em liberdade por determinação da Justiça, ao invés de ficarem internados em centros de socioeducação. Frequentar obrigatoriamente a escola, prestar serviços a instituições públicas e ser acompanhado por uma equipe de psicólogos, assistentes sociais e educadores são algumas das atividades estabelecidas pelos dois programas. No entanto, na prática, o propósito de aproximá-los da sociedade nem sempre dá certo porque boa parte ainda usa drogas. Assim, eles acabam abandonando a escola ou frequentam irregularmente as aulas por apresentarem dificuldades de aprendizagem relacionadas à concentração, cálculos e interpretação.

Em Cascavel, pelo menos 40% dos adolescentes dos programas LA e PSC declaram-se usuários de drogas. Na avaliação da coordenadora dos programas, Marizete de Fátima Rodrigues, a dependência química é fator que atrapalha a recuperação. "O fato de o adolescente ser usuário implica em 100% na recuperação. O uso do entorpecente faz com que ele não consiga ficar quatro horas em um curso", diz. Na análise do psicólogo Cristiano de Souza, que atende os jovens pelo programa em Cascavel, a evasão escolar precoce também acaba facilitando a inserção do adolescente no crime. "Isso acaba sendo um facilitador para ele reincidir", afirma.

Em Foz do Iguaçu, dos 330 adolescentes atendidos pelos dois programas, 65 são considerados casos complexos por apresentarem problemas de cognição devido à predisposição genética ou pelo uso de drogas, principalmente a maconha. O psicólogo Samuel Cabanha atende os adolescentes e diz que muitos deles têm dificuldade para alterar padrões de conduta em razão do uso de substâncias psicoativas. Segundo o psicólogo, alguns adolescentes já chegam ao programa com déficit cognitivo que acaba sendo potencializado pela droga. "Primeiro teria de cortar a droga para depois tratar. E cortar a droga é um problema, devido ao comprometimento do organismo com o uso. A droga mantém o déficit e a dificuldade do jovem se emancipar intelectualmente", diz Cabanha.

Entre os exemplos está um jovem de 15 anos. Usuário de maconha, ele tem dificuldade para ler, escrever e durante o atendimento não soube responder a própria data de nascimento.

Casos como este precisariam ser encaminhados para escolas especiais mas, pelo menos em Foz do Iguaçu, não há vagas disponíveis. Segundo a assistente social e coordenadora dos programas LA e PSC na cidade, Cristina de Souza Dias, atualmente quatro jovens atendidos estão em lista de espera para serem inseridos na Associa­ção de Pais e Amigos de Excepcio­nais (Apae) ou instituições que atendem portadores de deficiência. No entanto, não há vagas disponíveis. Ela relata também que o preconceito é uma barreira porque os meninos têm passagem pela polícia e alguns, tatuagem pelo corpo.

Dependência

Outro problema apontado pelos coordenadores dos programas é a falta de instituições especializadas em tratar adolescentes com dependência química. Em Foz do Iguaçu e Londrina, por exemplo, não há clínicas ou comunidades terapêuticas para crianças e adolescentes. As alternativas oferecidas pela rede pública são os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e leitos hospitalares para desintoxicação, no entanto, ambos os tratamentos nem sempre surtem efeito para casos graves, principalmente quando se trata dos dependentes de crack. A frequência ao Caps depende também da decisão do próprio paciente e nem sempre o jovem aceita o tratamento. Em Londrina, por exemplo, só há clínicas particulares para adolescentes, cujo custo não pode ser bancado por famílias de baixa renda que têm filhos nos programas, diz a coordenadora, Mariana Meurer.

Tratamento deve ser feito pelos municípios

O governo do estado, por meio da Secretaria de Estado da Crian­­ça e da Juventude (SECJ), diz que o tratamento de adolescentes atendidos pelos programas Prestação de Serviço à Comu­nidade (PSC) e Liberdade Assistida (LA) é de responsabilidade dos municípios, conforme o artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a política de descentralização administrativa.

Apesar da política estabelecida, a SECJ cofinancia os programas em 48 municípios do Paraná. Em 2009, foram repassados mais de R$ 4 milhões em recursos para esses municípios. Por ano, cerca de 7 mil adolescentes são atendidos nas medidas de Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comu­nidade.

O que cabe ao estado, segundo a SECJ, é atender adolescentes em conflito com a lei internados nos centros de socioeducação (Cense) – aqueles que cumprem pena em regime fechado em um período que varia de 45 dias a três anos. Para os jovens internados, o estado paga o tratamento em comunidades terapêuticas, em caso de necessidade.

A secretária de Assistência Social de Foz do Iguaçu, Rosilene Link, reconhece a dificuldade em atender os dependentes químicos juvenis e diz que há um projeto, em parceria com o Conselho Municipal Antidro­gas, para criar uma comunidade terapêutica em Foz para atender meninos e meninas dependentes. "No Brasil inteiro há uma deficiência de clínicas", diz. Segundo Rosilene, o município pretende fazer parcerias com a iniciativa privada para criar o espaço especializado. "Por enquanto, eu só te­­nho verba para bancar a área social. Não tenho como pagar a parte clínica e terapêutica do projeto", diz. Ela ainda diz que pretende reivindicar a ampliação de vagas em escolas especiais para jovens com dificuldades de apren­­­­­­­­­dizagem.

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