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Relação familiar

“É preciso ensinar a educar os filhos”

“Hoje o público e o privado estão se misturando novamente, como na Idade Média.” | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
“Hoje o público e o privado estão se misturando novamente, como na Idade Média.” (Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo)

A substituição do modelo familiar patriarcal, hierárquico e autoritário – notadamente ultrapassado – não ocorreu sem consequências para a sociedade. Segundo a psicóloga Lídia Weber, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Paraná, "os pais mudaram, mas ficaram mais inconsistentes, inseguros e perdidos em sua função parental. Para retomar o controle da situação, ela recomenda que os pais usem de prevenção e intervenção precoce, recorrendo a cursos de treinamento quando necessário, já que os pais precisam aprender a educar os filhos. Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida à Gazeta do Povo.

Por que pais têm procurado cada vez mais a Justiça para resolver conflitos familiares?

Em décadas passadas existia um modelo familiar patriarcal, hierárquico e autoritário, em que o pai mandava e os outros obedeciam (inclusive a esposa). Atualmente a sociedade mudou. O modelo que os pais atuais tiveram de seus pais não cabe mais no mundo pós-moderno, porque hoje não dominamos mais as crianças pelo conhecimento. Elas, muitas vezes, sabem mais do que nós em muitos campos. Há atualmente uma difusão muito grande de técnicas para educar filhos (muitas delas incorretas). A psicologia estuda a interação pais e filhos há mais de 40 anos e, embora não haja um manual único, há, sim, respostas claras sobre o que é efetivo e o que traz prejuízos para educar filhos. Quem pretende ser pai precisa se informar. Só ter sido filho pode não bastar, pois às vezes os modelos que tivemos são errados e, se não tomamos consciência disso, a tendência é repetir – o que se chama de transmissão intergeracional. Os pais mudaram junto com a sociedade. deixaram de lado o modelo autoritário (que não era adequado) e ficaram mais inconsistentes, inseguros e perdidos em sua função parental. O que não se pode esquecer é que milhares de pesquisas no mundo todo demonstram claramente a influência dos pais no comportamento dos filhos, inclusive para comportamento antissocial. Estudos também mostram que ele é crescente e previsível desde muito cedo nos filhos. Logo, as melhores técnicas para prevenção de comportamentos antissociais nos filhos é ensinar os pais a educar seus filhos.

A própria família deve tentar resolver esses problemas, como a questão dos horários domésticos?

Certamente. Colocar a Justiça em questões triviais é confessar a incompetência da parentalidade. É claro que nada é linear no comportamento e pode haver exceções. Além disso, existem diversas variáveis para determinar um comportamento, mas a ciência lida com probabilidade e estatística. As pesquisas revelam que fatores de risco para comportamento antissocial em adolescentes incluem disciplina inconsistente, ausência de supervisão parental e conflitos familiares, enquanto fatores de proteção incluem práticas disciplinares consistentes e afetuosas, monitoria e supervisão constante, comunicação positiva e relacionamento de apoio de pais para com os filhos. É claro que podem haver exceções e que há casos em que deve haver mesmo a entrega da situação à Justiça.

Por que no passado era muito difícil uma família levar à Justiça seus problemas internos, com exceção dos casos de separação, divórcio e cobrança de pensão alimentícia?

O mundo está mais aberto à intimidade das pessoas. Hoje em dia é muito fácil de se expor. Antigamente havia os diários fechados à chave. Hoje os blogs na internet são públicos, há câmeras de vigilância nas ruas, nas escolas, há reality shows. O público e o privado estão se misturando novamente, como na Idade Média. Além disso, pais com modelos fracos, que vieram de famílias com filhos únicos ou dois filhos, não tiveram modelos para educar filhos, estão perdidos em um mundo muito diferente daquele em que seus pais viveram.

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Serviço

Lídia Weber é uma das organizadoras do 1º Simpósio Brasileiro de Família e Desenvolvimento Humano, que ocorre de 19 a 21 de março, no Câmpus Jardim Botânico da UFPR, em Curitiba. O evento vai reunir pesquisadores e profissionais renomados para discutir a relação entre pais e filhos.

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