Ao conversar com a Gazeta do Povo, a senhora Mariana Adôrno Naime, esposa do coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante do Departamento de Operações da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), relatou as dificuldades enfrentadas desde a prisão do coronel por suposta omissão em relação aos atos do 8 de janeiro e questionou a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, de manter o coronel preso, mesmo com evidências que desabonam as acusações.
“Nós estamos sofrendo muito. É uma dor de injustiça, de impotência, porque não podemos fazer nada para tirá-lo dali, embora todos saibam a verdade, toda a população do Distrito Federal sabe. Coronel Naime tem 30 anos de serviço prestado à comunidade do Distrito Federal, trabalhou em diversas regionais. Por onde ele passou todos conhecem a seriedade do trabalho dele, a lealdade”, disse Mariana Adôrno em entrevista concedida à Gazeta do Povo, nesta sexta-feira (8).
Coronel Naime foi preso no dia 7 de fevereiro durante desdobramento da Operação Lesa Pátria, mas só teve denúncia enviada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao ministro Alexandre de Moraes em agosto por meio de uma petição sigilosa.
Em setembro, diferente do relatório da Polícia Militar do DF que atribuiu ao coronel os crimes de prevaricação e inobservância, a Polícia Federal (PF) emitiu um relatório sobre os atos do dia 8 de janeiro no qual nem sequer cita o nome do militar.
O ministro Alexandre de Moraes já negou, pelo menos, quatro pedidos de liberdade feitos pela defesa do coronel Naime.
"São mais de 300 dias sem denúncia aceita. Nós estamos confiantes que o ministro Alexandre de Moraes vai arquivar a denúncia contra ele por falta de materialidade, por falta de provas [...] Já são mais de 300 dias sem ter ele em casa. Tentamos nos adaptar a essa triste realidade. Nós temos filhos com deficiência, um filho que depende da presença física dele, que precisa de estar com ele. A presença é a grande questão. A presença não só física, mas a referência. Então, a gente tem sofrido muito com isso", diz Mariana.
"Eu tenho tentado ser forte o máximo que eu posso para passar tranquilidade para ele (coronel Naime) e para os meus filhos, mas na última semana eu fui internada às pressas. Tive uma crise e fui medicada, mas tive que voltar para casa rápido. Os médicos queriam que eu ficasse (internada) por mais um dia no hospital, mas eu não pude porque tem meus filhos que dependem de mim”, relatou.
A esposa do coronel também se queixa da diferença do tratamento dado ao ex-comandante da PM se comparado com a prisão de outros comandantes que, além de terem a prisão decretada depois de Naime, ganharam o benefício de ficarem detidos nos batalhões. Naime está preso no Complexo Penitenciário da Papuda, no DF, desde setembro.
De acordo com Ricardo Capelli - braço direito do ministro da Justiça, Flávio Dino, que foi nomeado interventor na Segurança Pública do Distrito Federal - o coronel Naime teria retardado propositalmente a linha de contenção da PM. Capelli disse ter visto com “os próprios olhos” os comandados do coronel avançando “lentamente” sobre os manifestantes.
“Ninguém naquela semana (do 8 de janeiro) entrou em contato com ele para falar da possibilidade de manifestação. Ele foi surpreendido apenas no dia 8, depois das 16h30 com uma ligação pedindo socorro e pedindo para ele ir para a Esplanada. De pronto, ele atendeu o pedido de socorro e foi combater junto com seus irmãos de farda", afirma Mariana.
"De fato, ele foi para a linha de frente, para o combate, não medindo esforços, o que derruba essa narrativa de que ele foi omisso, que teve retardo de tropa. Porque todo mundo que trabalhou com ele na linha de frente disse em depoimento que ele agiu conforme a legalidade, conforme a técnica, e foi pela experiência dele que não ocorreu um derramamento de sangue, porque a experiência dele fez com que a tropa avançasse”, disse.
Mesmo de férias no dia 8 de janeiro, Naime deixou sua residência para ajudar a conter os manifestantes. Durante a ação policial, o militar chegou a ser ferido com o disparo de um rojão. Em maio, a PGR enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer a favor da manutenção da prisão do militar.
Coronel Naime tem sofrido com problemas de saúde
Como noticiado pela Gazeta do Povo, Naime já precisou de atendimento médico em decorrência de graves problemas de saúde por diversas vezes durante tempo em que está preso - foram três somente na última semana.
“Ele já estava com diagnóstico de hipertensão e diabetes antes mesmo de ser preso. Foi por isso que ele saiu de licença na primeira semana de janeiro. A missão dele era concluir a posse presidencial e ele concluiu com excelência e entrou de licença para iniciar os tratamentos de saúde", explica a esposa do militar.
"Entre junho e julho, ele começou a se sentir mal, muito mal, sendo que quando ele foi preso no dia 7 de fevereiro, ele entrou em um quadro depressivo. Ele não saía nem para fazer banho de sol, ficava só dentro do quarto. Ficou quase dois meses sem fazer banho de sol. Em julho, ele foi encontrado desacordado. Foi a primeira vez que ele passou mal. Foi levado para o hospital de base para realizar exames. Ele teve hipotensão, a pressão dele chegou a 4 por 6”, contou Mariana.
De acordo com a esposa do coronel, depois desse primeiro evento, a pressão dele começou a oscilar muito.
“Em novembro, ele começou a reclamar de muita dor de cabeça e dormência nos braços, além de náuseas e vômito. Depois do dia 20, ele foi levado para o hospital às pressas com uma crise muito forte de enxaqueca, de dor de cabeça. Foi diagnosticado com um nível de estresse muito elevado e foi medicado, ficou internado, tomou medicação na veia e foi levado de volta. Passaram-se três dias e ele começou com uma dor insuportável no braço, uma dormência e o braço começou a ficar roxo. Aí, foi levado para o hospital também às pressas. Foi diagnosticado com trombose no braço e entrou com tratamento imediato. Começou ali a ter um risco iminente de embolia pulmonar”, disse Mariana.
Atualmente, segundo Mariana, o coronel está recebendo tratamento para a pressão.
CPI do DF sobre os atos do 8/1 isentou coronel Naime
O relatório final da CPI dos atos do 8 de Janeiro da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), divulgado no dia 29 de novembro, isentou o coronel Naime de qualquer responsabilização pelos atos de vandalismo.
“O relatório da CPI junto com o relatório da Polícia Federal apontam que a linha de investigação que a PGR adotou é frágil e que existe outra verdade e essa verdade vai ser restabelecida. É essa nossa confiança. Estamos aguardando também serem apreciados os pedidos de revogação de prisão e um HC (Habeas Corpus) que está na mão do ministro Gilmar Mendes (do STF)”, disse Mariana.
Por ordem do STF, Naime foi suspenso da PM e perdeu parte do salário
Em setembro, o comando-geral da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) afastou o coronel Jorge Eduardo Naime de suas funções e suspendeu o pagamento das gratificações do militar por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com a decisão do Supremo, o coronel será mantido afastado enquanto perdurar o inquérito.
“A situação financeira da nossa família é bastante delicada. Suspenderam o salário dele, suspenderam a função pública e bloquearam os bens. Então, nós estamos nesses últimos quatro ou cinco meses na dependência total das pessoas. Mas eu tenho que agradecer muito pelo carinho. São doações de 50 centavos até doações maiores, sabe? As pessoas têm se prontificado, têm nos abraçado, têm contribuído e feito toda a diferença para conseguirmos manter os tratamentos médicos e a despesa da nossa casa, além da despesa com o coronel, porque ele tem uma despesa lá dentro também, com medicações, com alimentação…”, relatou Mariana.
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