Dezesseis quilômetros de distância do Centro de Curitiba e ar de cidade pequena. A vida ainda é pacata no bairro Ganchinho, zona sul de Curitiba, e faz moradores e visitantes esquecerem que estão na maior cidade do Sul do Brasil. Mas a vida quase interiorana deve mudar até o fim deste ano. A Companhia de Habitação Popular (Cohab) vai entregar 2.796 moradias em dois loteamentos nas proximidades do Contorno Leste. O bairro, que hoje tem uma população de 8.695 habitantes, vai ganhar 10 mil novos moradores, distribuídos em 11 conjuntos residenciais.
Com ruas vazias, quase sem carros ou ônibus, e pequenas vilas cercadas de bosques e riachos, o Ganchinho ainda guarda muitas características de uma Curitiba diferente da metrópole de quase 2 milhões de habitantes. Enquanto bairros mais próximos da região central mais parecem selvas de pedra cercadas de poluição, no Ganchinho a área verde chega a 552 metros quadrados por habitante.
A atual expectativa pela duplicação da população é parte de um processo que já vem ocorrendo desde a última década. Entre os anos 2000 e 2010, segundo o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), o Ganchinho teve a quarta maior taxa de crescimento populacional entre os bairros da capital 52%. Em regiões próximas à divisa com os vizinhos Alto Boqueirão e Sítio Cercado, não são apenas as novas moradias que chamam a atenção. Ruas sendo abertas e asfaltadas dão o ritmo de desenvolvimento do novo Ganchinho.
Expectativa e receio
Sonhos para quem chega, desconfiança para quem já chegou. O crescimento da região impressiona os novos moradores, cada dia mais ansiosos. Mas os atuais habitantes estão receosos sobre o futuro do bairro, que vai receber 10 mil "forasteiros". Curitibana do Alto Boqueirão, a educadora Ana Marisa de Campos da Rosa Passos é uma das novas moradoras e, entre um bate-papo e outro, já percebeu que os mais antigos estão meio desconfiados. "Eles têm medo que aumente a criminalidade. É o medo do novo, mas tudo se ajeita. Já falei isso com alguns deles."
Ana, que ganhou o último sobrenome há quatro meses, quando se casou com Haroldo Cezar Gonçalves Passos, e desde então mora no Capão da Imbuia (no leste da cidade), não esconde a expectativa de voltar à zona sul da cidade, mesmo que o Ganchinho seja um local mais retirado. "O bairro está crescendo", diz.
É a mesma confiança da assistente de RH Cristiane Martins. Hoje moradora de Fazenda Rio Grande, cidade da Grande Curitiba, ela conta que se assustou com a distância do bairro quando começaram as obras dos loteamentos. "A princípio não tinha nada, mas hoje cresceu muito. Lá encontramos muitos comércios hoje."
O comerciante João Barbosa, que vive desde 2002 no Ganchinho, é um dos moradores que estão ressabiados. Ele comenta que a região está mais valorizada, mas faltam muitos serviços públicos, como transporte, postos de saúde e escolas. "Temos de ir a outros bairros que ficam longe para buscar consulta médica e colégios", conta.
Proprietário de uma estofaria há seis anos, Adilson de Souza acredita que há chances de melhorias e mudanças no bairro, mas no longo prazo. "Não sabemos quem são as pessoas que vêm pra cá, se tem boa índole. Acredito que são poucos os que vão realmente ficar aqui, pois muitos devem vender as casas e sair."
Região vai precisar de mais infraestrutura
O aumento da população no Ganchinho vai exigir da prefeitura novos investimentos em saúde, educação, transporte e oferta de serviços públicos. Com a densidade populacional dobrando no bairro, a engenheira civil Fernanda Gomide, professora de Engenharia e Arquitetura da Universidade Tuiuti do Paraná, alerta para a necessidade de se investir em infraestrutura para conseguir atender os novos habitantes. Para ela, pontos importantes, como a coleta de lixo e o saneamento básico, são fundamentais. "Não é só a questão imobiliária. É preciso proporcionar uma qualidade de vida pós-intervenção."
A engenheira afirma que, apesar da intenção da prefeitura de reassentar novas populações em locais distantes, muitas áreas próximas ao centro da cidade poderiam ser reaproveitadas. "Para se ter um desenvolvimento sustentável, seria adequado o melhor uso do solo onde já se tem estrutura urbana", opina.
Segundo ela, construir em bairros distantes pode sair ainda mais caro para o poder público do que desapropriar terrenos e edifícios inutilizados nos bairros centrais.
Planejamento
Diretora técnica da Cohab, Tereza Gomes de Oliveira diz que, a partir do momento em que se escolhe um terreno para assentar parte da população, a companhia faz um planejamento urbano para o local com as demais secretarias da prefeitura e órgãos do governo do estado. "Tentamos construir as moradias junto com a infraestrutura, mas é difícil integrar as políticas. Atrasos podem acontecer."
Para atender os novos moradores, a prefeitura informa que a região receberá duas escolas (uma municipal e outra estadual), uma creche e mais uma unidade de saúde. Além disso, linhas de ônibus serão estendidas. Hoje o bairro conta com dois centros municipais de educação integral, duas escolas de 1.º ao 5.º ano e um posto de saúde.
Sobre a aquisição de terrenos em regiões distantes e não no centro, Tereza diz que a escolha é feita de acordo com o custo da área que, no caso do Ganchinho, seria mais barato e por causa do zoneamento da cidade, que permite o melhor uso do solo.