O ambientalista Paulo Adario nunca para. Mal retornou de Nova York e já foi a campo, no meio da Floresta Amazônica. Nos Estados Unidos, o ambientalista ganhou o prêmio de Herói da Floresta na América Latina e Caribe da Organização das Nações Unidas (ONU). O prêmio inédito também foi concedido a outras quatro pessoas de diferentes continentes pelos seus trabalhos em defesa das florestas.
Adario é o diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace no Brasil, além de ter sido um dos fundadores da ONG no país. Em 20 anos de profissão, Adario já arranjou briga com diversos madeireiros e também já se prendeu a árvores para impedir que fossem derrubadas.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Adario falou sobre a relação entre a preservação e a agricultura e questões como a certificação florestal e a construção de grandes hidrelétricas.
A ONU premiar pessoas por serem defensoras da floresta mostra que há uma preocupação mundial crescente em mantê-la viva?
A leitura é exatamente essa. A preocupação com as florestas em geral, especialmente as tropicais, não é nova. Mas a crise climática aumentou essa preocupação. A relação homem e floresta existe há milhares de anos e sempre foi conturbada. O homem sempre utilizou os produtos florestais para construir abrigos ou para energia. E, quando ele vira agricultor, também começa a derrubar a floresta para a agricultura. As florestas da América do Sul, em especial a Mata Atlântica e a Floresta Amazônica, são as que estão desaparecendo pela primeira vez na frente dos nossos olhos. A preocupação do mundo com o desaparecimento das matas aumenta com a preocupação ambiental dos habitantes e com a noção de que a mudança climática ameaça nosso futuro. O prêmio da ONU nasce de uma certeza de que as florestas precisam de defensores. Quando me dá um prêmio como esse, a ONU confessa que as florestas continuam em risco, precisam de defensores e coletivamente estamos falhando na defesa delas.
O que pode ser feito para conter o avanço do desmatamento na Amazônia?
É preciso diminuir o desmatamento não só na Amazônia, mas no mundo todo. Mas uma questão central que marca o desmatamento das florestas tropicais é o padrão global de consumo. No Brasil, você tem um fenômeno importante, que é componente fundamental do desmatamento da Amazônia brasileira: o avanço das fronteiras agrícolas, tanto da agricultura em geral quanto da pecuária. O desmatamento diminuiu recentemente, de 27,5 mil km² em 2005 para 6,4 mil km² no ano passado. O que é uma queda bastante espetacular, mas ao mesmo tempo ainda é muita floresta. Essa queda não só contribui para emissões e tem peso grande no Brasil.
Um motivo é que as riquezas da agricultura são regadas pelas chuvas da Amazônia. Então preservar não é só uma questão ética importante, mas também essencial economicamente.
A construção de grandes hidrelétricas também tem sido discutida, especialmente pelo caso de Belo Monte. O que isso impacta nas florestas?
A economia e a questão ambiental são interdependentes. O grande potencial para hidrelétricas está no Norte do Brasil. O uso desse potencial hidráulico pode ter impacto sério no crescimento do desmatamento. Encontrar o justo equilíbrio entre a economia e o meio ambiente é a questão. A gente não é contra as hidrelétricas, mas acredita que a escala delas é que é o problema. Hidrelétricas de baixa queda são as melhores alternativas para um país como o Brasil, junto com o investimento em fontes de energia renovável. É preciso também a redução de consumo e desperdício e melhoria da capacidade de geração de energia das hidrelétricas de hoje. Muitas estão ultrapassadas do ponto de vista tecnológico. Só com a mudança de equipamento aumenta o potencial de produção de energia e diminui o desperdício, sem precisar barrar novos rios.
Há também dúvidas sobre o sistema de certificação florestal. Ele realmente ajuda a diminuir o desmatamento? Há fraudes?
Como ideia, ela é ótima. Você tem um sistema em que entidades independentes e neutras atestam a origem e a qualidade ambiental, social e econômica de um produto. Os selos funcionam como garantia para o consumidor de que a produção não envolveu trabalho escravo ou desmatamento. A questão central é confiar no selo. Se ele deixar dúvidas, o consumidor vai deixar de comprar. O selo precisa ter grande credibilidade e precisa envolver diferentes atores que se neutralizem. Quanto mais a população tiver consciência da importância da sua opção de compra incluir a questão ambiental, mais as empresas vão se mover na direção correta. Mas, ao mesmo tempo, não adianta o consumidor chegar com a intenção de comprar com o selo e não encontrar nenhuma opção.
Você defende a possibilidade do desmatamento zero. Ele é possível em um Brasil tão dependente da agricultura?
É possível sim. Se você pensar na área da pecuária, são 220 milhões de hectares ocupados por ela e a média é de uma cabeça de boi por hectare. Na Europa, se tem de cinco a oito cabeças. E, desses, 70 milhões de hectares são de alto potencial agrícola e que hoje têm essa pequena quantidade de gado. Basta você investir na transformação desses solos para produção de grão e mais do que dobra a produção brasileira de alimentos sem diminuir a produção de carne. Essa é uma maneira de resolver e não precisar mais derrubar nenhuma árvore para aumentar exportações e manter a saúde do agronegócio. O próprio setor diz que com o Código Florestal não pretende mais desmatar que não é necessário. Aí eles dizem duas mentiras, mas uma verdade. Não é preciso mais desmatar, mas eles querem, sim, continuar o desmatamento e o Código possibilita isso pela anistia concedida a quem desmatou.
O que você espera da Rio +20?
Eu participei da Rio 92 e já naquela época eu vi que o governo sabia o que precisa ser feito, mas não o faz por falta de vontade política e pragmatismo geopolítico. Todo mundo está na mesma canoa e acaba discutindo quem fez o buraco antes. É um jogo de empurra-empurra. Várias outras conversas como essa falharam nos últimos anos e a Rio +20, do jeito que está, não dá esperança de ter um bom resultado.
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