Um dos principais corredores de escoamento de grãos do Sul e do Centro-Oeste até o Porto de Paranaguá, a ferrovia que liga Curitiba ao litoral, é também um dos destinos turísticos mais procurados por quem visita o Paraná - o que a torna a personagem principal da briga entre a necessidade de ampliar a capacidade de carga da ferrovia e, da mesma forma, preservar a obra, que foi construída na Serra do Mar. A Serra, incluindo a ferrovia – obra dos irmãos Rebouças de 132 anos, e a Estrada da Graciosa - é tombada pelo Patrimônio Histórico do Paraná desde 1986.
Para triplicar a capacidade de carga da ferrovia, a Rumo, concessionária que administra o trecho, pede autorização para aumentar a raio da curva próxima à Ponte São João em Morretes. De acordo com a Rumo, a adequação na geometria da ferrovia é necessária para substituir locomotivas antigas por novas máquinas. A empresa ainda afirma que, além do aumento de capacidade de transporte, a obra deve reduzir em 80% a geração de poluentes, além da diminuição do consumo de combustível.
O Conselho de Patrimônio Histórico, em contrapartida, pede que a Rumo revitalize e administre duas estações ferroviárias ao longo da rodovia - entre elas, a Casa da Pedra em Quatro Barras. A concessionária, em nota, afirmou que está disposta a cumpriras compensações ambientais exigidas pelo Ibama. “A Rumo reforça que está disposta a cumprir as compensações ambientais exigidas pelo Ibama. Mas entende que é um retrocesso que outras autoridades dificultem uma obra dessa importância por causa da remoção de 68 árvores - cuja compensação está prevista no processo de licenciamento orientado pela legislação ambiental”, diz a nota.
Enquanto o impasse não é solucionado, o projeto segue parado, já que a obra só pode ser realizado com a anuência do conselho.
Impacto
Para a realização do aumento da curva, seria preciso um desmonte de rocha, que hoje abriga vegetação. Além do trabalho de reposição da mata, o conselho também exige a revitalização das estações, hoje praticamente destruídas. De acordo com o coordenador do Conselho do Patrimônio Cultural da Secretaria de Cultura do Paraná, Sergio Krieger, a preocupação é que a obra centenária seja danificada. “Não é que a obra não pode ser realizada, mas é preciso uma contrapartida. A visão do conselho é que, uma vez que permitida a modificação de um bem tombado, a estrada seja desfigurada”, afirmou. Ainda de acordo com Krieger, não há comprovação que o aumento significativo da carga não cause danos à estrutura. “A estrada não foi projetada para essa quantidade de carga que eles estão pretendendo. É possível que isso danifique a estrutura”, disse.
Hoje, a ferrovia tem capacidade de escoar no máximo 10 milhões de toneladas por ano. Com a obra, a intenção da Rumo é que 27 milhões de toneladas sejam levadas por ano até o Porto de Paranaguá.
Ainda em nota, a empresa informou que solicitou uma nova análise para a aprovação da obra e que não recebeu resposta da Secretaria de Cultura. A Rumo ressalta ainda que apenas a paisagem da Serra do Mar é tombada como patrimônio histórico, e não a ferrovia.
Necessidade de uma alternativa
O setor produtivo vê a mudança na curva de Morretes com bons olhos. Para o coordenador de um grupo de trabalho sobre o corretor de exportação da Secretaria de Planejamento do Paraná, Murilo Noronha da Luz, a questão é delicada, mas que a obra é bastante relevante para o estado. Hoje, diz o coordenador, a obra é uma forma de desafogar o tráfego na BR-277, já que 80% do transporte de grãos é feito pela rodovia e apenas 20% pela ferrovia. “Há mais margem de intervenções no setor ferroviário e há urgência no aumento da capacidade deste modal, que é muito subutilizado”, explicou. “O estado ganha em competitividade se adequar melhor ao modal ferroviário, que é mais eficiente”, disse.
Há dúvidas, de acordo com Noronha da Luz, de quantas toneladas a ferrovia pode suportar atualmente, além do conflito claro com o potencial turístico da ferrovia. Para o coordenador, a solução definitiva seria uma nova descida ferroviária para o litoral do estado. A projeção da Secretaria de Planejamento é que, até 2025 a movimentação no Porto de Paranaguá passe de 45 milhões de toneladas/ano para 60 milhões. “Uma nova descida da serra é a solução mais complexa, mas a que se faz necessária dentro de quinze anos, no máximo, se observarmos a projeção”, completou.
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