Recentemente, uma parceria internacional pró-vida e pró-família entre Brasil e Polônia foi atacada por figuras e movimentos da esquerda. Alvo central desses ataques foi a Ordo Iuris, uma instituição de juristas poloneses que luta pelo cumprimento dos direitos humanos fundamentais, como o direito à vida, a proteção da família e a liberdade de expressão.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o presidente da Ordo Iuris, Jerzy Kwaśniewski, diz que, após o fim do governo de Donald Trump nos Estados Unidos, resta ao Brasil a tarefa de liderar as recentes alianças internacionais em defesa da família e da vida. “O Brasil é provavelmente o melhor país para exercer esse papel”, afirma.
Para Kwaśniewski, a administração Trump “era o motor por trás das atividades pró-vida e pró-família”. “Em muitas outras áreas, a administração Trump não era tão multilateral em sua diplomacia. Mas, nesse campo, eles foram capazes de promover a Declaração do Consenso de Genebra”, diz.
Sobre os ataques que a organização costuma sofrer – é frequentemente chamada de “ultraconservadora” e “reacionária” –, Kwaśniewski responde que as principais bandeiras defendidas pela Ordo Iuris estão todas previstas em acordos internacionais sobre os direitos humanos.
Uma de suas vitórias recentes foi conseguir asilo na Polônia para uma mãe que corria o risco de perder a guarda da sua filha para o Barnevernet, o serviço de proteção à infância da Noruega. Os motivos alegados para a intervenção foram que a mãe tinha “síndrome de fadiga crônica" e abusava de paracetamol. As acusações dos funcionários do Barnevernet não foram apoiadas por provas. A Ordo Iuris venceu a batalha jurídica nesse caso e, posteriormente, derrotou o governo da Noruega em vinte casos semelhantes, por violação de direitos humanos básicos.
Outra acusação frequente contra a Ordo Iuris é a de vínculo com a Tradição, Família e Propriedade (TFP), uma organização tradicionalista brasileira fundada por Plinio Corrêa de Oliveira. Segundo Kwaśniewski, essa associação é enganosa, e começou a ser feita depois que o Instituto Piotr Skarga – que afirma ter a TFP como uma de suas inspirações – ofereceu apoio à Ordo Iuris há alguns anos.
Confira a entrevista com o presidente da Ordo Iuris, Jerzy Kwaśniewski.
Objetivo da Ordo Iuris é proteger os direitos humanos fundamentais
“A Ordo Iuris é um instituto de cultura jurídica. Desde que foi fundada, em 2013, está focada estritamente na proteção dos direitos humanos e da dignidade humana básica. É claro que nós nos concentramos principalmente naqueles direitos humanos fundamentais, chamados de direitos naturais no Common Law, mas sempre sob o sistema legal europeu, e sob a Convenção de Direitos Humanos da Europa, e segundo a jurisprudência de tribunais constitucionais europeus, e da Corte de Direitos Humanos europeia. Esses direitos humanos fundamentais consistem em proteção da vida humana, proteção da saúde, proteção da vida da família, proteção da privacidade, liberdade de imprensa, liberdade de pensamento, liberdade de associação. E nós estamos engajados e envolvidos em todos os níveis, nacional e internacionalmente, na proteção desses direitos humanos básicos. E, como é óbvio, nós tendemos a ser associados por nossos amigos e inimigos ao conservadorismo. Mas eu nunca diria que somos um think tank católico. Nós temos pessoas de diferentes origens. Há protestantes, católicos e pessoas cuja religião eu nem sequer sei trabalhando conosco.
Temos, hoje, entre 30 e 40 advogados focados nos nossos temas principais em dois braços principais de atividades. O primeiro é a litigância estratégica, com o objetivo de fortalecer as garantias básicas dos direitos humanos, da dignidade humana. Oferecemos assistência legal em cerca de 800 casos por ano, pro bono, sem nenhum tipo de remuneração, a famílias da Polônia, em sua maioria, mas também de alguns países europeus.
Há também o nosso braço acadêmico. Nós elaboramos relatórios, leis, conferências internacionais e, dentro de poucos meses, iniciaremos o primeiro ano de nossa universidade em Varsóvia. Os cursos serão focados principalmente em leis públicas internacionais e direitos humanos.
Consideramos que somos defensores da maioria silenciosa. Em diversas partes do mundo, a maioria silenciosa, que prefere os direitos naturais e a ordem social natural é, de certo modo, marginalizada pelo mainstream. Essas pessoas precisam de advogados que as ajudem a formular argumentos, a estar presentes na mídia, e esse é o nosso papel. Como advogados, nós sabemos como fazer isso.”
A batalha jurídica contra o serviço de proteção à infância na Noruega que persegue a família
“Nós demos assistência a uma mãe norueguesa e sua filha de oito meses que estavam fugindo da Noruega porque o Barnevernet, que é o serviço de proteção à infância do país, estava tentando tomar a criança da mãe antes mesmo de que a criança nascesse. Posteriormente, fizemos um relatório sobre esse serviço norueguês de proteção à infância e a sua violação sistemática do direito de proteção à família, e apresentamos isso em Estrasburgo, no Conselho Europeu, e durante um encontro com o governo norueguês, também. Conduzimos encontros com defensores de direitos humanos noruegueses e consultorias relacionadas ao nosso relatório. E, até agora, já derrotamos o governo da Noruega em vinte casos semelhantes, por violação de direitos humanos básicos. Fomos o primeiro think tank do mundo a chamar a atenção para o assunto dessa violação aos direitos humanos na Noruega.”
A luta contra o chamado “direito ao aborto” nas leis internacionais
“Providenciamos também assistência legal ao movimento pró-vida polonês. Além da família, este é outro assunto muito importante hoje em dia. Há alguns movimentos em nível internacional que tentam implementar o chamado “direito ao aborto” no escopo dos direitos humanos. Os direitos humanos estão previstos em leis internacionais, e a fonte dessas leis internacionais são o consenso dos Estados. E nunca houve um consenso dos Estados quanto à implementação do aborto como um direito humano. Então, sob esse ponto de vista, cabe a cada nação regulamentar a questão do aborto.
Também damos assistência em vários casos relacionados a liberdade de consciência. Há inúmeros casos de médicos, enfermeiros e obstetras poloneses que se recusam a participar de abortos, por exemplo. Queremos defender a objeção de consciência, e estamos oferecendo assistência legal a eles no tribunal constitucional.”
A proteção de movimentos conservadores contra a atuação ideológica das cortes supremas
“Estamos providenciando assistência legal em diversos casos, nacional e internacionalmente, para pessoas que expressam sua preocupação contra essa revolução internacional dos direitos humanos: para movimentos pró-vida, pró-família, na Polônia, na Alemanha, na Croácia, na Eslováquia, na Noruega, que são perseguidos pelo sistema legal e pela jurisprudência das cortes por tentarem fazer uso de seu direito humano básico de expressar publicamente o que sentem.”
Por que a Ordo Iuris foi associada à TFP
“A esquerda radical na Polônia tenta nos associar com movimentos religiosos radicais, principalmente com o brasileiro Tradição, Família e Propriedade [TFP]. Eles fizeram essa conexão porque quando nós estávamos fundando a Ordo Iuris – éramos um grupo de advogados, a maioria da Universidade de Varsóvia, da faculdade de Direito, e eu era o único já atuante na área entre eles –, nós tivemos a ideia, que nunca chegamos a concretizar, de fazer uma ONG. E nós fomos apoiados pela Father Piotr Skarga Association, que é uma associação religiosa católica muito popular na Polônia, uma das associações mais populares do país – e, claro, muito conservadora. Eles nos apoiaram nesse início, mas não tiveram nenhuma influência nas atividades da Ordo Iuris.
Bom, a Father Skarga Association, em sua declaração de missão, diz que algumas de suas ideias são inspiradas nas de Plinio Corrêa de Oliveira. Ele foi mencionado no meio de outros filósofos. E essa foi a conexão encontrada entre a Ordo Iuris e a TFP. Eu acabei aprendendo muito sobre a TFP, por causa de matérias jornalísticas [que faziam a associação da Ordo Iuris com a organização brasileira]. Para ser honesto, nós não temos nada a ver com a TFP.”
Como o fim da administração Trump pode prejudicar as pautas pró-vida e pró-família internacionalmente
“A administração Trump era o motor por trás das atividades pró-vida e pró-família [em organismos internacionais]. Frequentemente me vem à memória a Conferência de Cairo de 1994, quando um papel muito similar foi cumprido pela diplomacia da Santa Sé. Era durante o papado de João Paulo II. A representação da Santa Sé tinha 20 pessoas nessa conferência. E eles eram muito ativos. Eles foram os diplomatas por trás dessa coalizão intercultural internacional que possibilitou a publicação excelentes resoluções durante essa convenção. E, de alguma forma, foi universal. Foi aceito por chineses, europeus, africanos, americanos… Foi possível combinar um multiculturalismo com uma visão muito cristã da dignidade humana. Entre outras coisas, a Convenção de Cairo levantou a preocupação sobre o aborto, sublinhando que o aborto nunca deveria ser entendido como uma forma de planejamento familiar, que deveria ser algo limitado.
Nos últimos anos, o mesmo tipo de função, de tentar criar um hub de cooperação internacional do tipo, foi assumida pela administração Trump. E isso é interessante, porque em muitas outras áreas a administração Trump não era tão multilateral em sua diplomacia. Mas, nesse campo, eles foram capazes de promover a Declaração do Consenso de Genebra. Antes disso, foram muito ativos em Nairóbi e em Nova York, em diversos assuntos relacionados à defesa da família.
Agora, com a administração Biden, é claro que eles deixaram a Declaração do Consenso de Genebra e que eles terão uma política muito diferente.”
Como o Brasil pode assumir o papel de líder internacional nas pautas pró-vida e pró-família
“Estou feliz que o governo brasileiro esteja tomando o papel de líder da Declaração do Consenso de Genebra. É importante que um dos maiores países do mundo esteja apoiando essa declaração. O Brasil é provavelmente o melhor país para exercer esse papel [de liderança] agora. Eu espero que tenhamos sucesso. Estamos tentando fazer o máximo que podemos, em cooperação com o governo polonês, mas na escala adequada à Polônia, e essa escala talvez não seja global, mas sim regional. Em abril, vamos lançar algumas iniciativas para convencer outros países da Europa Central e Oriental para assinar a declaração.
Espero que, com a liderança do Brasil, sejamos capazes de ganhar mais força em promover a ideia de que alguns assuntos que não são consenso em nível internacional não devem ser regulados em nível internacional. Alguns assuntos que dividem as culturas do mundo devem ser regulados por cada uma delas separadamente. Até que ponto nós, como representantes da cultura europeia, devemos regular outras culturas, se nem sequer conhecemos essas culturas direito? Essa é a ideia, e eu vejo a Declaração do Consenso de Genebra como um brilhante instrumento para promover uma boa perspectiva sobre o multiculturalismo.”
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