A céu aberto
Há sete anos, evento em São Paulo promove "festa do grafite"
Aproximar o grafite da vizinhança desconfiada, tentar fazer de um muro cinza e "separatista" uma mancha colorida e acolhedora. Essa é a proposta do Dia do Graffiti, evento que aconteceu ontem pelo sétimo ano seguido no bairro do Bixiga, em São Paulo.
Do meio-dia às 21 horas, a Rua 13 de Maio foi fechada e muros previamente "negociados" foram grafitados. "Promovemos uma ocupação artística do bairro. É uma arte de celebrar a rua, viver o espaço público. O grafite se tornou uma ótima desculpa", diz Cristiano Scabello, um dos organizadores.
A recepção é a melhor possível. Cristiano diz que as pessoas, cada vez mais, estão interessadas em liberar suas fachadas. Assim, compreendem melhor a diferença entre grafite e vandalismo. "Pichação é um ativismo cultural, não é arte. O grafite é algo que contribui para o bem-estar social", define Scabello. Cinco mil pessoas participaram do evento.
Tecnologia
Google lança programa para "juntar" artistas e donos de muros livres
Deixar um muro à disposição de grafiteiros já é possível em São Paulo. No dia 25 de março, o Google lançou o projeto Color + City ("cidade + cor", em tradução livre). A plataforma une dois outros produtos do grupo: a rede social Google Plus e o Google Maps, serviço de mapeamento das ruas da cidade.
Ao acessar o site www.colorpluscity.com.br, o usuário deve escolher se quer se cadastrar como titular de um imóvel e autorizar que seu muro esteja à disposição de qualquer artista interessado , ou se inscrever como um artista em busca de um muro para realizar a intervenção.
A página inicial mostra um mapa da cidade de São Paulo, no qual "pins" (marcações) de cores diferentes indicam a localização de muros incluídos no projeto. Conforme a cor da marcação, os muros são divididos em três categorias: disponíveis para intervenções, reservados por algum artista ou já finalizados por algum grafiteiro.
É batata. Convide alguém para caminhar pelo Centro de Curitiba, na altura do encontro das ruas Marechal Deodoro e Conselheiro Laurindo e aguarde. Dedos irão apontar para o prédio que está recebendo um grafite gigantesco. Mesmo que ainda só exista metade de um Ray Charles, ninguém repara na pichação que cobre o muro e o portão do estacionamento do mesmo prédio.
A cena é perfeita para reforçar, mais do que a ojeriza à pichação, as possibilidades de utilizar o grafite para o bem da cidade.
Historicamente as duas formas de expressão fazem parte da mesma linguagem.
"É tudo uma coisa só porque as raízes e as motivações são as mesmas. E o nosso público é todo mundo", diz Celestino Dimas, um dos integrantes do projeto Motion Layers contemplado via Lei Municipal de Incentivo à Cultura que irá colorir quatro prédios até o fim deste mês.
Os três artistas Dimas é acompanhado por Eduardo Melo, o Artstenciva, e Leandro Lesak, o Cínico são unânimes em dizer que a pichação não irá acabar por causa de uma lei, justamente porque é uma forma de expressão que envolve, além da intervenção no muro alheio, que é crime, questões mais complexas, como a necessidade de pertencimento e de autoafirmação. "Se quisessem desestimular, teriam que ignorar", sugere Dimas.
Então, aproveitar o talento dos artistas para o bem da cidade talvez seja a saída menos dolorosa. Mas nem sempre é tão fácil. Há uma coincidência entre dois proprietários de prédios que aceitaram a ideia, sem pestanejar: o "estrangeirismo". Um dos lugares é um hotel, cujo gerente é português. O outro prédio fica na Rua XV com a Tibagi: o dono vive em contato com o filho, que mora em Los Angeles. "Em Curitiba é um começo, mas tivemos uma recepção muito boa com esse projeto", comenta Dimas.
O objetivo maior, além de destruir o "ego autoral" dos pichadores, que passam a trabalhar em equipe por um bem comum, é transformar a relação dos habitantes com sua própria cidade. "O grafite desperta o convívio, faz com que as pessoas se sintam mais donas do espaço público, que passou a ser o lugar dos carros. É uma retomada de uma cultura mais afetiva com a cidade, além de ser um avanço técnico e estético em relação à pichação."
Prova disso é o comerciante Marcos Marins, 48 anos, pedestre atento, que interveio na conversa. "Parabéns pelo trabalho. Isso traz mais vida para a cidade e é bem melhor que outdoor de loja e propaganda política", disse, apontando para o meio Ray Charles.
"Domesticar" a intervenção não dá resultado
A tentativa de domesticação da arte de rua atrapalha a relação. Depender de autorização do poder público para expressar não está nos planos dos grafiteiros. A Fundação Cultural de Curitiba (FCC) promoveu nos últimos anos ações pontuais para atender a demanda dos artistas: o edital de 2006, que proporcionou a pintura dos viadutos do Xaxim e Alto da XV, por exemplo, e encontros de artistas no Solar do Barão, espaço "nobre" em Curitiba.
Roberto Alves, ex-coordenador de artes visuais da FCC, destaca que a função do poder público é fazer o "meio campo" para os artistas e que a base de tudo é a própria cidade. "Damos a chancela para o reconhecimento. Fazemos intermediação com espaços que querem ceder seus muros para a grafitagem, por exemplo, mas é impossível ter controle total sobre essa linguagem", explica. Alves também não concorda com a "caçada" aos pichadores. "A repressão não pode ser uma resposta."
Alves ainda sugere mudanças nas medidas educativas, para que um atual pichador consiga evoluir em sua própria arte e crie pensando na cidade em que vive. "Ao invés de mandar pintar muro ou assistir palestra, que esses possíveis futuros artistas sejam incluídos em cursos de arte ou projetos como o jovem empreendedor."
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