O primeiro parque público de Curitiba e do Paraná não foi projetado para o lazer, mas sim pela necessidade de uma ação higienista, alertada pelo Dr. Muricy (José Cândido da Silva) em 1858. É que as águas paradas do Rio Belém, na curva do Boulevard 2 (atual Av. João Gualberto), causavam um cheiro daqueles em dias de calor e acumulavam resíduos a ponto de ocasionar uma possível epidemia de cólera, malária ou varíola. O terreno pantanoso virou o que hoje é o Passeio Público da capital paranaense.
O local foi comprado pelo município, aterrado e inaugurado em 2 de maio de 1886. Foi nessa área alagadiça que diversas situações inéditas ocorreram na cidade a população foi quase à loucura ao ver pela primeira vez a eletricidade, a partir de um foco elétrico instalado ali, um carrossel e, inacreditável: uma mulher voando em um balão.
Era uma Curitiba provinciana, governada por Alfredo DEscragnolle Taunay: em 1886 haviam 15 mil habitantes e não mais do que 1.283 edificações na cidade. No livro Passeio Público: Primeiro Parque Público de Curitiba, da historiadora Cassiana Lícia de Lacerda, é possível ter uma ideia da sociedade da época. "A comida tinha preços ínfimos, era barata, farta e plácida, mas a sociedade desconhecia quase que completamente o que era luxo." É de se imaginar o que aconteceu com essa população que, com seus trajes elegantes, frequentava o primeiro parque da cidade.
Histórias
A chegada do carrossel, em 1888, foi um evento. A população o chamava de "máquina dos cavalinhos". O carrossel, explica a historiadora, foi quase que uma revolução das máquinas, numa Curitiba em que o lazer se resumia a um sarau por mês, oferecido em clubes.
Uma multidão também lotou o Passeio Público no dia em que, pela primeira vez uma mulher, Maria Aída, subiu com um balão pelos céus de Curitiba um voo frustrado, já que o balão acabou enroscado no lanternin da catedral. Bem neste dia, José Godoy, bufando de calor, resolveu se jogar em um dos lagos do parque para se refrescar, mas foi barrado pela polícia, quando já estava em seus trajes íntimos.
O Passeio Público também teve ares intelectuais quando em 1911, no fervor do helenismo, Curitiba coroou Emiliano Perneta como o príncipe dos poetas paranaenses. Ele se negou a ir até uma das ilhas de barco não achava seguro. A ilha, chamada de Ilusão, recebe este nome em referência a uma das obras de Perneta. Lá, jaz o seu busto.
Nesse parque da magia, cogitou-se transformar os canais em locais de prática de natação, sem sucesso. Enquanto isso, nas ruas do Passeio, as pessoas faziam teste de baliza para tentar tirar a licença para dirigir. Havia muito movimento de pedestres, que literalmente ocupavam o parque, inclusive para ver os concertos a partir do coreto que hoje virou aquário. "É preciso dar novos fins ao Passeio. Não dá para aceitar que a história dele permaneça assim, desconhecida", lamenta Cassiana.
O famoso portão e outras intervenções
É verdade. O Passeio Público tem um portal muito semelhante ao do Cemitério de Cães de Paris (Cemitière des Chiens de Asnière-Sur-Seine), e há uma explicação lógica para isso. O arquiteto Joseph Antoine Bouvard, contratado para ajudar nas reformas do Passeio, em 1919, trabalhou em obras do departamento de Sena (França), por isso é atribuído a ele também o projeto do portal do Cemitério de Cães. Conforme explica a historiadora Cassiana Lacerda, é provável que ele tenha retomado seus projetos e feito algo parecido por aqui.
O europeu trouxe para os curitibanos outras novidades, como áreas de lazer no parque com concepção artística e paisagística de caráter haussmmaniano. Georges-Eugène Haussmann foi prefeito de Paris e considerado um grande remodelador da cidade que governou. "Ele criava paisagens naturais por meio de intervenções artificiais", explica Cassiana. No Passeio, é possível ver esse tipo de arte na cerca que contorna o parque (feita de cimento, mas que imita troncos de árvores), nas grutas (uma delas feita semelhante a estalactites) e no antigo coreto, que imitava rochedos.
O Passeio Público tem ainda outras peculiaridades. O primeiro parque infantil que a capital recebeu foi ali. O projeto era do arquiteto Frederico Kirchgässner que projetou a casa modernista. O viveiro dos macacos, construído em 1932, tinha até lambrequins. E o Restaurante do Estudante, implantado durante o primeiro governo de Moisés Lupion, em 1950, após seis anos foi consumido por um incêndio. Foi nessa época que o novo restaurante Recreio do Garoto foi edificado e os barcos perderam espaço para os pedalinhos.