O governo do Paraná cancelou ontem todas as placas reservadas usadas pelas viaturas das polícias Civil e Militar e da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp). Um delegado vai investigar o uso pessoal de carros oficiais. Também serão estornados os repasses do fundo rotativo da Polícia Civil relativos a abril. Um delegado e um escrivão foram afastados dos cargos de chefia de setores estratégicos da Polícia Civil. As medidas foram anunciadas ontem pelo governador em exercício, Flávio Arns, no lastro das denúncias publicadas pela Gazeta do Povo desde o dia 20 na série "Polícia Fora da Lei", que mostra dinheiro sendo enviado a delegacias fantasmas e delegados, escrivães e investigadores usando carros oficiais para levar os filhos à escola, ir às compras e a bordéis.
Foram afastados o chefe do Grupo Auxiliar de Planejamento (GAP), Luciano Pinho Tavares, e o chefe do Grupo Auxiliar Financeiro (GAF), Pedro Reichembak Brito. Para as funções foram indicados os delegados Naylor Robert de Lima e Jairo Estorílio, que é presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Paraná. Os dois substituídos foram flagrados pela reportagem usando para fins particulares viaturas com placas reservadas da Polícia Civil. Eles faziam parte da equipe que controla a verba do fundo rotativo da corporação, também alvo de denúncias da reportagem.
Apesar da repercussão negativa e das investigações que serão realizadas na gestão do fundo e das viaturas, Brito continuará na equipe do GAF. Tavares ainda não tem uma função determinada. Os repasses do fundo rotativo relativos a abril serão liberados de acordo com a nova norma publicada após as denúncias de consumo de dinheiro público em delegacias fantasmas.
As reportagens da Gazeta do Povo fizeram o governo rever a normatização para uso de viaturas no estado. Arns assinou Decreto, a ser publicado hoje, autorizando a Sesp a publicar amanhã uma resolução mudando as normas de controle da frota. Além disso, veículos cedidos a outros órgãos do estado serão recolhidos, exceto os emprestados aos Gaecos. A partir de agora, placas reservadas só serão liberadas pelo secretário da Segurança Pública, Reinaldo de Almeida César Sobrinho, e pela Casa Militar. Os veículos continuarão a ser usados nos trabalhos policiais, a princípio com as placas originais.
O governo designou o delegado Walter Baruffi Filho para investigar cada caso denunciado pela reportagem sobre uso irregular de viaturas. Ele deve apresentar em 30 dias a conclusão de cada episódio registrado pela reportagem.
Afastamento
O Sindicato dos Investigadores de Polícia do Paraná (Sipol) defende o afastamento imediato de todos os policiais flagrados usando "mordomóveis" até que as investigações sejam concluídas. Paralelamente, o sindicato encaminhou ofícios ao governador em exercício, Flávio Arns, e ao secretário de Segurança Pública, Reinaldo de Almeida César, sugerindo a suspensão das reuniões do Conselho da Polícia Civil. "O afastamento é uma medida de transparência. O Conselho é o órgão que toma as decisões mais importantes da Polícia Civil", disse Ramires.
Delegado-geral foi alertado do desvio há 1 ano
O delegado-geral da Polícia Civil do Paraná, Marcus Vinícius Michelotto, já havia sido comunicado oficialmente, em julho de 2011, da existência dos "mordomóveis", viaturas usadas para fins pessoais por delegados, escrivães e investigadores. Um mês depois, em agosto, a denúncia foi arquivada pelo Conselho da Polícia Civil, órgão responsável por julgar transgressões de policiais, por exemplo. Não é difícil supor o motivo do arquivamento: três dos seis delegados que integram o Conselho foram flagrados pela Gazeta do Povo fazendo uso particular de veículos oficiais.
A denúncia chegou ao comando geral da polícia por meio de ofício encaminhado pelo Sindicato dos Investigadores de Polícia do Paraná (Sipol). "É notório que delegados de polícia fazem uso de viaturas que ficam à sua disposição em caráter de exclusividade", alertava o Sipol. Investigadores eram obrigados a fazer a limpeza dos veículos oficiais a mando dos delegados. "Além do exemplo citado, há outras ocorrências de natureza análoga em que se confunde o público com o particular e isso é prejudicial ao serviço público e, sobretudo, constrangedor para o servidor, por razões óbvias", ressaltava o ofício.
A denúncia foi arquivada por unanimidade pelo Conselho da Polícia Civil, alegando "solicitação genérica" e falta de "situação concreta a ser analisada". Nenhuma providência foi tomada. Além do delegado-geral, votaram pelo engavetamento os delegados Benedito Gonçalves Neto, Paulo Ernesto de Araújo Cunha e Luiz Carlos de Oliveira. Os três usam "mordomóveis". A Gazeta do Povo flagrou Oliveira indo a uma casa de prostituição com a viatura e Benedito fazendo compras num supermercado.
Corregedor-geral da Polícia Civil, Paulo Ernesto foi flagrado com um Renault Fluence fazendo compras em uma padaria num sábado, quando não há expediente. Há seis meses, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público Estadual, também enviou ofício ao corregedor-geral informando sobre o uso das viaturas da corporação para fins particulares. A denúncia foi ignorada mais uma vez.