Quatro delegados da cúpula da Polícia Civil e dois coronéis do alto escalão da Polícia Militar não deverão ser punidos internamente pelas respectivas corporações pelo uso dos chamados "mordomóveis" viaturas usadas para fins pessoais. A prática foi denunciada pela série de reportagens "Polícia Fora da Lei", da Gazeta do Povo, iniciada há 45 dias. Ao longo das matérias, 12 policiais civis e cinco militares foram flagrados fazendo uso pessoal de carros oficiais.
Na Polícia Civil, as investigações preliminares foram concluídas nesta semana, com o arquivamento dos processos contra quatro delegados, entre eles o chefe da Corregedoria da Polícia Civil, Paulo Ernesto Araújo Cunha. A apuração reconheceu que os delegados faziam uso pessoal dos carros oficiais, mas considerou que eles tinham direito de usá-los como veículo de representação (prerrogativa conferida apenas ao governador, secretários de Estado e magistrados).
"Entendeu-se que não houve abuso. O que você reprime é o abuso e não o uso", disse Cid Vasques, secretário de Corregedoria e Ouvidoria do Estado, que acompanhou as investigações feitas pelas polícias. "Segundo o delegado que investigou os casos [Valter Baruffi], essa conduta era tida como uma atividade normal dentro da Polícia Civil", complementou. A conclusão da apuração da Polícia Civil contraria o Decreto n.º 3.269/08 e a Resolução 222/11, que prevê o uso das viaturas somente no horário de expediente, "salvo para desempenho de encargos inerentes ao serviço público."
Alguns elementos denotam a fragilidade da investigação preliminar. O delegado Paulo Ernesto, por exemplo, havia sido flagrado com uma viatura descaracterizada um Renault Fluence em uma panificadora, na tarde de 21 de abril, um sábado. À polícia, ele alegou que voltava da Corregedoria e que passou na padaria no trajeto até a casa dele. A versão foi aceita na apuração policial. A reportagem, no entanto, constatou por meio de fotografias e filmagens que Paulo Ernesto saiu de sua residência por volta das 15h45, foi à panificadora e, após as compras, retornou à casa da família.
O resultado das apurações preliminares ainda precisa passar pelo Conselho da Polícia Civil. O órgão pode referendar a conclusão ou pedir novas diligências.
Oficiais
Dois integrantes do alto escalão da PM o subcomandante da corporação, coronel César Alberto Souza, e o responsável pelo 1.º Comando Regional, o coronel Ademar Cunha Sobrinho sequer foram alvo de investigações internas. Para justificar, a corporação alegou que a cúpula tem direito a veículo de representação. O argumento é embasado por uma portaria expedida pelo próprio Comando-Geral da PM.
Estão sendo investigados o tenente-coronel Lanes Randal Prates Marques e o major Maurício César de Moraes, ambos flagrados pela reportagem levando filhos à escola com viaturas descaracterizadas da corporação. Os inquéritos que apuram as irregularidades, no entanto, não foram concluídos. Segundo Cid Vasques, os responsáveis pelas investigações pediram prorrogação do prazo para ouvir testemunhas apontadas pelos policiais. O sargento Elacir Berti, mencionado na reportagem, não foi investigado.