Documentos solicitados
O Ministério Público também aguarda uma série de documentos requisitados sobre os "mordomóveis". O promotor Domingos Thadeu Ribeiro da Fonseca requisitou ao comando da Polícia Civil a relação completa das viaturas da corporação e um rol de informações sobre os delegados flagrados pela reportagens fazendo uso pessoal dos veículos. "Quero saber quem era o delegado, onde estava lotado, qual era a viatura que tinha à disposição e em que condições. Tem que estar tudo bem esclarecido", disse. "Eu vou ouvir um por um dos delegados mencionados e confrontar as informações com os documentos", acrescentou.
Procedimentos
Cinco casos evoluem para sindicâncias internas
A apuração de outros cinco casos investigados preliminarmente pela Polícia Civil deve ser aprofundada por meio de sindicâncias. Três destes envolvem delegados da cúpula da corporação, entre eles, o chefe da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio, Luiz Carlos de Oliveira, fotografado e filmado indo a uma casa de prostituição com uma viatura descaracterizada. Os outros flagrantes mostram delegados e policiais levando filhos à escola e uma escrivã que chegava a transportar cães e produtos de petshop em carro oficial.
Sem "pizza"
Para que as sindicâncias aconteçam de fato, é necessário que o Conselho da Polícia Civil aprove a instauração desses procedimentos. Ainda que as investigações mostram que houve transgressões disciplinares no uso dos "mordomóveis", as penas previstas podem frustrar aqueles que esperam sanções rigorosas. De acordo com Cid Vasques, secretário de Corregedoria e Ouvidoria do Estado, as punições previstas pelo Estatuto da Polícia Civil variam entre advertência, repreensão e suspensão de dois a dez dias. Não deve haver afastamentos ou expulsões, por exemplo. Para o corregedor do Estado, no entanto, não é possível falar que as investigações acabarão em "pizza". "Há uma preocupação em nível de governo para que isso tenha efetivamente uma resposta. Se existem culpados, eles têm de ser punidos. Se existe abuso, tem que ser corrigido." Três policiais não foram investigados, porque são comissionados e não pertencem aos quadros da Polícia Civil. Segundo Vasques, a apuração deve ser realizada pela Secretaria da Segurança Pública do Paraná.
Quatro delegados da cúpula da Polícia Civil e dois coronéis do alto escalão da Polícia Militar não deverão ser punidos internamente pelas respectivas corporações pelo uso dos chamados "mordomóveis" viaturas usadas para fins pessoais. A prática foi denunciada pela série de reportagens "Polícia Fora da Lei", da Gazeta do Povo, iniciada há 45 dias. Ao longo das matérias, 12 policiais civis e cinco militares foram flagrados fazendo uso pessoal de carros oficiais.
Na Polícia Civil, as investigações preliminares foram concluídas nesta semana, com o arquivamento dos processos contra quatro delegados, entre eles o chefe da Corregedoria da Polícia Civil, Paulo Ernesto Araújo Cunha. A apuração reconheceu que os delegados faziam uso pessoal dos carros oficiais, mas considerou que eles tinham direito de usá-los como veículo de representação (prerrogativa conferida apenas ao governador, secretários de Estado e magistrados).
"Entendeu-se que não houve abuso. O que você reprime é o abuso e não o uso", disse Cid Vasques, secretário de Corregedoria e Ouvidoria do Estado, que acompanhou as investigações feitas pelas polícias. "Segundo o delegado que investigou os casos [Valter Baruffi], essa conduta era tida como uma atividade normal dentro da Polícia Civil", complementou. A conclusão da apuração da Polícia Civil contraria o Decreto n.º 3.269/08 e a Resolução 222/11, que prevê o uso das viaturas somente no horário de expediente, "salvo para desempenho de encargos inerentes ao serviço público."
Alguns elementos denotam a fragilidade da investigação preliminar. O delegado Paulo Ernesto, por exemplo, havia sido flagrado com uma viatura descaracterizada um Renault Fluence em uma panificadora, na tarde de 21 de abril, um sábado. À polícia, ele alegou que voltava da Corregedoria e que passou na padaria no trajeto até a casa dele. A versão foi aceita na apuração policial. A reportagem, no entanto, constatou por meio de fotografias e filmagens que Paulo Ernesto saiu de sua residência por volta das 15h45, foi à panificadora e, após as compras, retornou à casa da família.
O resultado das apurações preliminares ainda precisa passar pelo Conselho da Polícia Civil. O órgão pode referendar a conclusão ou pedir novas diligências.
Oficiais
Dois integrantes do alto escalão da PM o subcomandante da corporação, coronel César Alberto Souza, e o responsável pelo 1.º Comando Regional, o coronel Ademar Cunha Sobrinho sequer foram alvo de investigações internas. Para justificar, a corporação alegou que a cúpula tem direito a veículo de representação. O argumento é embasado por uma portaria expedida pelo próprio Comando-Geral da PM.
Estão sendo investigados o tenente-coronel Lanes Randal Prates Marques e o major Maurício César de Moraes, ambos flagrados pela reportagem levando filhos à escola com viaturas descaracterizadas da corporação. Os inquéritos que apuram as irregularidades, no entanto, não foram concluídos. Segundo Cid Vasques, os responsáveis pelas investigações pediram prorrogação do prazo para ouvir testemunhas apontadas pelos policiais. O sargento Elacir Berti, mencionado na reportagem, não foi investigado.