O parque que virou um grande elefante branco
Pelas ruas de Itaipulândia, as placas turísticas indicam como um dos principais atrativos da cidade o Parque Aquático, situado no caminho para o balneário do município. Chegando ao local, entretanto, os únicos a recepcionar o visitante são três cachorros, que, com toda a mansidão, não podem ser considerados de guarda. Sob os "cuidados" deles está um patrimônio de quase R$ 20 milhões, concebido para atrair milhares de turistas, mas que se transformou em um legítimo "elefante branco".
Motivada pela fartura do dinheiro dos royalties, a obra teve início em 2005. Em uma área de 70 mil metros quadrados, o projeto previa um conjunto de piscinas, tobogãs, sauna, restaurante e até um hotel. Em 2006, o então prefeito Vendelino Royer (assassinado em 2008) rompeu o contrato com a construtora responsável e a obra jamais foi retomada. A estrutura com parte dos equipamentos se encontra abandonada e está sendo consumida pela ação do tempo.
O atual prefeito, Sidnei Amaral, não sabe explicar o porquê do rompimento do contrato. Sua preocupação agora é retomar a obra, mas não mais com recursos públicos. "Recentemente tivemos a visita de um grupo de investidores que se mostrou interessadíssimo. A estrutura foi bem feita, é possível aproveitar o que está lá e dar continuidade à obra", acredita. A intenção é fazer uma concessão de uso do espaço por um período de 28 anos. Seu objetivo maior é preparar a cidade para que ela sobreviva sem os royalties, tendo o turismo como carro-chefe. (AG)
Royalties
Os royalties são uma compensação financeira pela utilização do potencial hidráulico do Rio Paraná para a produção de energia na usina hidrelétrica de Itaipu. Desses recursos, 45% vão para os estados, 45% aos municípios e 10% para órgãos federais. Do porcentual destinado às cidades, 85% do valor repassado é distribuído proporcionalmente aos municípios lindeiros diretamente atingidos pelo reservatório da usina. Os 15% restantes são distribuídos entre municípios indiretamente atingidos por reservatórios complementares. Os pagamentos serão efetuados até o ano de 2023, quando se encerra o Tratado de Itaipu.
Santa Helena e Itaipulândia - O cenário é atraente por natureza. Às margens do Lago de Itaipu, no extremo Oeste do Paraná, praias artificiais ajudam a refrescar o forte calor que faz na região. Mas há muitos outros elementos que tornam a vida atraente nos municípios de Santa Helena e Itaipulândia. Agricultores recebem dinheiro a fundo perdido para incrementar seus negócios e não pagam pelo abastecimento de água. Quem quer fazer um curso superior recebe ajuda de custo e transporte gratuito. E, para os mais carentes, cestas básicas garantem ao menos a comida na mesa. Nessas cidades, as prefeituras atuam como verdadeiras mães, procurando não deixar que nada falte aos seus filhos.
Quem impulsiona essa economia são os royalties da Usina de Itaipu, que todos os meses garantem centenas de milhares de dólares aos cofres dos municípios. Pagos desde 1985, os royalties funcionam como uma forma de compensar as perdas causadas pelo alagamento de mais de mil quilômetros quadrados de terras distribuídas por 15 municípios paranaenses. Desde que passaram a receber os recursos, essas cidades já acumulam US$ 1,3 bilhão em repasses, o equivalente ao orçamento do Paraná para a área de segurança pública em 2012.
Por ter a maior área alagada, Santa Helena fica com o maior repasse, perto de US$ 1 milhão mensal. Itaipulândia, por sua vez, está na terceira colocação, com aproximadamente US$ 650 mil. Tamanha riqueza parece ser motivo de ostentação para os administradores das duas cidades. Enquanto Santa Helena se orgulha de ter a maior estátua em bronze da América Latina e monumentos como um obelisco e um painel histórico, Itaipulândia conta com uma estátua de Nossa Senhora Aparecida, também considerada a maior do continente.
Zona rural
O dinheiro dos royalties não está exposto apenas aos olhos dos visitantes. Na zona rural de Santa Helena, produtores locais que desejam abrir um empreendimento recebem até R$ 15 mil a fundo perdido para a construção de granjas, pocilgas ou açudes. Eles ainda têm cascalhamento gratuito em suas propriedades e não pagam pelo abastecimento de água. "Se fosse para pagar sozinho eu não faria", afirma Odinir Schnorr, que com o auxílio da prefeitura construiu dois tanques para peixes e um aviário.
Em Itaipulândia, que não conta com instituições de ensino superior, a prefeitura banca parte das mensalidades e o transporte para quem estuda fora. Já a Escola Municipal Carlos Gomes chama a atenção não apenas pela estrutura, que inclui ar-condicionado em todas as salas, mas também pelo ensino integral com um qualificado programa pedagógico. "A evolução foi enorme", diz Alislange Severo, ao comentar os benefícios para a filha Naila, que tinha sérias dificuldades de aprendizagem.
Apesar da satisfação de quem ganha, tantas benesses nem sempre são sinônimo de desenvolvimento. Mestre pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unioeste), Leoveraldo Curtarelli de Oliveira analisou o crescimento da economia dos municípios lindeiros ao Lago de Itaipu. Para ele, que consultou representantes de diversos setores, há dificuldades em equacionar os interesses da comunidade. "As ações implementadas não raramente representam interesses particulares, mas são mascaradas pelo objetivo social", afirma. Na sua avaliação, é necessário que as prefeituras debatam as ações com a comunidade e comecem a se preparar para viver sem os royalties, visto que o Tratado de Itaipu prevê seu fim a partir de 2023.
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Interatividade
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