Município não tem hospitais
A saúde pública de Doutor Ulysses é outro ponto preocupante. Sem um hospital, o município é obrigado a enviar seus pacientes para outras cidades. Durante a madrugada, a situação é ainda pior. Como a balsa que faz a travessia entre Cerro Azul e Doutor Ulysses funciona das 6 às 18 horas, fica impossível transportar qualquer paciente fora desses horários. A maioria deles é levada por Cerro Azul até Curitiba.
Mesmo antes, quando a ponte ainda estava em pé, o cenário era complicado. Familiares de doentes tinham de se deslocar até as casas dos motoristas das duas ambulâncias para que o transporte fosse concretizado. Os três médicos que trabalham no posto de saúde residem na capital paranaense.
Alexandre dos Santos, 51 anos, trabalha como motorista de uma das ambulâncias e relata que todo dia tem de levar pacientes para a capital. "Agora a gente depende da balsa. Isso complicou mais a situação", diz. A dona de casa Rosenilda de Matos, 31 anos, geralmente se vê obrigada a levar seu pai de 56 anos para tratar de um problema na coluna. "Como não temos hospital, dependemos de Curitiba. As estradas para chegar lá são ruins e ainda por cima temos de depender da balsa. Se tiver algum problema de madrugada, a situação fica ainda mais complicada", lamenta. (DA)
Por uma melhor educação
Com o pior índice de escolaridade do Paraná, Doutor Ulysses convive com a realidade das salas multisseriadas, nas quais um mesmo professor leciona para dezenas de estudantes de diferentes séries. Outra dificuldade é que as aulas às vezes são canceladas porque os professores vêm de Cerro Azul, cujo acesso está complicado, devido à queda da ponte que liga um município ao outro.
Mesmo com os problemas da cidade, o morador Louridi Cândido Brás promete investir o que for necessário para ver a filha Silmara, de 14 anos, formada. "Ela quer muito fazer curso de Matemática e ser professora. Aqui o ensino é complicado, mas vou tentar fazer o máximo para que ela consiga", afirma.
Louridi e a esposa Rosenilda moram com os dois filhos o outro, Bruno, tem seis anos em uma casa alugada de quatro cômodos. Eles têm renda mensal de R$ 500, sendo que R$ 100 é destinado ao aluguel. "Estamos apertando o que dá para economizar e para poder dar uma educação boa a eles."
Em 2008, Doutor Ulysses recebeu sua primeira biblioteca pública a Biblioteca Cidadã, que conta com 2 mil livros. O local foi equipado com aparelhos de televisão, vídeo e DVD, e possui um telecentro, com cinco computadores e acesso à internet. (DA)
Doutor Ulysses - Desde que foi fundado, em 1993, o município de Doutor Ulysses, na região metropolitana de Curitiba, parece estagnado no tempo. A cidade é uma das quatro do Paraná que não possuem qualquer tipo de ligação por estrada pavimentada com o restante do estado isolamento que impacta diretamente na vida dos 5.727 moradores. Coronel Domingos Soares e Mato Rico, ambas no Centro-Sul, e Guaraqueçaba, no litoral, são as outras três cidades sem acesso pavimentado.
Em Doutor Ulysses, a situação foi agravada no começo de agosto devido à chuva, que provocou a queda da ponte de 120 metros sobre o Rio Ribeira. A ponte ligava a cidade ao município de Cerro Azul, onde a maioria dos moradores adquire bens de primeira necessidade, como alimentos, roupas e medicamentos. Agora o único acesso da cidade passou a ser por Jaguariaíva, o que aumenta o trajeto a Cerro Azul em mais de 360 quilômetros.
Antes mesmo da queda da ponte, Doutor Ulysses se encontrava isolada, não só geograficamente, mas também social e economicamente. Com pontuação de 0,3584, o município tem o pior Índice Ipardes de Desempenho Municipal, que reúne dados de emprego, renda, produção agropecuária, educação e saúde, referentes a 2008. Aparece também com o segundo pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com 0,6270 a cidade de Ortigueira lidera a lista de 2000, com 0,620.
Uma das mais pobres do estado, Doutor Ulysses registra ainda o pior grau de escolaridade entre os 399 municípios paranaenses. Segundo o Censo de 2000, a população acima de 25 anos estudou em média apenas dois anos e meio. Já o rendimento domiciliar médio por habitante foi calculado no ano passado na casa dos R$ 325.
Círculo vicioso
O isolamento físico da cidade impede a instalação de indústrias, o que provoca falta de emprego, baixa renda e escassez na arrecadação de impostos. O município vive um círculo vicioso. Sem verba, o poder público municipal fica impossibilitado de realizar as melhorias necessárias. Para ter mais recursos, seria essencial a instalação de fábricas, por exemplo. Só que as empresas não se interessam pelo município justamente pela falta de acessos pavimentados.
A maioria dos moradores trabalha no serviço público, em pequenos estabelecimentos comerciais ou ainda em pequenas propriedades agrícolas. Os próprios moradores reconhecem as dificuldades enfrentadas pelo município. O encanador Louridi Cândido Brás, 37 anos, que trabalha para a prefeitura, garante que, se a cidade não sair desse isolamento, a tendência é piorar. "Ninguém se interessa em vir para cá fazer investimento. Desse jeito, a coisa não anda. Dependemos diretamente de outras cidades para quase tudo", afirma.
A esposa dele, Rosenilda Brás, 31 anos, diz que o preço dos produtos acaba sendo muito elevado. "A gente consegue comprar cinco quilos de arroz em outra cidade por quase R$ 7. Aqui, o preço chega a R$ 10. É tudo mais caro porque é difícil vir produto para cá."
Segundo o chefe de gabinete da prefeitura, José Paulo Bitencourt, o município sobrevive basicamente do Fundo de Participação de Municípios (FPM), que destina cerca de R$ 750 mil por mês. "Desse jeito a gente não consegue investir em quase nada. Temos aproximadamente dois mil quilômetros de estradas sem pavimentação e que precisam de manutenção. Mas nem maquinário suficiente nós temos", diz. "Sem acesso pavimentado, as indústrias não vêm. Dessa forma, o índice de pobreza cresce, e nosso IDH não melhora."
Vale do Ribeira sofre com altas taxas de pobreza
Um estudo realizado pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), em 2007, diagnosticou que toda a região do Vale do Ribeira, que compreende sete municípios (Adrianópolis, Bocaiuva do Sul, Cerro Azul, Doutor Ulysses, Itaperuçu, Rio Branco do Sul e Tunas do Paraná) convive com problemas sociais e econômicos. Segundo o estudo, todos os municípios apresentavam taxas de pobreza extremamente elevadas, que chegam a alcançar o dobro da média estadual.
"A forte predominância de população rural contribui para a maior concentração de famílias pobres nessas áreas. Com grandes proporções, destacam-se: Doutor Ulysses, com 95,5%, e Adrianópolis e Cerro Azul, nos quais mais de 80% das famílias pobres são rurais", aponta o levantamento.
De acordo com o Ipardes, Doutor Ulysses apresentou as maiores proporções de crianças que trabalham. Na faixa de 10 a 13 anos chegou a atingir 43,7%, e no grupo de 14 a 17 anos, um índice de 66,3%. Acompanharam esses níveis os municípios de Bocaiuva do Sul e Cerro Azul, onde a proporção dos ocupados é superior a 30%.
O Produto Interno Bruto (PIB) do território do Ribeira somou R$ 675,2 milhões em 2004, o que correspondeu a 0,6% do total das riquezas geradas pelo estado. Em 2000, a participação da região no produto paranaense atingiu 0,8%, o que evidencia o declínio da representatividade econômica do território nos últimos anos. Cerro Azul, Adrianópolis e Tunas do Paraná estão entre as dez cidades que menos avançaram na última década e praticamente estagnaram no porcentual de pobreza, com índices acima de 38%.
Saneamento
Outro problema é a parcela de domicílios sem tratamento de esgoto. Para tentar melhorar a infraestrutura, Doutor Ulysses aposta, primeiramente, no saneamento básico. A prefeitura pretende instalar até dezembro deste ano a Estação de Tratamento de Água e Esgoto. "Queremos acabar com as valetas a céu aberto. As ligações nas residências estão prontas. Falta concluirmos a estação", explica o chefe de gabinete José Paulo Bitencourt.
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