Na última sexta-feira (3), ao tentar fazer um pagamento, a advogada Paola da Silva Daniel, esposa do deputado Daniel Siveira (PTB-RJ), ficou sabendo que sua conta bancária havia sido bloqueada por ordem judicial. Ela, entretanto, não consta como parte no processo em que o parlamentar foi julgado, não foi notificada previamente sobre o bloqueio e sequer teve acesso à decisão do ministro Alexandre de Moraes.
A ausência de comunicação da decisão é incomum, uma vez que Paola consta como advogada de Silveira na ação penal 1044, na qual o parlamentar foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a quase nove anos de prisão por críticas e ameaças a ministros – a medida foi anulada posteriormente por decreto de Jair Bolsonaro, que concedeu perdão presidencial ao deputado.
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Paola teve mais informações sobre o bloqueio ao comparecer a sua agência bancária, onde recebeu um documento atestando que a ordem de bloqueio total da conta, da qual ela é a única titular, foi determinada pelo STF. Dias antes, Daniel Silveira havia feito uma transferência para a esposa, o que, segundo ela, pode ter levado Moraes a interpretar que o parlamentar estaria tentando driblar os bloqueios judiciais de suas contas bancárias que atualmente estão em vigência.
A advogada, entretanto, aponta ilegalidades na decisão. Uma delas é que o crime de favorecimento pessoal que ela teria cometido ao receber valores de Silveira, conforme menciona Alexandre de Moraes em intimação de oitiva direcionada à Paola nesta terça-feira (7), não atinge cônjuge do condenado ou investigado, de acordo com o Código Penal.
Em reação à medida, um grupo de 1,4 mil advogados protocolou, nesta segunda-feira (6), um pedido de providências junto ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a decisão de Moraes. No texto, o qual a reportagem teve acesso, os advogados expressam preocupação com ilegalidades e com uma “perseguição política judicial” que estaria em curso por parte de ministros da Corte.
“O estado de coisas inconstitucionais é tão imensurável e patente que agora até mesmo a advogada de defesa do deputado federal Daniel Silveira tem suas prerrogativas aviltadas, tornando-se vítima de medidas cautelares desconhecidas e ‘objeto de investigação e perseguição política judicial’ em processo que não é parte e não tem conhecimento”. No texto, os signatários ressaltam que a advogada não foi citada previamente para exercer seu direito à ampla defesa, nem notificada para tomar conhecimento integral da decisão que culminou no bloqueio de sua conta bancária.
O texto cita, ainda, que há “precedentes ilegais e inconstitucionais travestidos de ‘devido processo legal e constitucionalidade’ pela atual composição da Corte”, materializados pelos inquéritos sigilosos abertos de ofício pelos ministros. Os advogados questionam o fato de que tais inquéritos conduzidos pelo Supremo apuram eventuais crimes cometidos contra os próprios ministros, o que os coloca, ao mesmo tempo, como vítimas, investigadores e julgadores.
Veja a seguir entrevista exclusiva da Gazeta do Povo com Paola Daniel:
Qual é sua avaliação sobre essa nova decisão do ministro Alexandre de Moraes?
Paola Daniel: O Alexandre de Moraes está querendo me imputar o suposto crime do artigo 348 do Código Penal, que é o favorecimento pessoal. Esse crime ocorre quando se presta assistência de qualquer natureza a quem acaba de cometer um crime. Mas não houve crime, até porque eu sou advogada de defesa dele na Ação Penal 1044 e recebo meus honorários. O Daniel Silveira fez uma transferência para mim, e essa transferência é dinheiro da conta bancária dele, dinheiro lícito, declarado.
Além de não haver o suposto crime do artigo 348, o parágrafo 2 deste mesmo artigo diz que são isentos de pena parentes ascendentes e descendentes, irmãos e cônjuge, como é o meu caso. Então é algo completamente sem nexo e sem sentido.
Ele bloqueou valor superior à transferência que o Daniel fez para você?
Paola Daniel: Sim. Não foi bloqueado só o valor transferido, mas o valor total da minha conta.
A quantia bloqueada é quase seis vezes maior do que o valor transferido. Não foi bloqueio parcial e sim integral. Mas mesmo que fosse apenas a quantia transferida, ainda assim seria ilegal.
O artigo 5, inciso XLV, da Constituição Federal proíbe que a pena passe da pessoa do condenado, o que é chamado Princípio da Intranscendência da pena. O Alexandre de Moraes violou a Constituição, violou minha prerrogativa como advogada e violou vários artigos da lei de abuso de autoridade. Isso está prejudicando outras pessoas além do Daniel e só comprova que os ministros do Supremo hoje, em sua maioria, são carrascos da sociedade.
Você ainda não teve acesso à decisão que ordenou o bloqueio?
Paola Daniel: Eu não fui notificada de nada, não houve comunicação alguma. Minha conta simplesmente foi bloqueada sem nenhum aviso prévio. E isso sem eu fazer parte de processo algum.
O que eu tive acesso foi uma intimação para uma oitiva para prestar esclarecimentos sobre o fato de o Daniel ter feito uma transferência de valor para a minha conta. Essa intimação eu tive conhecimento nesta terça-feira (7).
Quando fiz a publicação no Twitter, na última sexta-feira (3), dizendo que o bloqueio havia sido ordenado pelo Alexandre de Moraes, eu já sabia do que se tratava, embora sem despacho, decisão, comunicação alguma, porque não existe nenhuma ação contra mim em nenhum estado da federação.
Como você avalia essa decisão do ministro?
Paola Daniel: Sinceramente não sei se ele não sabia que eu fazia parte do processo como advogada. Pelo visto ele entendeu que o Daniel estava tentando burlar os bloqueios transferindo essa quantia para mim. Ao meu ver, esse foi o pensamento dele, que é completamente equivocado.
Até o momento, quais foram os bloqueios financeiros aplicados ao Daniel por descumprimento de medida cautelar?
Paola Daniel: Por volta dos R$700 mil. O perigo disso tudo é que essas multas não têm fim. Após o decreto do presidente, nós entramos com um agravo pedindo a extinção dessas medidas, mas o ministro não aceitou. Então dia após dia vão surgindo mais multas. E enquanto a ministra Rosa Weber não analisar o caso e não atestar a constitucionalidade do decreto, a tendência é que essas multas só aumentem.
Mas é importante destacar que o decreto da graça é válido desde o momento da sua publicação. A única atuação do STF é declarar a constitucionalidade ou não do decreto. E é isso que está nas mãos da Rosa Weber, e que está demorando um tempão para ser analisado. Tudo o que é para prejudicar o Daniel tem acontecido de um dia para o outro, como um passe de mágica, enquanto o que é para beneficiar demora excessivamente.
O Daniel pretende ser candidato ao Senado neste ano, mas há posicionamentos de figuras como o procurador-geral da República, o presidente do Senado e ministros do STF apontando que, apesar de os efeitos do indulto anularem a pena, o Daniel está inelegível. Como você avalia isso?
Paola Daniel: Legalmente o Daniel está elegível. A Súmula 9, do TSE, diz que a “suspensão de direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena”. Então, uma vez que houve o perdão decretado pelo presidente, houve a extinção da pena. Portanto, juridicamente o Daniel não está inelegível.
Vale dizer que essa perseguição por parte do STF é totalmente de cunho pessoal. No Senado, o Daniel seria um perigo para os ministros do Supremo. Lá, ele iria botar pressão para pautar o impeachment de algum dos ministros, isso é fato. Por isso eles estão nessa briga tão grande para torná-lo inelegível.
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