Artigo
Desafios da formação técnica no Paraná
Ronaldo Casagrande, diretor do Centro Tecnológico da Universidade Positivo (CTUP)
O apagão de mão de obra é um tema recorrente quando o assunto é o crescimento do Brasil para os próximos anos. Atualmente faltam profissionais qualificados em todas as áreas e em todos os níveis. Porém, a maior escassez, especialmente no Paraná, não é por advogados, administradores e outros bacharéis e sim por pessoas com habilidades técnicas específicas. O mercado de trabalho tem um déficit muito grande desses profissionais em diversas áreas, especialmente àquelas ligadas a infraestrutura e produção, tais como petróleo e gás, construção civil, controle e processos industriais, entre outras.
O mercado está remunerando muito bem profissionais de nível técnico ligado a essas áreas. Mas por que então há falta de pessoas com esse perfil? Pode-se discorrer aqui sobre várias causas que levaram a essa escassez, mas gostaria de destacar especialmente duas. Primeiramente não podemos ignorar que no Brasil houve historicamente um forte preconceito com a formação profissional.
Desde suas origens, a formação profissional foi destinada a classes sociais menos favorecidas e teve como objetivo principal a resolução de problemas sociais. O próprio trabalho, especialmente o manual e operacional, sempre sofreu preconceito em nosso país. Vale lembrar que a palavra trabalho tem sua origem na palavra latina Tripalium, instrumento de tortura utilizado com escravos. O preconceito em relação ao trabalho operacional pode ser evidenciado, ainda nos dias de hoje, quando vemos filhos de pessoas de classe média alta que trabalham por longos períodos nos EUA como babás e garçons, mas que se recusam a realizar esse tipo de serviço no Brasil.
Outro problema que temos no avanço da formação técnica é em relação ao financiamento para estudo. Podemos, de forma simplista, identificar dois grandes financiadores, sendo um o poder público e outro, o privado, constituído especialmente pelo segmento empresarial (representado pelo Sistema S) e também pelas próprias pessoas que buscam uma formação. Especificamente nas últimas duas décadas, o poder público identificou a necessidade de promover a formação de profissionais de nível técnico de qualidade e desde então vem desenvolvendo programas para acelerar esse tipo de formação.
O grande problema é que tanto o poder público quanto o Sistema S não têm recursos suficientes para formar toda a demanda necessária. Por outro lado, o público interessado em buscar uma formação profissional normalmente não consegue arcar, também, com os custos de uma boa formação profissional.
Hoje, a formação técnica é uma ótima opção, tanto para a pessoa, que é bem remunerada, quanto para o país, que necessita desse perfil de profissional para se desenvolver. Porém, para resolver o problema da formação profissional deve haver, pelo menos, a superação das barreiras aqui relacionadas: o problema cultural de preconceito com a formação profissional e o financiamento ao estudante.
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Cursar o ensino médio e já sair com uma formação profissional, ou concluir o ensino regular e entrar mais cedo no mercado de trabalho por meio de um curso técnico subsequente são possibilidades que empolgam menos jovens do que se poderia imaginar. No Brasil, a evasão geral no ensino médio é de 10,3% índice que cai para 6,7% no Paraná, de acordo com dados do Censo Escolar de 2010. O Ministério da Educação e a Secretaria Estadual de Educação (Seed) não divulgam dados específicos sobre o abandono nos cursos técnicos, mas, segundo escolas e profissionais consultados, as taxas são preocupantes. Uma amostra disso é que, em seu plano de metas, a Seed trata o combate ao abandono no ensino técnico como prioridade.
Na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) a evasão nos cursos técnicos integrados ao ensino médio passou de 13,66% em 2010 para 16,18% no ano passado. No Instituto Federal do Paraná (IFPR) a evasão foi baixa em 2011: 2,09% dos estudantes abandonaram os cursos integrados e subsequentes, o que representa 640 dos quase 30 mil alunos. Mas esse quadro positivo é recente e resulta de um trabalho específico para combater a desistência. Em 2009, o número foi 79% maior 1.146 estudantes largaram seus cursos. Em 2010, houve 1.768 desistências.
Razões
Entre as principais razões para a desistência estão o desconhecimento e a insatisfação com a estrutura dos cursos e a opção por dar continuidade aos estudos no ensino superior. No entanto, a mais preocupante é a vulnerabilidade social, já que muitos estudantes conciliam os estudos com o trabalho.
Há casos de alunos que abandonam o curso por não conseguirem acompanhar as aulas ou por não terem gostado da escolha. Existem estudantes, por exemplo, que optam por uma formação em informática pensando em áreas de interesse, como a internet, mas esquecem que há muita matemática como base para os estudos. "Por ter um processo seletivo relativamente concorrido, os alunos que ingressam possuem uma base consistente na formação geral, encontrando dificuldade nas áreas técnicas", afirma Sonia Ana Leszczynski, chefe do Departamento de Educação da UTFPR.
Análise
O professor Irineu Mario Colombo, reitor do IFPR, considera os índices de evasão na instituição preocupantes, já que o governo federal faz um investimento grande nesses cursos. Para reverter o quadro, o IFPR deve investir R$ 5 milhões neste ano apenas em programas de assistência estudantil, para apoiar a permanência dos alunos.
Colombo ainda faz uma ressalva em relação aos índices elevados de evasão: a economia aquecida. "Para cursos técnicos, a demanda aquecida não estimula a permanência", afirma. Ele dá como exemplo o mercado da construção civil em alta. Um aluno que cursa o técnico em edificações pela manhã e é muito solicitado pelo mercado acaba abandonando o curso para atender a essa demanda.
No TECPUC, centro de ensino técnico ligado à PUCPR, um trabalho de avaliação da evasão ajudou os profissionais a entenderem melhor as razões dos estudantes. "Um grande porcentual da evasão ocorre pelo fato de os alunos serem os próprios pagantes do curso e não conseguirem conciliar as atividades do dia a dia e os estudos", explica Roger Steppan, diretor do TECPUC.
Trampolim
Aulas foram meio de ingressar rapidamente no mercado de trabalho
Em 2010, Natalie Patrício, de 24 anos, decidiu estudar Produção de Áudio e Vídeo no IFPR, um dos novos cursos ofertados na instituição após sua criação, em 2008. Em meio a atrasos na formação por falta de professores, que ainda estavam sendo contratados, e deficiências com equipamentos, a jovem quase desistiu do curso por falta de dinheiro.
Morando sozinha em Curitiba, Natalie aproveitava o vale-transporte que recebia no trabalho para ir até o instituto. Quando parou de trabalhar, o orçamento ficou apertado. Com problemas de saúde, ela perdeu muitas aulas e quase largou os estudos. "Aí apareceu a bolsa de inclusão social e pude continuar", conta. Em troca do dinheiro, R$ 200 mensais, Natalie fez monitoria acadêmica, o que ainda a auxiliou nos estudos.
Hoje a jovem trabalha na área e sonha em continuar os estudos em um curso superior de Medicina. "Escolhi o curso técnico porque dura menos tempo e você sai um profissional formado." Natalie faz aulas no pré-vestibular gratuito Em Ação nos fins de semana e se prepara para prestar vestibular no fim do ano. "A gente tem de comer, se vestir, então, precisa trabalhar", resume.
Informação
"Não sabia muito bem o que era o curso e caí de paraquedas"
O curso técnico em Mecânica, ofertado de forma integrada ao ensino médio, pareceu uma boa oportunidade para o jovem Igor Fabiano de Castro do Nascimento, 17 anos. Mesmo assim, ele desistiu da formação profissional e voltou ao ensino médio regular. "Aconteceu o que acontece com um monte de pessoas: não sabia muito bem o que era o curso e caí de paraquedas. Saí porque não era o que eu queria", conta.
De volta ao segundo ano do ensino médio, o jovem estuda hoje no Colégio Estadual Rodolpho Zaninelli, na Cidade Industrial de Curitiba, onde também cursou metade do ensino técnico. "Não tinha estrutura e ficou mais viável largar o técnico e ficar no regular", conta, lembrando que entre as razões para a troca estavam a falta de laboratórios e de professores.
Segundo Marilda Diório Menegazzo, diretora do Departamento de Educação e Trabalho da Secretaria de Estado da Educação (Seed), para diminuir a taxa de evasão, as escolas estão sendo orientadas a explicar melhor para o aluno o que ele vai encontrar e estudar no ensino técnico. Além disso, novos laboratórios estão sendo preparados. Atualmente, a rede estadual tem 89.858 alunos no ensino médio profissionalizante, que está presente em quase todas as cidades do Paraná.
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