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O novo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Alberto Simonetti, conhecido como Beto Simonetti, defendeu o polêmico inquérito das fake news, aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e afirmou que a Corte tem “obrigação de manter o equilíbrio da democracia”. A declaração foi dada em entrevista à Veja. Simonetti, aliado do antigo presidente da entidade, Felipe Santa Cruz (que já foi filiado ao PT e pode sair candidato pelo PSD em 2022), foi eleito na segunda-feira (31) para presidir o Conselho Federal da OAB por três anos.
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O inquérito das fake news é questionado no mundo jurídico por diversos motivos. Um dos principais é sua arbitrariedade, já que o STF estaria atuando como juiz, vítima e acusador de um julgamento ao mesmo tempo. A Corte só pode instaurar investigações por conta própria em caso de crimes ocorridos dentro do tribunal. Outras questões inconstitucionais no inquérito seriam a prisão desproporcional de parlamentares, jornalistas e políticos com decisões (como a censura prévia ao deputado Daniel Silveira) fundamentadas na antiga Lei da Segurança Nacional, criada durante a ditadura militar e revogada em setembro do ano passado.
Além de defender o inquérito do STF, ao tratar de fake news, o presidente da OAB disse que se trata de um “câncer da democracia” e que a Ordem vai acompanhar essa questão, principalmente nas eleições. No tocante ao pleito, acrescentou: “Estaremos junto ao TSE, apoiando esse modelo eleitoral que nós temos hoje no Brasil que já se mostrou eficaz”, salientou Simonetti à Veja.
Para ele, o combate às fake news deve ser feito por meio da educação e da Justiça. O presidente da OAB disse que a pena para esse tipo de conduta deve ser pedagógica e que a legislação precisa avançar nesse tocante. Um dos pontos é a necessidade de identificação da origem da notícia falsa, já que muitas vezes ocorre fora do Brasil.
Ao ser questionado pela Veja se aplicativos como o Telegram devem ser proibidos nas eleições, ele não deu uma resposta categórica sobre uma possível proibição, mas defendeu que “em princípio, falando não só do Telegram ou de qualquer outro aplicativo, deve assumir a culpa quem propaga as fake news”, afirmou.
Já sobre a liberdade de expressão, o presidente da OAB disse que é um defensor ativo desse direito, mas salientou que o excessos devem ser coibidos. Para ele, há uma linha divisória entre liberdade de expressão e o cometimento de um crime.
Bolsonaro
Diferente da postura de seu antecessor, Felipe Santa Cruz, Beto Simonetti adotou um tom moderado nessa entrevista nas respostas que tinham alguma com relação ao presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). Ele afirmou que não considera que a ausência de Bolsonaro no depoimento à Polícia Federal - marcado pelo ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito sobre o vazamento de dados sigilosos sobre um suposto ataque ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) - seja um ferimento de uma norma penal. Ele defendeu que o investigado tem a garantia da não autoincriminação, o que inclui ficar calado ou até “abrir mão” do depoimento no inquérito.
Sobre uma suposta ruptura democrática no Brasil, o presidente da OAB destacou a solidez da democracia brasileira e afirmou que acredita no respeito e na independência dos poderes. Salientou também que a Ordem está atenta e que poderá até assumir o papel de fazer a interlocução entre os poderes, caso seja acionada para isso. “A Ordem nunca se furtará a prestar seu compromisso constitucional. Sempre que o estado democrático de direito estiver em risco, a OAB vai se colocar e não precisa de convite de ninguém”, afirmou.
Com relação a um pedido de impeachment de Bolsonaro, o qual supostamente poderia ter contado com a participação da Ordem, Simonetti disse que ele foi rechaçado pelo Conselho Federal por unanimidade naquele momento por falta de provas. Nas palavras dele à Veja: “Nós só podemos caminhar com um pedido de impeachment se tivermos a coleta de todas as provas necessárias e, naquele momento, nós não tínhamos. Por isso o resultado foi esse”, comentou.
Críticas a Lava Jato
O presidente da OAB também criticou a Operação Lava Jato na entrevista à Veja e disse que o legado dela é muito negativo devido à forma como foi conduzida. Na visão dele, houve violações aos direitos dos advogados e a delação premiada foi mal utilizada. Simonetti chegou afirmar que parte do desemprego que se tem no Brasil é culpa da forma como se deu a condução dos trabalhos da Lava Jato, o que culminou com a quebra de grandes empresas e perda de postos de trabalho.
Sobre o caso específico da anulação de processos relativos ao ex-presidente e pré-candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Simonetti disse que não tinha conhecimento das provas e não queria entrar no mérito da inocência ou não do petista. Ainda assim, voltou a defender o STF. “Se o Supremo identificou que ali havia nulidades, acertou se anulou provas inválidas”, afirmou.
Mesmo com as críticas à Lava Jato, o presidente da OAB também evitou fazer críticas diretas ao ex-juiz e também pré-candidato Sergio Moro ao ser questionado sobre um possível dilema ético quanto à provável candidatura do representante do Podemos na eleição presidencial. Mas afirmou que "esse é um sentimento que quem tem que carregar é o ex-juiz Sergio Moro".
Simonetti afirmou também que a entidade não tem preferência por candidato e que a OAB quer ter diálogo com quem for eleito - independentemente de quem seja eleito.
Prisão em segunda instância
Com relação à prisão em segunda instância, Simonetti defendeu que a atual legislação prevê que a pessoa será encarcerada após a decisão transitar em julgado. Segundo ele, a mudança da lei é de competência do Legislativo e não deveria ocorrer por meio de decisões judiciais.