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Entrevista

“Fazem da imunidade a impunidade”

Ex-petista, o deputado federal Chico Alencar (PSol) virou um dos ícones entre os "chatos" da Câmara, liderando apoios à instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito que podem causar constrangimento aos colegas. Professor, está no segundo mandato na Câmara e diz que, às vezes, sente-se cansado por compor uma minoria que cobra transparência no Congresso.

Por que é tão difícil falar em punição no Congresso?Porque há uma tradição no Brasil da política como corporação. Inclusive a expressão "classe política" – que inventa uma categoria inexistente – reforça a idéia de constituição de uma casta, daqueles que recebem o direito de representar o povo e gerir o negócio público. Mas, ao mesmo tempo, eles querem esse povo bem distante. Isso fere o princípio de representação, que é necessariamente transitória. Não existe carreira política, muito menos classe política. Nós somos apenas servidores públicos temporários. Estamos aqui em função do voto popular. Há deputados que até torcem para que os eleitores os esqueçam durante os quatro anos, quando eles procuram mudar de status, crescer financeiramente, aumentar o patrimônio... Ao invés de servir, busca-se ser servido pelo erário público. É uma distorção que ameaça a democracia.

Qual o verdadeiro número de deputados preocupados com a ética parlamentar?Há mais de cem. Alguns estão na linha de frente, tem uma atitude mais pró-ativa. Outros são mais tímidos, mas são pessoas rigorosamente honestas, que ficam escandalizadas com procedimentos fisiológicos, corporativos e clientelistas. O problema é que há um número enorme de parlamentares que têm como objetivo maior reproduzir o seu próprio mandato. Até nas discussões da reforma política, a principal preocupação é essa: como, com essas mudanças inevitáveis, eu posso continuar aqui? E há aqueles que fazem da imunidade parlamentar a impunidade criminal. Há um arsenal jurídico que acaba favorecendo a impunidade. A reforma política sai?É difícil, vamos ver se conseguimos fazer ao menos o que está proposto por enquanto, que não merece o nome de reforma política e sim de alterações do sistema eleitoral. Agora, a reforma política não pode ser só infraconstitucional. Temos de estudar outras coisas, até o papel do Congresso bicameral. Precisávamos reforçar mais a democracia direta, com referendos e plebiscitos.

Por que há tanto esforço para proteger o Renan?Ele é poderoso. É um homem que tem uma capacidade camaleônica muito grande. Foi líder do governo Collor, ministro do Fernando Henrique, aliado fundamental de Lula. Isso já mostra como, em diferentes circunstâncias, ele cumpre esse papel de estar sempre bem com o poder. Ele criou uma rede de relações no Senado, até de cumplicidade, de amizade, muito forte. Há gente que sabe que tem de questionar algumas coisas, mas não se sente à vontade para fazer isso. Por fim, como ele está sendo acusado de ser bancado por empreiteiras, está muito bem calçado. Afinal, os maiores partidos do Congresso Nacional, que alimentaram a campanha de mais de 300 parlamentares, são o PEB, Partido das Empreiteiras e Banqueiros, e o PPE, Partido do Poder Econômico.

Não cansa essa luta em minoria?Às vezes desanima um pouco, sabe? Eu mesmo me sinto mal em muitas situações. Mas aí, quando eu vejo que é possível fazer dessa vergonha um país, que ainda há muita gente de fora daqui que acredita, com espírito de cidadania, ergo a cabeça. As pessoas de bem ainda são uma grande maioria. E a gente tem de representá-las aqui dentro. É isso que dá força para continuar. (AG)

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