Jogos trazem diversão e prejuízos
Em contraponto à série de benefícios que um jogo pode trazer, como agilidade mental e desenvolvimento de estratégias, o vício e prejuízos à saúde podem se tornar um problema para quem se envolve com esse tipo de entretenimento. "Alerto meus amigos que querem começar a jogar o Colheita Feliz: cuidado que vicia muito", conta Ana Cláudia Schleder, 12 anos.
Segundo o educador Tiago Gomes, o perigo do vício existe porque o jogo traz um reconhecimento muito rápido dentro do grupo de amigos. "Quanto mais ativo for o jogador, mais ele vai estar sob a influência do jogo, seja em bons ou maus aspectos", adverte. No caso do Colheita Feliz, quanto mais jogar, melhor será a classificação do jogador no ranking formado entre os amigos.
A psicopedagoga Márcia Lígia de Oliveira, assessora da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), alerta que os jogos sejam em computador ou consoles de videogame também podem trazer prejuízos ao desenvolvimento de crianças e adolescentes. Os pais devem estar atentos a sinais que podem estar relacionados aos efeitos provocados pelos jogos excesso de fadiga, perda de apetite, mudança de comportamento, sono agitado, distração e baixo desempenho na escola. "Não é todo mundo que joga que vai ficar doente", afirma Márcia. "São pessoas que já têm uma predisposição genética, alguma característica que antecede a isso. O jogo pode funcionar como um desencadeante."
É importante que os pais se interessem pelo que os filhos fazem na frente do computador. "O acompanhamento é essencial para saber o que a criança está fazendo", aconselha Gomes. "O filho está aberto em um mundo novo que o pai não sabe o que é." Márcia orienta que os pais prestem atenção ao tipo, ao conteúdo, à dinâmica, à faixa etária e às entrelinhas do jogo. "A questão da supervisão é muito importante: os pais devem ser companheiros e orientadores", ensina. "Tem de haver um tipo de diálogo e entendimento com os filhos. É interessante que os pais joguem junto para acompanhar de perto."
A especialista aconselha que os pais moderem o tempo que as crianças passam jogando e intercalem a brincadeira com outras atividades. É o que faz Déborah Correia Lima Figueiroa, mãe de Eduardo, de 13 anos. "Pode jogar, desde que tenha moderação", diz. "Volta e meia vejo o que ele está fazendo. Ele é bem cobrado e tem de saber controlar e dividir o tempo. No banco dos réus, eu não sentenciaria os jogos eletrônicos como culpados ou inocentes."
A nova febre de redes sociais da internet são as fazendas virtuais. Cuidar de animais, colher frutos e manter a propriedade protegida de invasores têm levado muita gente a passar horas conectada. Não são apenas crianças e jovens que ficam envolvidos pela dinâmica do jogo tem muito adulto preocupado em ordenhar vaca e colher berinjelas eletrônicas por aí. São quase 10 milhões de usuários do Colheita Feliz no Orkut (a principal rede social no Brasil) e pouco mais de 73 milhões de participantes do FarmVille no Facebook (mais popular em outros países) uma população total equivalente a da Alemanha. Entretanto, diante da brincadeira, o vício pode se tornar um problema entre os jogadores.A lógica dos jogos é basicamente a mesma: plantar frutos e criar animais para vender a produção e crescer no jogo seja em experiência, popularidade ou riqueza. Para isso, a estratégia de cada um é o que conta, nem que seja necessário invadir a propriedade dos amigos para se beneficiar de alguns frutos ou ovos, ajudar a regar as plantações ou empesteá-las. O jogador escolhe se quer ser vilão, mocinho ou as duas coisas.Para dar início a uma criação de animais ou a um novo plantio, é preciso ir às compras gastando dinheiro virtual. Contudo, os reais também podem ser investidos ou torrados , já que alguns bens cibernéticos só podem ser adquiridos com um outro tipo de moeda eletrônica que precisa ser cambiada (R$ 10 equivalem a 100 "moedas verdes" no Colheita Feliz, o mais popular entre os brasileiros). "Não sei até quando vou conseguir ficar sem comprar Moedas Verdes. Quero comprar um cachorro e mais terras" conta a costureira Telma Maciel de Souza, de 47 anos. Ela não resistiu ao ver os sobrinhos jogarem e entrou na onda.
Para o educador Tiago Gomes, especialista em tecnologia educativa, esse tipo de jogo pode trazer benefícios para o desenvolvimento da criança. "É um jogo de administração de recursos. A criança pode aprender a controlar gastos, administrar tempo e dinheiro", comenta. Entretanto, Gomes também aponta o benefício social do jogo como a principal vantagem. "Nesses jogos você depende do seu grupo social para jogar. Se não tem amigos, não consegue realizar as atividades", acrescenta. São jogos que se popularizaram a partir do ano 2000, com o aumento das redes sociais e a propagação da banda larga.
Há três meses, a professora Bárbara Karolyne Morais, de 24 anos, montou sua fazenda no Colheita Feliz. Ela acredita que o jogo é um bom começo para que as crianças da cidade tenham um primeiro contato e se interessem pelo maio rural. "Eles pedem para ter seu próprio plantio. Querem passar a experiência do virtual para a realidade e já têm noção de que demora para uma planta crescer", comenta Bárbara, que deseja comprar um pavão em breve para lucrar com a venda das penas. "Você aprende com o jogo a cuidar de uma plantação. Se você não tem muito contato com isso, você aprende", avalia Eduardo Figueiroa, de 13 anos, jogador do Colheita Feliz desde o começo deste mês.
A dinâmica do jogo faz com que o participante acesse sua fazenda e as dos outros várias vezes ao dia. Para que outros não roubem o leite da vaca, por exemplo, o dono deve estar pronto para recolher o balde 7h30 depois de ter alimentado o bicho. "É uma coisa que envolve. Eu acordo a qualquer hora para roubar dos outros", revela Telma. A costureira diz que joga sete vezes por dia durante períodos de até 45 minutos cerca de cinco horas por dia.
"Eu acordava 6 horas e ligava o computador antes de ir para a escola para não correr o risco que me roubassem", conta Ana Cláudia Schleder, 12 anos. Ela lembra que chegou a ter um caderno para anotar o horário que precisava invadir a propriedade dos amigos para roubar parte da produção de cada um. "Eu colocava despertador para lembrar o que eu precisava fazer", diz. Ana reduziu o número de acessos depois que os pais começaram a interferir e acharam um meio de deixá-la incomodada. "Passaram a me provocar, me chamando de Menina da Colheita", conta.
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