Advogadas segurando latas de cerveja e bebendo durante a 4ª Conferência Nacional da Mulher promovida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) tentaram impedir uma palestra da influenciadora Cintia Chagas realizada na sede da OAB-PR em Curitiba, na última sexta-feira (15).
A professora de português declaradamente conservadora e casada com o deputado Lucas Bove (PL) daria dicas de oratória para as participantes do evento, mas foi surpreendida por mulheres que protestavam no local. “Elas representavam cerca de 10% do público e começaram a gritar palavras como ‘fascista’, ‘machista’ e que eu não as representava”, relata a palestrante que, em vez de iniciar o discurso previamente planejado, se posicionou sobre o fato.
“Há um grupo minoritário ali no fundo que prega a democracia”, disse ao subir no palco e pegar o microfone. “Todavia, esse grupo está retirando o direito de todas vocês assistirem à minha palestra, de modo que a democracia evocada e a sororidade não passam de pseudodemocracia e pseudosororidade”, continuou, em referência ao termo usado para representar ideia de irmandade, empatia e companheirismo entre mulheres.
A professora, então, ficou em silêncio enquanto as demais advogadas gritavam “respeito, respeito”, e organizadores do evento tentavam acalmar as manifestantes. “A democracia é exatamente isso”, afirmou o presidente nacional da OAB, Beto Simonetti, que subiu ao palco. “Eu garanto a todas vocês o direito ao protesto, mas garanto também a todas vocês o direito de assistir à palestra que vamos promover”, acrescentou, sob aplausos.
Após cerca de 20 minutos, a escritora iniciou a palestra em meio aos gritos e afirma que conseguiu passar o conteúdo planejado. “Só que todos perdem quando não há espaço para o diálogo”, aponta, ao caracterizar o protesto realizado como “improdutivo”.
“Isso acaba enfraquecendo o movimento feminista que elas tanto defendem porque mancha a imagem do movimento e a imagem da esquerda”, destaca, ressaltando que “o caminho da barbárie jamais será o caminho da solução”.
Seccionais da OAB se posicionam
Após o ocorrido, algumas seccionais da OAB se posicionaram a respeito dos fatos, citando a importância da liberdade de expressão. De acordo com a OAB de Rondônia, por exemplo, esse é um “princípio essencial em uma sociedade livre e democrática”, mas tem sido negligenciado em “episódios de interrupção de eventos e manifestações contrárias ao livre debate de ideias e à diversidade de pensamento”, pontuou.
Ainda segundo a nota da seccional, um Estado Democrático de Direito deve “garantir a todos o direito de se expressar e serem ouvidos, sem qualquer forma de intimidação, coação ou censura”, pois “a pluralidade de ideias enriquece o debate público e é essencial para o fortalecimento da democracia”.
A OAB de Santa Catarina também se manifestou por meio das comissões da Mulher Advogada e do Combate à Violência e Direito da Vítima. “A democracia traz consigo o entendimento de que é nosso direito falar e ser ouvida, seja qual for o lado político ou se concordamos com a pessoa ou não”, afirmou, ao pedir “que nossa máxima seja sempre o respeito e empatia para com as pessoas”.
A OAB-PR, que sediou a conferência, preferiu não se manifestar e pediu à reportagem que procurasse o Conselho Federal da OAB, responsável pelo evento. A equipe entrou em contato, mas não recebeu retorno até a publicação desse texto. O espaço segue aberto.
Quais foram os motivos da manifestação?
Em entrevista à Gazeta do Povo, Cintia Chagas explicou que a manifestação com latas e copos de cerveja ocorreu devido a publicações que ela fez em suas redes sociais dizendo que acha cerveja uma bebida “deselegante” para mulheres. Inclusive, “quando cheguei para realizar a palestra, soube que havia rumores de que poderiam jogar cerveja em mim, e precisei entrar acompanhada por seguranças e por um integrante do Corpo de Bombeiros”, diz, ressaltando que nenhuma bebida foi jogada contra ela.
Outra postagem que pode ter desagradado as manifestantes, de acordo com a professora, foi a respeito de “a casa girar ao redor do homem”. De acordo com Cintia, o objetivo do conteúdo foi incentivar “as famílias a se reunirem”, o que, muitas vezes, só é possível depois que o marido chega em casa.
“Mas o que ocorreu ali, na verdade, é que o protesto não foi contra mim, mas por questão política”, finaliza.
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