"Meus amigos de vagabundagem lá de São Luís vão dizer "Ih, é o periquito de fardão", diz Ferreira Gullar (foto), e dá uma gargalhada. O poeta de 84 anos, crítico de arte, dramaturgo e tradutor conhecido por sua postura transgressora, é o novo imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL), eleito ontem. Ele será o titular da cadeira 37, antes ocupada pelo poeta e tradutor Ivan Junqueira, morto em julho.
Confirmando o favoritismo, recebeu 36 dos 37 votos. Um foi em branco. Os acadêmicos desconversam sobre quem teria votado em branco. "A queima dos votos ao final da cerimônia tem um significado simbólico. Desaparecem os vestígios", disse Nélida Piñon.
"Foi uma batalha longa para convencê-lo. Os bons candidatos não precisam da Academia", afirmou o historiador José Murilo de Carvalho.
Gullar resistia aos convites insistentes dos acadêmicos havia 20 anos. "A minha entrada para a Academia é uma transgressão comigo mesmo", disse ele sobre o fato de ter mudado de ideia.
Ele conta que decidiu se candidatar porque sua visão sobre a instituição mudou. "Eu não queria entrar para a Academia porque não tenho espírito acadêmico. Mas hoje ela não é mais o que era, é uma instituição aberta."
José Ribamar Ferreira adotou aos 18 anos o pseudônimo de Ferreira Gullar. Mudou-se para o Rio em 1951, onde participou da fase inicial do movimento concretista. Rompeu com o movimento em 1957 por considerá-lo excessivamente racional. A partir da década de 1960, sua obra passou a refletir seu engajamento político. Com o AI-5, foi preso, e passou a viver no exílio a partir de 1971. É dessa época seu livro mais conhecido, "Poema Sujo" (1976). "É uma das melhores coisas que escrevi."
A edição completa de sua obra poética, "Toda Poesia", foi publicada em 1980. Gullar recebeu diversos prêmios ao longo da vida, entre eles o Camões, em 2010.