Além das propagandas tendenciosas sobre o uso medicinal da maconha, festas clandestinas com distribuição e uso indiscriminado da droga, ilícitos tipificados na legislação, também se tornaram frequentes no Brasil. Em algumas universidades do país, existem até eventos que "ensinam" a usar drogas com menos riscos para a saúde, como o "Peruada" que ocorreu em outubro do ano passado na Universidade de São Paulo (USP).
Outras iniciativas do estilo, entre muitas que poderiam ser citadas, foi a instalação de um estande que ensinava pessoas a “produzirem o seu próprio medicamento com a cannabis” (a produção clandestina é ilegal e faz mal à saúde), no Universo Paralello, festival de música alternativa. O expositor responsável pela “orientação” sobre o tema era a Pango CBD - Universo Canábico, que divulgava a existência da suposta “maconha medicinal” (termo distorcido). O evento ocorreu sem nenhuma intercorrência e com forte apologia ao uso da maconha.
Esse cenário despreza a legislação que prevê que o uso e porte de substâncias entorpecentes é crime, previsto na Lei 11.343/2006, a qual instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. O artigo 2º dessa lei deixa claro que são proibidas “em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas”.
Essa lei também estabelece penas para quem portar drogas para consumo próprio. A infração, todavia, considerada menos grave, não prevê pena de detenção ou de reclusão. O artigo 28 descreve que a compra, guarda ou porte de drogas sem autorização estão sujeitos às penas de advertência sobre efeitos do uso de entorpecentes, prestação de serviços à comunidade e participação obrigatória em programa educativo. A caracterização do consumo pessoal deve considerar a natureza e quantidade da substância apreendida, forma e local onde ocorreu a apreensão, circunstâncias sociais e pessoais do autuado, bem como sua conduta e antecedentes criminais.
Apesar disso, muitas dessas festas ou iniciativas pelo uso de drogas continuam com pouca ou nenhuma resistência das autoridades. “Esses eventos estão cada vez mais comuns. A própria Marcha da Maconha, que foi autorizada pelo STF pela liberdade de expressão, não para incentivar o uso das drogas, tornou-se na prática um evento com consumo aberto de entorpecentes no meio da rua, mas a polícia não pode intervir. Até dentro das universidades é comum. Estão legalizando a maconha na marra”, afirma o advogado Roberto Lasserre, do Movimento Brasil sem Drogas.
A declaração da constitucionalidade da Marcha da Maconha, por parte do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011, desencadeou a realização de uma série de eventos sobre o tema. A decisão do Supremo teve como base o direito, garantido na Constituição, de expressar ideias e se reunir para debater sobre elas. Mas, apesar de a Corte não ter liberado (nem poderia) que participantes desses eventos aproveitassem o momento e infringissem a lei que proíbe o uso de drogas, é isso que tem ocorrido em vários desses encontros.
Para o procurador Lucas Gualtieri, a Justiça precisa “fazer valer a legislação brasileira, que tipifica como crime o uso e a venda de drogas ilícitas” e agir “firmemente para reprimir o tráfico de drogas, punindo de forma adequada aquelas que o praticam”.
A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de assumir o poder de decidir sobre a liberação da plantação de cannabis no país, em uma ação ajuizada pela empresa DNA Soluções em Biotecnologia, interessada no uso comercial da planta, preocupa o procurador. “Não me parece que seja um papel adequado da Justiça implantar ou alterar políticas públicas relacionadas às drogas. Ocorre que atualmente a Justiça tem agido de modo exatamente oposto. O que se tem visto é um afrouxamento desmedido na temática criminal e um ativismo indesejado em matéria de política de drogas”, destacou o procurador.
Atuação policial
Gualtieri afirma que as polícias têm importante papel na repressão à venda e ao uso de drogas e que, em geral, atuam de forma adequada. Porém, ressalta que a atuação da polícia é dificultada pela própria legislação brasileira, como quando prevê, por exemplo, que o porte para consumo próprio seria de menor potencial ofensivo.
“Esse delito sequer é sujeito a pena privativa de liberdade. Isso faz com que, ordinariamente, as ações repressivas do sistema de Justiça, para que sejam mais efetivas, sejam pautadas em inteligência e visem a coibir a venda da droga, já que o tráfico, ao menos para o legislador, é considerado um crime grave”, disse.
Em relação as decisões judiciais, inclusive dos tribunais superiores, Gualtieri lamentou que elas “têm sido cada vez mais lenientes com os criminosos presos até mesmo pelo tráfico de drogas”. “Diversas situações de abordagens policiais que resultaram na prisão de traficantes com grandes quantidades de drogas foram recentemente anuladas pelo Superior Tribunal de Justiça, sob o fundamento de que não havia, no caso concreto, fundada suspeita da prática de crime”, explicou.
Isso acaba impactando negativamente na atividade policial, tornando o contexto social mais propício à prática do crime, com o desestímulo à ação repressiva estatal.
O que a justiça e as polícias têm feito?
O Ministério da Justiça e Segurança Pública do atual governo confirmou à Gazeta do Povo que o órgão responsável pela articulação da política de drogas no país é a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad). Porém, a pasta destacou que a “fiscalização, apreensão de drogas e repressão, são atribuições das forças policiais no campo da segurança pública”.
Entre as ações da Senad, o ministério diz que compete à secretaria a aplicação da lei, incluindo a descapitalização das organizações criminosas do narcotráfico e qualificação da atuação repressiva com base em inteligência e estratégia; o apoio técnico às polícias e às perícias, especialmente no que diz respeito à descoberta de novas drogas; e a produção de pesquisas que embasem as políticas públicas sobre drogas.
A Gazeta do Povo entrou em contato com algumas polícias estaduais para saber o que tem sido feito para coibir eventos ilegais com uso indiscriminado da maconha.
A Polícia Militar do Distrito Federal disse que “atua 24h por dia, todos os dias da semana, de forma ininterrupta. Nosso policiais trabalham por escalas não ficando, portanto, nenhum período do dia sem policiamento. Rondas sistemáticas com o uso de viaturas são realizadas a fim de inibir o cometimento de crimes, o que inclui o uso e porte de substâncias entorpecentes”.
“Além do policiamento realizado por viaturas do batalhão responsável pela área de atuação, contamos com reforços periódicos de unidades especializadas da corporação. A PMDF também recebe continuamente diversas denúncias de eventos desse tipo, o que facilita o controle”, reforçou a instituição.
Segundo a PMDF, em 2021 foi retirado das ruas 1.859,46kg de maconha. Já em 2022, foram recolhidos 4.808,22kg da substância, um aumento de 61,32% no número de apreensões.
Em relação ao que precisa ser feito para evitar esses tipos de eventos, a polícia do DF informou que “o uso de drogas é uma problemática que vai além do policiamento sendo, sobretudo, uma questão de saúde pública e de políticas sociais na área de vulnerabilidade social”.
A Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que “trabalha visando coibir e prevenir crimes”. E ainda ressaltou a importância da população denunciar eventuais crimes, especialmente eventos com uso deliberado de maconha, para que procedimentos investigativos sejam iniciados. As denúncias podem ser feitas nas delegacias da Polícia Civil, pela Central 190 ou pelo aplicativo 190, disponível nas plataformas Android e IOS.
Um caso recente de atuação da polícia em um evento com uso indiscriminado da maconha ocorreu no dia 23 de fevereiro deste ano, em Governador Valadares (MG). Após uma denúncia anônima, de que pessoas estariam usando drogas, a P0lícia Militar foi até o local da festa e apreendeu 29 quilos de maconha. Uma mulher de 24 anos foi presa por tráfico de drogas.
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