O ex-investigador da Polícia Civil Ricardo Abilhôa, filho do procurador de justiça e ex-coordenador da Procuradoria de Investigações Criminais (PIC), Dartagnan Cadilhe Abilhôa, confessou que em 2004 prendeu e extorquiu dinheiro do traficante internacional Lucio Rueda Bustos, conhecido como "Mexicano - um ex-integrante do Cartel de Juarez, organização criminosa do México dedicada ao tráfico de entorpecentes e que foi comandada pelo conhecido traficante Amado Carrillo Fuentes.
Ricardo foi ouvido nesta sexta-feira por cerca de três horas na 2.ª Vara Criminal Federal de Curitiba. O ex-investigador confessou que ele e o ex-policial civil Carlos Eduardo Carneiro Garcia (Carlinhos), preso em 16 de agosto de 2006, em Curitiba, extorquiram U$S 350 mil do traficante - dinheiro que teria sido repartido igualmente entre os dois. Com a sua parte, Ricardo diz ter gastado em viagens e na compra de um apartamento de R$ 240 mil em Balneário Camboriú, em Santa Catarina. Entretanto, segundo a acusação do Ministério Público Federal (MPF) a extorsão foi bem maior: U$ 1 milhão.
Ricardo negou que a extorsão tenha acontecido dentro das dependências da Promotoria de Investigação Criminal (PIC), na época coordenado pelo pai de Ricardo - Dartagnan Cadilhe Abilhôa. De acordo com o depoimento, teria sido o Carlinhos que abordou a advogada do Mexicano exigindo U$S 1 milhão, mas a negociação teria fechado em U$S 350 mil.
Durante o depoimento, Ricardo procurou isentar o pai de qualquer envolvimento no caso. Como Dartagnan era coordenador da PIC, a suspeita é de que ele tenha repassado a informação da localização do traficante para Ricardo e Carlinhos efetuarem a prisão. A suspeita cresce uma vez que nem Ricardo muito menos Carlinhos, este afastado das funções policiais na época, estavam lotados na PIC.
Ricardo explicou que as informações sobre Mexicano vieram, por telefone, do delegado de Polícia Civil Vinícius Borges Martins, na época lotado no município de Cerro Azul. "Era um trabalho que valia a pena", teria dito Martins a ele, já sabendo do passado criminoso do traficante. Ricardo conta que só depois que chegou com Mexicano na PIC, percebeu que era uma armação do delegado.
A armação Martins nega, mas confirma que foi ele quem passou a informação da localização de Mexicano. "Como minha delegacia não tinha estrutura para investigar um caso desse, eu passei as informações para um delegado amigo meu da PF e para o Dartagnan", resume. No dia em que o traficante foi preso, conta Martins, foi ele quem disse onde o traficante estaria. "Fui eu quem avisou, mas não lembro se foi para o Ricardo ou para o Carlinhos", afirma. O delegado conta ainda que esteve na PIC, quando lá também estava Mexicano, mas que ficou por pouco tempo. "Eu vi ele (Mexicano) lá. Mas em seguida sai. Não sei se houve extorsão", resume.
O filho do procurador procurou também no depoimento isentar os dois irmãos, processados pelo MPF pelos crimes de lavagem de dinheiro. Segundo a denúncia do Ministério, como o patrimônio de Ricardo cresceu desproporcionalmente, ele resolveu passar alguns bens para o nome dos irmãos.
Pagamento
Ricardo disse ao juiz que o pagamento dos U$S 350 mil foi feito em três vezes e que nas três oportunidades ficou dentro do carro observando Carlinhos pegar o dinheiro com a advogada do traficante. O depoimento de Ricardo contrasta com a versão de Carlinhos. Perante o juiz, Carlinhos confirmou que participou da prisão do traficante, mas negou a extorsão. Carlinhos foi recentemente condenado a oito anos e 11 meses de prisão e ao pagamento de 510 salários-mínimos.
Segundo uma fonte do MPF, a acusação espera que a condenação de Ricardo seja maior que a de Carlinhos, já que o crime de lavagem de dinheiro será com base nos bens adquiridos com o dinheiro extorquido. Além de lavagem de dinheiro, Ricardo responde pelos crimes de corrupção e usurpação da função pública.
Ricardo permanece preso na custódia da PF, em Curitiba, mas deve ser transferido já na semana que vem. O processo contra ele está em fase final. Ouvido Ricardo, as partes - defesa e acusação - podem pedir diligências complementares, em seguida são as alegações finais e depois a sentença do juiz. O MPF acredita que até a primeira quinzena de maio, a sentença seja proferida.
O advogado de Carlinhos, Álvaro Borges Júnior, definiu o depoimento de Ricardo como "mentiroso e criminoso". Segundo ele, Carlinhos participou da prisão de Mexicano mas que em nenhum momento recebeu dinheiro do traficante. "A extorsão não existiu", rebate. "Só se foi só por parte do Ricardo, porque nenhum dinheiro passou pelas mãos do meu cliente", completa.