Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Mutirão carcerário

Filhos do presídio ganham, enfim, a liberdade

Maria Júlia * e a mãe deixam o presídio. A menina estava presa com a mãe desde os 3 dias de idade | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Maria Júlia * e a mãe deixam o presídio. A menina estava presa com a mãe desde os 3 dias de idade (Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo)

Maria Júlia* assoprou a vela de seu terceiro aniversário, com tudo a que tinha direito: bolo, salgadinhos, doces e amiguinhos presentes. Seria mais uma cena normal na vida de uma criança, não fosse por um detalhe: a festa foi realizada em uma creche que funciona dentro da Penitenciária Feminina do Paraná (PFP), em Piraquara. Para a mãe da aniversariante – que cumpria pena na unidade, por homicídio –, a comemoração era dupla. Horas antes, no 3.º Mutirão Carcerário, ela havia conquistado a progressão do regime para prisão domiciliar. Ainda ontem, mãe e filha seguiram para Santa Catarina, onde começarão vida nova.

"É um presente para mim e para ela", comemorou Fabiane*, de 22 anos, presa quando estava no terceiro mês de gestação. Deu à luz dentro do complexo penal. Assim como ela, outras duas mulheres que tiveram filho depois de estarem atrás das grades também deixaram o presídio e passaram a cumprir prisão domiciliar.

"Eu não vejo a hora de dormir do lado dela. Vou dar mais valor a cada coisinha", disse Águida*, de 26 anos, mãe de uma menina de olhos vivos, de dois anos e sete meses de idade. Entre os planos para um futuro breve, programas simples, como tomar sorvete e passear na praça.

Cobiçada pelas mães, a liberdade será uma novidade para as crianças. Elas nasceram e cresceram no ambiente prisional. O mais velho da creche, Daniel*, tem três anos e três meses e parece ter incorporado gírias típicas da cadeia. De quando em quando, solta expressões como "o bagulho tá loco". Peralta, não fica parado nem por um instante e se encanta com objetos que não fazem parte do ambiente, como os óculos de sol deste repórter e a câmera do fotógrafo.

"A gente tentava tornar aqui [a creche] o mais perto de um lar. Mas nunca é igual. Não tem liberdade", definiu a mãe do menino, Andressa*, de 35 anos. A perspectiva de mundo que as crianças têm acaba no alambrado da creche. Por causa disso, se apegam às mães mais que o normal e costumam estranhar tudo que é externo. "Se eles veem um cachorro ou um gato, já se assustam. Não faz parte do mundinho deles. Eles simplesmente não sabem nada da vida lá fora", avalia Fabiane.

Apenas quando completam dois anos é que as crianças passam a frequentar uma escolinha fora do presídio. São levados por agentes, em uma van da penitenciária. E é da cadeia para a escola, da escola para a cadeia. Das 35 crianças da creche, apenas três frequentavam o colégio externo. Os outros 33, que têm menos de dois anos de idade, nunca tiveram qualquer contato com o mundo externo.

"A maioria dos funcionários cria um vínculo afetivo com as crianças, mas é importante que elas saiam daqui. Presídio não é lugar para criança", disse a diretora da PFP, Rita de Cássia Costa.

*nomes fictícios

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.