"Como sabemos se uma coisa existe de verdade ou é faz de conta?", pergunta o professor. "O faz de conta é só uma brincadeira, um fingimento", responde um dos estudantes. "Uma história com dinossauros é faz de conta porque eles não existem mais", afirma outro. O debate faz parte de uma aula de Filosofia para crianças do 1.º ano do ensino fundamental do colégio particular Bagozzi, em Curitiba. Embora a disciplina normalmente seja compreendida como mais apropriada a adultos e estudantes de ensino médio, por sua complexidade, várias experiências comprovam que a criança de 5 ou 6 anos também é capaz de filosofar. No Bagozzi, as aulas são aplicadas a partir dessa faixa etária desde 1994. Mas o método usado é muito mais antigo: surgiu na década de 1960, nos Estados Unidos, e hoje está presente em cerca de 40 países.
A ideia não é fazer com que os alunos memorizem Aristóteles ou Rousseau. É levá-los a desenvolver a reflexão sobre uma série de conceitos, como verdade, liberdade e amizade. "A história da Filosofia não é o foco. O que importa é o método filosófico", explica Thaís Kuzma, que deu aulas de Filosofia durante 11 anos no Bagozzi e hoje é coordenadora pedagógica do ensino fundamental. Segundo ela, frases e pensamentos de filósofos são inseridos só a partir do 4.º ano, de forma pontual.
Atividades
O ponto de partida para as aulas pode ser uma história, um vídeo ou uma música que trate do tema a ser debatido. O professor instiga os alunos, lançando perguntas que ajudem a refletir e estimulando os estudantes a fazerem os seus próprios questionamentos. A finalização ocorre com a produção de textos ou desenhos que expressem o conceito construído pelo aluno. De acordo com a professora Raimunda Nonata Vaz, coordenadora do programa de filosofia para crianças da Escola Municipal Anchieta, de Campo Largo, o objetivo é formar um cidadão que pense antes de agir.
A escola oferece aulas de Filosofia a partir da pré-escola. A inclusão da disciplina foi possível graças ao esforço conjunto da direção e da Associação de Pais, Mestres e Funcionários do colégio, que assumiu os gastos com a formação dos professores. Os efeitos são sentidos por toda a comunidade escolar. "As crianças se tornam bem mais críticas e participativas", afirma Raimunda.
Segundo Darcísio Muraro, fundador do Instituto de Filosofia e Educação para o Pensar, o sentido dos conceitos pode ser simplesmente transmitido pelos pais e professores conforme suas crenças, numa espécie de doutrinação das crianças. Ou pode ser submetido a uma discussão, para que a criança reflita sobre as diferentes interpretações e tenha liberdade de escolha. É justamente esse o objetivo da filosofia.
Ela virou a "queridinha" dos alunos
"Então é você quem está deixando a minha filha perguntadeira?" A frase foi dirigida à professora Thaís Kuzma quando ela dava aulas de Filosofia. Segundo a professora, os pais comentavam que os filhos haviam se tornado mais questionadores e voltavam para casa com vontade de conversar sobre os assuntos discutidos em sala de aula.
Os efeitos também foram percebidos pelo professor de Filosofia Edson Lima, do Colégio Bagozzi. Ele conta que as crianças que passam pela disciplina desenvolvem o raciocínio, o respeito pelo confronto de ideias e a capacidade de verbalização do pensamento. "Elas se tornam mais autônomas e saem do estado de timidez", afirma.
Além de transformar as crianças, a Filosofia virou a "queridinha" dos alunos e, há algum tempo, disputa com a Educação Física o posto de aula mais esperada.
Vida e Cidadania | 3:38
Embora o ensino da disciplina seja mais comum para adultos e estudantes de ensino médio, experiências comprovam que crianças de 5 ou 6 anos também são capazes de filosofar.