Procedimento
Trabalho minucioso garante resgate histórico fiel
Restaurar uma imóvel não é uma simples reforma, em que se resgata um padrão físico. O restauro exige que se leve em consideração valores agregados, como aspectos históricos. E isso não quer dizer que tudo vai ficar como no original, mas sim do jeito em que aquela construção viveu seus anos mais importantes.
Para resgatar o que se passou na Villa Sophia, casarão do fim do século 19 que fica na Rua Mateus Leme, é preciso paciência. Com um bisturi em mãos, os restauradores Tatiana Zanelatto Domingues e Renato Barbizan vão descascando as paredes da casa para descobrir o que está escondido. "É a parede que diz o que vai acontecer", conta Tatiana, apontando para o alto, onde as vigas de madeira não resistiram e deixaram uma infiltração se formar. Naquele pedaço, não há o que recuperar.
No segundo andar da casa, foram descascadas seis camadas de tinta até chegar à primeira. As pinturas que surgiram serão documentadas, mas apenas as mais conservadas terão alguma parte exposta, que ganham o nome de janelas. "É com dor que abrimos e fechamos, mas você sabe que de alguma maneira aquilo está sendo preservado", analisa.
No térreo, papéis de parede dificilmente vão revelar qual foi a primeira pintura, porque retirá-los implica em chegar ao estuque. Com técnicas mais avançadas e caras como laser, talvez fosse possível ir mais fundo na história.
Há anos, tapumes escondem o que sobrou do prédio das Ferragens Hauer, na Rua José Bonifácio com a Padre Júlio de Campos, atrás da Catedral, no Centro de Curitiba. O edifício data de 1888 e resiste bravamente ao tempo: cem anos depois de sua inauguração, um incêndio destruiu todo o seu interior. Quem nunca reparou na construção ainda neste ano poderá ver sua fachada por inteiro. É que a restauração do edifício está quase finalizada.
SLIDESHOW: Veja fotos dos casarões em restauro
O prédio é mais uma das Unidades de Interesse de Preservação (UIP) da capital que está sendo restaurada de 2008 para cá, 25 UIPs receberam alvará permitindo esse tipo de intervenção. No caso do prédio das Ferragens Hauer, o restauro está por conta da dupla de arquitetos Ivilyn Weigert e Leandro Nicoletti Gilioli, da Arte Maggiore.
A preocupação deles é de não fazer um falso testemunho da história. A fachada foi refeita minuciosamente, já que foi bastante danificada pelo fogo na década de 1990. Os detalhes artísticos voltaram e agora a cor original, um tom de vermelho, já está definida.
A dupla também é responsável pela restauração da Villa Sophia, na Rua Mateus Leme, atrás do Shopping Mueller. Casa de família construída no fim do século 19, ela foi comprada pela Cúria e tornou-se casa do bispo por anos.
Créditos
As duas construções foram arrematadas em um leilão pelo mesmo homem. Há anos, quem é dono de uma UIP e decide restaurá-la ganha créditos de potencial construtivo, que normalmente são trocados pelo restauro. Esse viés econômico, no entanto, não é o que importa na opinião de Gilioli. Para o arquiteto, esses restauros estão muito relacionados com sustentabilidade. "É deixar que gerações futuras usufruam desses espaços e conheçam a história da cidade", reflete.
Apesar de muito questionado, por algum tempo esse incentivo atraiu construtoras interessadas nesses títulos e que acabavam preservando parte da história da cidade. De um tempo para cá, os casarões deixaram de despertar esse interesse.
"O potencial construtivo, além de ser um instituto contrário à organização da cidade, com a Arena virou um absurdo, não existe mais", critica o professor de Direito Socioambiental da PUCPR Carlos Marés. Na avaliação de Marés, esse instrumento interessa apenas ao especulador, porque só conserva o que tem algum valor econômico, pouco visto em prédios históricos.
Depois de restaurados, tanto o prédio da antiga Ferragens Hauer quanto a Villa Sophia serão colocados para locação.
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