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Operação Tarrafa

Fraudes teriam lesado a Petrobras

Esquema que prejudicou pescadores pode chegar à estatal | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
Esquema que prejudicou pescadores pode chegar à estatal (Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo)

A central de fraudes montada no Fórum de Paranaguá para desviar indenizações pagas pela Petrobras a pescadores atingidos por acidentes ambientais também teria lesado a estatal. O Ministério Público vai investigar o advogado defensor da Petrobras por suposto envolvimento com os líderes do esquema, presos há 19 dias. Em depoimento à 1.ª Promotoria de Justiça de Paranaguá, parte dos réus declarou que o advogado da estatal teria recebido dinheiro das fraudes. A Gazeta do Povo teve acesso a uma série de e-mails trocados entre ele e um dos líderes do grupo.

No relatório final da Ope­ração Tarrafa (que desbaratou o núcleo de corrupção e mantém três pessoas na prisão), o Ministério Público pede à Justiça que se extraia cópia dos autos "para apurar eventuais condutas delituosas remanescentes e a contribuição de outras pessoas nos crimes praticados".

A 1.º Promotoria de Paranaguá confirma que entre essas pessoas está o advogado Ananias Cézar Teixeira, que defende a Petrobras em ações movidas por pescadores contra a empresa no Paraná.

Um dos réus que apontou a participação de Ananias no esquema é o serventuário Arival Tramontin Ferreira Júnior. Segundo ele, havia um acordo prévio entre o núcleo das fraudes e o escritório que defendia a Petrobras para que os advogados dos pescadores ajuizassem ações em excesso. Isso gerava custas processuais e honorários advocatícios pagos pela Petrobras que posteriormente eram divididos pelo grupo.

Benefício duplo

Dessa forma, há indícios de que Ananias receberia duas vezes: sua parte nos honorários da Petrobras e uma porcentual do que o grupo arrecadava com as ações contra a estatal. "O Hélio [Silvano Biaggi, ex-escrivão da 2.ª Vara Cível de Paranaguá] fazia depósito ao Ananias na conta dele no Banco Safra. Ele chegou a mostrar os comprovantes", disse Arival Junior em entrevista à Gazeta do Povo, em maio, três meses antes de ter a prisão preventiva decretada pela Justiça a pedido do MP. Ele está foragido.

Os pagamentos das custas eram feitos pela Petrobras por meio de cheques nominais aos escrivães das varas cíveis. Segundo Arival Junior, os pagamentos ocorreram entre julho e dezembro de 2004 e entre agosto de 2005 e fevereiro de 2006.

Ele afirma que nessas ocasiões o advogado da Petrobras acompanhava o grupo até a agência do Banco do Brasil no bairro Água Verde, em Curitiba, onde os cheques eram sacados e o dinheiro seria repartido.

"O Ananias descia [a Para­naguá], distribuía as ações. Quando ele distribuía, ele já dava o cheque. Aí, eles [advogados, escrivães e Ananias] subiam no Banco do Brasil e lá dentro faziam a partilha", detalhou. Em depoimento ao MP (ao qual a Gazeta do Povo teve acesso), a advogada Cristiane Uliana também disse que Ananias recebia dinheiro por participar do esquema e que o excesso de ações ajuizado para gerar custas era feito "com a anuência do advogado da Petrobras".

Em resposta à reportagem, a estatal emitiu a seguinte nota: "A Petrobras informa que, antes da data de hoje [quinta-feira], não tinha conhecimento, nem suspeitava, de suposto envolvimento de escritório contratado em atos relacionados à denominada Operação Tarrafa. A Companhia reafirma o compromisso com a ética e a transparência que rege suas relações com seus públicos de interesse e ressalta que irá obter esclarecimentos formais acerca das denúncias, a fim de avaliar as medidas jurídicas a serem adotadas."

Advogado trocava e-mails com líder do esquema

Além do depoimento de dois acusados de desviar indenizações de pescadores, documentos obtidos pelo Ministério Público reforçam os indícios de que o advogado Ananias Teixeira teria contribuído para lesar também a Petrobras, que o contratou para defendê-la nessas ações. Entre as evidências estão 33 e-mails trocados entre Ananias e Arival Junior, entre 29 de fevereiro e 10 de setembro de 2008.

Mais do que denotarem pro­ximidade entre os dois, os e-mails mostram que o advo­gado da Petrobras chega a revisar cálculos feitos por Arival Junior numa ação mo­vida contra a estatal, orientando-o sobre como fazer as contas. "Seguinte... suas execuções novas estão com excesso em razão da capitalização dos juros... Você mudou a formula dos calculos... (...) Gera uma diferença de R$ 4.000 de excesso... Não me dê trabalho homem... rs" (sic), diz parte da mensagem.

Em uma mensagem anterior, Arival Junior fala com o advogado da Petrobras em tom de camaradagem. "Estive meio afastado. Problemas com a fa­mília. Mas a vida vai indo. Por favor, conte alguma notícia boa, para nós é claro. Al­guma movimentação?" (sic). A Promotoria confirmou que a troca de e-mails entre Ju­nior e Ananias será usada na investigação.

Para o advogado criminalista Carlo Frederico Müller, a comunicação direta entre Ananias e Arival Junior é irregular do ponto de vista ético e criminal. Se for "comprovado que o advogado está dando instrumentos à parte contrária, para que esta possa processar a empresa que ele defende, isso é falta disciplinar grave e crime de patrocínio infiel", disse.

Previsto no Código Penal, o crime de patrocínio infiel tem pena prevista de seis meses a três anos de detenção e multa. As eventuais faltas disciplinares costumam ser apuradas administrativamente pelo Conselho de Ética da OAB.

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