O Uber estreou em Curitiba em março deste ano, quando um projeto de lei que tinha a intenção de proibir o aplicativo e seus similares na capital paranaense ainda tramitava na Câmara Municipal. A busca por motoristas parceiros tinha começado dois meses antes. Em um cenário de crise econômica e desemprego em alta, a multinacional parecia uma boa alternativa de renda. Passados onze meses, o aplicativo funciona a todo o vapor na cidade, sem que tenha uma regulamentação adequada para isso. Relembre os fatos que marcaram a atuação do Uber em Curitiba e no Brasil em 2016:
Abril de 2016 - Câmara tenta proibir Uber
Um mês depois do aplicativo estrear em Curitiba, a Câmara Municipal alterou a Lei municipal 13.957/2012, a chamada Lei do Táxi. A mudança reforçou sanções ao Uber e aplicativos similares. Foi instituída uma multa de R$ 1,7 mil para quem faz o transporte individual de passageiros sem autorização (portanto sem ser um táxi), o que diminuiu as chances de regulamentação do serviço. À época, o Uber já atuava em outras nove cidades brasileiras e três delas tentavam discutir uma regulamentação: São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte.
Maio de 2016 - Uber é regulamentado em São Paulo
Em maio, a cidade de São Paulo é a primeira do país a regulamentar o serviço de transporte individual por aplicativos. Esperava-se que o exemplo influenciasse outras cidades brasileiras, que onde a polêmica entre proibir e regulamentar corria solta. A solução do prefeito Fernando Haddad (PT) foi emitir um decreto e exigir dos aplicativos a compra de crédito para operar. Foi uma forma de criar uma arrecadação para o município sem empacar na discussão sobre uma reforma tributária. É também uma forma de controlar a frota: ao decidir como vende os créditos, o municípios pode impedir que uma empresa assuma o monopólio do serviço, por exemplo. O decreto ainda deixou os aplicativos livres para atuar tanto com táxistas quanto com motoristas autônomos. A medida abriu a porta para concorrentes do Uber entrarem no mercado paulistano.
“Ao contrário de outras cidades, o sistema de táxi de Curitiba é muito bem avaliado pelo usuário e o custo-benefício daqui é, incomparavelmente, o melhor do Brasil (...) esse tema [de regulamentação do Uber] não é prioritário nem pauta número um da cidade”
Junho de 2016 - Fruet não proíbe nem apoia Uber
Em Curitiba, a mudança na Lei do Táxi termina de tramitar com uma versão bem mais branda. O parágrafo que deixava explícita a proibição a aplicativos como o Uber foi vetado pelo prefeito Gustavo Fruet (PDT). Os vereadores mantiveram desta forma. A aprovação de um texto mais flexível foi vista como uma sinalização do executivo de que a regulamentação estaria à caminho. A multa de R$ 1,7 mil, principal mudança do projeto, até agora não foi implementada, na prática, pois carece de regulamentação.
Mas o veto não refletia inteiramente a postura de Fruet quanto ao aplicativo. Ainda em junho, em clima de corrida e eleitoral, o prefeito declarou que a regulação do Uber não era uma prioridade para a cidade. Para ele, a administração municipal e a Câmara de Vereadores estavam comprando uma pauta que não era da cidade, embora fosse algo de interesse econômico, principalmente em um momento de crise financeira.
Final de Junho de 2016 - Conflitos e tensão nas ruas de Curitiba
Desde que o Uber começou a operar em Curitiba, em março, denúncias de conflitos e agressões entre motoristas do aplicativo e taxistas vieram à tona. Em um final de semana no final de junho, o confronto chegou a extremos violentos. A confusão começou na região do Aeroporto Afonso Pena, em São José dos Pinhais, e se estendeu para Curitiba, com focos de tensão no entorno da Rodoviária e em pontos no Centro e na região do Batel. Em nota, a prefeitura de Curitiba afirmou que os motoristas do Uber atuam irregularmente na cidade, pois a atividade não foi regulamentada.
Julho de 2016 - Moro apoia os taxistas?
Em mais um dos protestos contrários à regulamentação do Uber em Curitiba, taxistas de Curitiba e pelo menos outras cinco capitais protocolaram um suposto dossiê contra o aplicativo na 13.ª Vara Federal do Paraná, onde trabalha o juiz Sergio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato. O documento, que teria 300 páginas e teria sido produzido por advogados e assessores de empresas de táxi do país e organizado pelo vereador de São Paulo Adilson Amadeo (PTB), estaria recheado de denúncias de crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas contra a multinacional de mobilidade. A reportagem não teve acesso ao dossiê. À época, o advogado Marcelo Araújo, que se dizia porta-voz dos taxistas em Curitiba, disse que a categoria sabia que o ato na Justiça Federal é mais do que tudo simbólico.
Setembro/Outubro de 2016 - Concorrência ao Uber cresce
Pouco mais de um ano após a entrada do Uber no Brasil, o número de motoristas parceiros no país cresceu dez vezes, atingindo 50 mil parceiros. Em Curitiba, segundo informações passadas à Gazeta do Povo no mês de junho seriam cerca 1,6 mil motoristas parceiros do app nas ruas. O crescimento teria sido favorecido pela regulamentação dos aplicativos de transporte em São Paulo ainda em maio de 2016, mas também passou a ser ameaçado pelo avanço da concorrência. Empresas nacionais, que passaram a atuar também com os taxistas como motoristas parceiros, estariam “roubando” parte dos motoristas do Uber. A grande razão para isso é que muitos dos que optaram por trabalhar com o Uber viram no app uma opção de trabalho fixo, alugando veículos apenas para essa finalidade e vendo, no dia a dia, seu retorno financeiro ficar bem abaixo do esperado.
Novembro de 2016 - Momento decisivo na Europa
Uma disputa que chegou ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) em novembro de 2016 pode definir o futuro do Uber no continente. A questão é: o Uber é só um serviço digital que conecta motoristas e passageiros? Ou é, na realidade, um serviço de táxi sem licença? A discussão é europeia, mas pode ter impactos ao redor do mundo, já que a discussão sobre o caráter do Uber tem contornos internacionais.
Ainda no fim do mês de novembro, em Luxemburgo, o tribunal ouviu os argumentos dos advogados representantes do Uber e da Asociación Profesional Élite Taxi, principal cooperativa de táxi de Barcelona, que originou a ação, em 2014. A expectativa é de que o painel do Tribunal de Justiça, composto por 15 juízes, chegue a um veredito até abril. A decisão, porém, poderá ter um alcance que irá além dos limites da UE, podendo servir de exemplo para a necessidade de se regulamentar serviços com o do Uber em todo o mundo, inclusive nas cidades brasileiras.
Dezembro de 2016 - Regulamentação do app fica para 2017
O ano acabou, a regulamentação do Uber em Curitiba não veio. Os vereadores engavetaram o projeto, em parte porque a legislatura chegou ao fim, mas também porque optaram por esperar alguma solução nacional. A regulamentação do aplicativo na Câmara dos Deputados, por sua vez, também ficou para 2017. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), não quis colocar em votação a urgência do PL 5587/2016, que nem liberava, nem proibia o Uber no Brasil. Na prática, o PL impunham regras que acabam por igualar o Uber e táxis, o que não agradaria nem os taxistas nem a multinacional.
No caso de Curitiba, o projeto de regulamentação também empacou. Assinado por 17 vereadores, o texto foi protocolado ainda em maio de 2016. No mês seguinte foi enviado para a Urbs, e lá ficou à espera de um parecer técnico que nunca chegou. Em dezembro, o vereador Serginho do Posto (PSDB) sugeriu a retirada do projeto e defendeu que o município só voltasse a legislar quando houver uma normativa nacional sobre o tema. Mas a nova legislatura, que assume em janeiro, tem liberdade para bancar a discussão a nível municipal. As chances do aplicativo devem ser melhores do que entre os atuais vereadores. Levantamento da Gazeta do Povo indica que, dos 15 vereadores novatos, pelo menos 12 são favoráveis a regular os aplicativos de transporte.
Enquanto a lei não avança, chegou a Curitiba o serviço de luxo UberBlack. No dia de estreia, em um teste da reportagem da Gazeta do Povo, a modalidade funcionou melhor que a versão luxo dos táxis, em termos de preço e tempo de chegada. Também em dezembro chegou a Curitiba o primeiro concorrente do aplicativo norte-americano. O brasileiro T81 começou a operar na cidade. A reportagem da Gazeta do Povo tentou testar o serviço, mas não obteve sucesso.
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