Diferenças partidárias à parte, governos estaduais e municipais de regiões metropolitanas terão de planejar e gerir juntos seus sistemas de transporte coletivo a partir de janeiro de 2018. Essa é uma das premissas do Estatuto das Metrópoles, projeto discutido por mais de uma década que virou lei no ano passado. Ele propõe uma articulação incomum na atual conjuntura. Hoje, a realidade brasileira é de sistemas desconectados e caros.
A região metropolitana de São Paulo constitui o maior aglomerado urbano do país. São 39 municípios onde vivem 21 milhões de pessoas. Pelo tamanho, deverá ser ali o maior desafio de integração do Brasil. Hoje, cada município tem um sistema urbano próprio e as linhas intermunicipais são gerenciadas pela Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo. Os ônibus da EMTU até são integrados ao Metrô e aos trens da CPTM, mas eles não conversam, por exemplo, com a maior rede da metrópole, a da capital. Pelas regras do estatuto, todos esses sistemas devem passar a ser integrados.
“Com o estatuto, surge uma nova governança para regiões metropolitanas. Estados e municípios deverão se apoiar para buscar soluções articuladas e integradas”, defendeu Diana Meirelles da Motta, diretora de Gestão de Projetos da Empresa Paulista de Desenvolvimento Metropolitano. A Emplasa, órgão ligado ao governo de São Paulo, afirmou que já está desenvolvendo com todos os municípios um Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado para atender ao estatuto.
Curitiba vive incerteza em relação à integração
Leia a matéria completaExemplo de integração, até mesmo Curitiba nunca atendeu integralmente ao plano. Alguns municípios, como Pinhais e Curitiba, até contam com linhas urbanas dentro da Rede Integrada de Transportes. Mas outros, como São José dos Pinhais e Araucária, têm sistemas urbanos que não se integram a essa rede.
Como ninguém ainda possui esse sistema, iniciativas de diálogo já são apontadas como vanguardistas no atendimento ao estatuto. A professora do departamento de Geografia da UFPR, Olga Freitas Firkowski, cita o exemplo de Belo Horizonte. Em 2010, antes mesmo da promulgação da lei, a Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana local havia publicado seu plano de desenvolvimento integrado para servir como referência aos 34 municípios que compõem o aglomerado.
“Lá [em Belo Horizonte] eles desencadearam um processo de planejamento por meio de um consórcio com um fundo para arcar com as despesas do plano metropolitano. Isso significa que todos os planos diretores estão submetidos a um novo olhar, que é o metropolitano. Há outra iniciativas no país, mas que ainda não são o ideal. Belo Horizonte tem o mérito de conseguir sensibilizar os municípios para a discussão metropolitana.”
Obrigação
O Estatuto das Metrópoles prevê responsabilizar por improbidade administrativa o gestor que não adotar medidas para criação da gestão interfederativa e não realizar planos de desenvolvimento integrados no prazo de até três anos. Há, porém, quem já aponte que esse prazo deverá ser alongado por uma emenda à lei.
Além do curto prazo, especialistas apontam também outro problema no estatuto: ele avança ao buscar uma definição de metrópole com base em um conceito definido pelo IBGE, mas não criou mecanismos para rever o quadro de proliferação de metrópoles país afora. Hoje, são mais de 80 metrópoles com mais de 1,4 mil municípios. Mas há distorções. Na Paraíba, segundo o Observatório das Metrópoles, 67% dos municípios estão inseridos em alguma metrópole. Em Santa Catarina, 100% deles. Pelo conceito de continuidade territorial e relevância econômica e social, em 2008, o IBGE apontou que existiam 12 metrópoles no país. Ao longo dos anos, porém, a definição do que é metrópole se transformou mais em um jogo de interesses políticos do que em critérios técnicos.
Exemplo de integração, a capital paranaense nunca atendeu integralmente ao plano. Alguns municípios, como Pinhais e Curitiba, até contam com linhas urbanas dentro da Rede Integrada de Transportes. Mas outros, como São José dos Pinhais e Araucária, têm sistemas urbanos que não se integram a essa rede
Falta de controle no sistema da Grã-Bretanha gerou queda de passageiros
- Raphael Marchiori
Em 1985, a Grã-Bretanha desregulamentou seu transporte apostando que a livre concorrência traria melhor oferta a custos mais baixos. A regra valia para todo o território, com exceção de Londres, onde o serviço já era bem avaliado. Entretanto, um relatório publicado em 2014 colocou em xeque o sucesso da medida.
O documento do Institute for Public Policy Research foi republicado pelo jornal The Guardian. De acordo com o periódico, as tarifas subiram mais do que a inflação nesse período e a quantidade de passageiros caiu.
Na Inglaterra, fora de Londres, a alta tarifária acumulada entre 1995 e 2013 foi de 35%. Já a quantidade de passageiros transportados caiu 32,5% enquanto a capital teve acréscimo de 99%. Além disso, o relatório aponta que a desregulamentação não resultou em um mercado mais competitivo: apenas 37% dos serviços semanais fora da capital teriam concorrência.
A publicação conclui pedindo que as autoridades locais criem agências de regulamentação inspiradas no modelo de Londres e que o transporte das cidades volte a estar no controle de um órgão público.
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