Para fugir dos aluguéis caros, das dificuldades dos bairros periféricos e da solidão de morar sozinho, jovens do mundo todo tem apelado para uma tática conhecida: dividir a casa com estranhos. O chamado “coliving” é como um coworking, só que para morar (e não para trabalho). Há quem diga que não passa de uma república “gourmetizada”. A comparação faz sentido, mas não é só isso. Tem algo de antigo: a busca humana por viver em comunidade. Mas tem também um quê de contemporâneo, de adaptar este modelo às grandes cidades que se espalham pelo mundo.
Em algumas das cidades mais badaladas do mundo, a ideia virou um negócio. O WeLive, em Nova York, oferece 200 unidades. É uma mescla de residência estudantil e hotel. O morador tem direito a um quarto e banheiro privativo. Cozinha, espaço de leitura e trabalho são comunitários. Além do aluguel, que parte de US$ 1.375 (R$ 4,3 mil), os moradores pagam uma “taxa de amenidades” mensal, de US$ 125 (R$ 395), que inclui itens como internet, tevê a cabo e roupas de cama.
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Não é exatamente a opção mais barata de se viver. Fundador da Common, também em Nova York, Brad Hargreaves estima que o coliving é 25% mais barato que um apartamento tipo studio. Mas 25% mais caro que alugar um quarto do modo tradicional, pelo site Craigslist. A explicação é de que esta geração de jovens adultos não busca só moradia, mas uma “experiência”.
Experiência que se traduz na possibilidade de viver em comunidade (algo que cada vez mais raro nos grandes centros urbanos). Não por acaso, o WeLive surgiu de um coworking (WeWork), espaços de escritórios compartilhados, que costumam incentivar a troca de ideias e projetos entre seus membros.
Mas nem tudo é experiência. “Eu não estou de olho em mudar a forma como as pessoas moram. Estou tentando resolver um problema de moradia”, Hardgreaves declarou, à revista Wired . Além de otimizar espaço, ao abrigar um número maior de pessoas, o coliving pode jogar de volta para o mercado terrenos e edifícios que hoje estão fechados, sem cumprir função alguma.
Uma crítica ao coliving
Por outro lado, a proliferação de colivings “de luxo” pode significar empreendimentos tão caros quanto os atuais, mas com áreas privativas cada vez menores. É uma das críticas que faz a arquiteta Lilian Lubochinski, principal autoridade brasileira no estudo do Cohousing, modalidade de moradia coletiva que surgiu na Dinamarca, na década de 1960.
Lubochinski morou em um kibutz, em Israel, em 1967, sua primeira experiência em morar em um espaço compartilhado. “Este período em que a gente vive isolado, fragmentado, é inédito” na história da humanidade, “a gente sempre viveu em comunidades, tribais ou não”, diz ela. E aponta o problema destes espaços de coliving criados por empresas: “não oferece o bem maior que as pessoas estão procurando, que é a cura da solidão”.
Nem todo coliving exige todo este aparato “hipster”. Na Europa e nos Estados Unidos, proliferam-se casas compartilhadas entre jovens adultos. “Quando cheguei na Inglaterra vi que todo mundo lá vive assim, tirando aqueles núcleos familiares estilo dois adultos de mais de 35 anos com duas crianças”, conta o psicólogo Frederico Medeiros. Quando voltou para o Brasil, há nove anos, ele manteve o estilo de moradia compartilhada, adotada na Europa.
“No começo foi pela questão financeira. Mas isso hoje não é determinante”, conta Frederico. Hoje, aos 35 anos, ele não pretende parar. “Eu gosto de dividir a casa, ter rotatividade em casa, almoçar com amigos. Se morasse sozinho me sentiria meio solitário”.
Mas conforme os anos passaram, Frederico mudou sua forma de compartilhar. Ele estabelece regras para evitar que a casa vire uma espécie de república estudantil. O principal critério é que todos os moradores saibam respeitar tanto os espaços privados (quarto) quanto os coletivos.
“Cidade dos velhinhos”: morar junto para viver bem na velhice
A cidade de Cuenca, na Espanha, abriga uma república diferente. Lá moram 90 pessoas, mas nenhum estudante. Com idade média de 70 anos, os habitantes da Convivir são pessoas idosas em busca de uma vida comunitária.
No mundo todo, a habitação coletiva surge como uma opção desejável para pessoas idosas. Os habitantes são associados, que dispõe de serviços para a terceira idade, como profissionais da área de saúde. Mas os espaços não são todos coletivos, como em asilos e abrigos. Cada pessoa têm seu espaço privado, seja um quarto, apartamento, e muitas vezes sua própria casa.
O jornal El País estima oito residências deste estilo, só na Espanha. O custo da associação varia entre 50 e 140 mil euros (de R$ 170 mil a R$ 477 mil). Em geral, são iniciativas recentes. Mas a ideia da casa compartilhada, chamada cohousing, surgiu ainda na década de 1960, na Dinamarca.
“O que aconteceu na Dinamarca é que as pessoas envelheceram juntas em comunidade”, e aí surgiu a ideia do cohousing, conta a professora Edilmere Sprada, da Associação Brasileira de Apoio e Atenção à Pessoa Idosa (Abraapi).
Uma das inspirações do grupo é o Lar dos Velhinhos de Piracicaba. É uma vila fechada, com uma área coletiva no meio. Em volta ficam chalés. São moradas individuais, que funcionam como uma casa dentro de um condomínio. O morador tem suas coisas, e entra e sai a hora que quer. Quando o chalé fica vago, o imóvel fica para o Lar, e não para a família.
Em outro extremo da praça ficam apartamentos para idosos que são muito dependentes. Há uma ala só para portadores de Alzheimer. “Eu gostaria de envelhecer assim. Ter uma vida em comunidade, sustentável, uma área verde”, comenta Edilmere. Desde 2014 a Abraapi estuda a compra de um terreno na região de Curitiba, para estabelecer uma comunidade nestes moldes.”
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