Em duas décadas, o setor de transportes quase triplicou a emissão de gases do efeito estufa no Brasil. Passou de 84,9 para 220,5 milhões de toneladas, entre 1994 e 2014. No mesmo período, o número de passageiros transportados por ônibus caiu em média 20%, enquanto o número de carros e motocicletas cresceu. Os dados constam em relatório lançado pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), na última sexta-feira (30), e que trata das emissões nos setores de energia e processos industriais.
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O resultado acende um alerta para o Brasil, um dos dez países que mais emitem gases do efeito estufa, prejudiciais à camada de ozônio. O relatório leva em conta dados do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg), que reúne informações disponibilizadas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTI) e de outros órgãos públicos e da sociedade civil.
O modal rodoviário foi responsável por quase 90% das emissões de gás carbônico no transporte de passageiros, em 2014. Metrô, trem e barcos fecham os outros 10%. Da emissão rodoviária, a maioria (77%) é de veículos individuais, automóveis e motocicletas. O transporte coletivo representou os outros 23%.
Em outras palavras, o carro é um vilão ambiental, que polui muito e transporta poucas pessoas. Nos últimos 20 anos, dois fenômenos agravaram a situação. “A intensidade do uso dos modais [de transporte] tem aumentado, [e] existe uma queda no [numero de passageiros] no transporte coletivo nas grandes cidades”, explica Marcelo Cremer, um dos pesquisadores do Iema responsáveis pelo relatório.
Entre 1994 e 2014, o número de passageiros transportados por ônibus caiu quase 20% nas grandes cidades. O número é uma média dos dados coletados pela Associação Nacional das Empresas de Transportes (NTU) em Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.
Menos gente no transporte público e mais gente dentro do carro e andando de moto. É o que explica um crescimento de 159,7% na emissão de gases no período, enquanto o crescimento populacional foi de apenas 33,9%, segundo estimativa do IBGE.
“A manutenção desta tendência deverá levar ao agravamento das más condições de mobilidade já presentes nas grandes cidades brasileiras – elevados tempos de deslocamento, violência no trânsito, baixa qualidade e alto custo de acesso ao transporte público. Além de contribuir, é claro, para o aumento das emissões de gases de efeito estufa e de poluentes tóxicos”, alerta o relatório.
Segundo maior setor
Pela estimativa do Seeg, o setor de energia, que comporta o transportes de cargas e de passageiros, foi o que apresentou maior taxa de crescimento na emissão de gases do efeito estufa, entre 1990 e 2014. Passaram de 189,7 milhões de toneladas para 479,1 mi de toneladas, superando o setor agropecuária, ficando atrás apenas da mudança de uso da terra (que inclui emissões por desmatamento). Dentro do segmento de energia, os transportes representam a maior fatia (46%), à frente da indústria (22%) e da eletricidade (17%).”
Alternativas
Se a previsão é alarmante, por outro lado, há soluções relativamente simples que podem reverter esse quadro. Uma delas é maior investimento no transporte coletivo, que o torne mais atrativo a ponto de “roubar” usuários que hoje trafegam de carro.
Outra é a opção por matrizes energéticas mais limpas. Testes com veículos elétricos e movidos a energia solar, como ocorre em Curitiba e Florianópolis, são bem-vindos a médio e longo prazo. Mas uma solução “caseira” pode trazer resultados imediatos na redução das emissões brasileiras: o etanol.
O combustível teria segurado um boom nas emissões de gases entre 2012 e 2014, segundo o relatório do Iema. Enquanto a quilometragem percorrida cresceu 15%, as emissões aumentaram em apenas 4,5%. O período coincidiu com uma recuperação na venda do combustível, que havia perdido espaço para a gasolina desde 2009.
“As pessoas não estão usando o etanol como deveriam. Se incentivasse um pouquinho que fosse, tivesse nos táxis, na frota pública, teria um efeito imediato nas emissões”, avalia o engenheiro florestal Carlos Sanquetta. Professor da UFPR, ele coordenou o 1.º inventário de gases do efeito estufa realizado em Curitiba, em 2011. Ele lembra que, na cidade, o setor de transportes é responsável pela maior parte das emissões de gás carbônico.
Cargas
Além da mobilidade, pesa na emissão de gás carbônico o transporte de cargas. No Brasil, o modal rodoviário representa 58% do setor, contra 32% nos Estados Unidos e 8% na Rússia. Neste setor, o gargalo é ainda maior, pois exige investimentos em infraestrutura de grande porte para que haja uma transição para outros modais.
A matriz energético é outro problema. Sozinha, a queima de óleo diesel para caminhões de carga emite mais gás carbônico (88,6 milhões de toneladas) do que toda a queima de combustível em toda a cadeira industrial brasileira (76 mi de toneladas). Ganha até das emissões do conjunto de termoelétricas brasileiras (82 milhões de toneladas). Um agravante é que a tecnologia não permite migrar caminhões para o etanol, como pode ser feito com os carros particulares. Uma opção de mais curto prazo seria investir em motores híbridos, como já é feito com os ônibus.
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