Mais uma vez cientistas comprovam a tese de que viver perto da natureza faz bem para a saúde — e pode até salvar vidas. Estudo divulgado na segunda-feira (31) pela organização conservacionista The Nature Conservancy (TNC) sugere que plantar árvores em ambientes urbanos pode resultar em temperaturas mais baixas e na redução da poluição do ar para milhões de habitantes urbanos. O resultado foi divulgado no encontro anual da Associação Americana de Saúde Pública (American Public Health Association), encerrado na última quarta-feira (2), mas ainda não foi publicado em uma revista científica.
Os pesquisadores estimam com um investimento global de US$ 3,2 bilhões (cerca de R$ 10 bi) nas 245 maiores cidades do mundo — cerca de US$ 4 por habitante — poderia reduzir entre 2,7% e 8,7% o número de mortes relacionadas à poluição. Significa 36 mil vidas salvas todos os anos. Além de impedir o aumento da temperatura nos dias mais quentes do ano, economizar 48 bilhões de quilowatts-hora (kWh) e evitar a emissão de 13 milhões de toneladas de dióxido de carbono no ar, todos os anos.
Estudo projeta quantos anos de vida a população ganharia com um bom planejamento urbano
Leia mais sobre os dilemas do planejamento urbano em Futuro das Cidades
“Normalmentes as cidades veem as árvores apenas como um ornamento estético”, diz um dos autores, Rob McDonald, cientista principal do programa Global Cities da TNC. “Mas nós queremos mostrar que há uma série de outros benefícios. As cidades deveriam estar pensando em suas políticas de saúde pública de forma conectada e integrada com seu planejamento urbano”.
Estudos anteriores já mostraram que árvores são capazes tanto de resfriar como de limpar o ar em ambientes urbanos. Elas fornecem sombra e utilizam parte da energia solar em seus próprios processos biológicos, reduzindo a temperatura do ambiente. Também removem do ar parte do material particulado, que é prejudicial à saúde.
São benefícios importantes. Tanto para a saúde humana como em termos econômicos. Há indícios, por exemplo, de que a exposição ao material particulado no ar é responsável por três milhões de mortes prematuras todos os anos, ao redor do globo. Já o calor excessivo pode causar insolação e até a morte, além de reduzir a produtividade e produzir picos na rede elétrica, pelo uso de ar-condicionado.
O trabalho da The Nature Conservancy foi realizado em 245 cidades ao redor do mundo, onde moram cerca de 910 milhões de pessoas, e levou em conta estudos anteriores que mediram o impacto das áreas verdes na poluição do ar e na temperatura do ambiente. O artigo sugere que as árvores atuais já reduzem a poluição do ar em, pelo menos, um micrograma de matéria de partículas finas por metro cúbico para cerca de 52 milhões de pessoas em todo o mundo. E mais de 68 milhões são beneficiados por uma redução de temperatura de 3,6º C, no verão, graças às árvores.
Plantar novas árvores vai apenas aumentar estes benefícios, segundo o artigo. Os autores analisaram uma série de cenários, de baixos a altos investimentos na plantação de árvores, no futuro. O plano mais ousado, estimado em US$ 3,2 bilhões, mostra uma redução significativa no gasto com energia e na emissão de gases do efeito estufa. Além de dezenas de milhares de vidas salvas todos os anos, graças às temperaturas mais baixos e ao ar mais limpo.
Os pesquisadores também notaram que cidades com altos níveis de poluição e calor e com maior densidade populacional tendem a ser as maiores beneficiadas com novas árvores. Karachi, no Paquistão, é onde o plantio de árvores teria maior impacto na redução da poluição; enquanto Dhaka, em Blangladesh, teria maior potencial na redução de temperatura.
Para além da temperatura e poluição
A opção por focar na temperatura e na poluição do ar parece “razoável”, avalia o estudioso de florestas Geoffrey Donovan, do Serviço Florestal dos Estados Unidos. Mas ele ressalta que há uma série de outras relações entre saúde e natureza que não foram incluídos no relatório. Entre eles, de que a exposição à natureza diminui o stress, estimula o exercício físico e promove a conectividade social.
“É importante entender que você não está simplesmente olhando para a taxa de returno de dois benefícios muito específico”, diz ele.
A escolha das espécies, do local de plantação e da disposição das plantas também interfere nos benefícios gerados pelas árvores. Para a poluição do ar, por exemplo, o artigo da TNC leva em conta a média do impacto medido por publicações anteriores. No entanto, a literatura especializada costuma indicar que as árvores podem ter efeitos diversos na poluição atmosférica, nota Donovan. E, de fato, qualquer benefício vai ser amplificado quando as árvores são plantadas em áreas densamente povoadas e altamente poluídas.
“Você não vai utilizar uma amostra gigantesca de quilômetros e quilômetros de ar puro”, diz ele. “Então mede uma área de algumas centenas de metros, e vai querer estar perto das regiões onde se concentra o maior número de pessoas e que seja próxima à emissão de poluição”.
Por isso não seria tão eficaz a para reduzir as doenças relacionadas à poluição criar grandes parques, segundo Donovan, a não ser que eles sejam criados próximos a avenidas estruturais para o transporte público. Por outro lado, os parques podem trazer outros benefícios à saúde, como aliviar o stress e propiciar a prática de atividade física. E que podem salvar vidas da mesma forma.
O estudo do TNC também sugere que basta viver próximo a áreas verdes, com vegetação no entorno, para que as pessoas vivam por mais tempo e com mais saúde. Mas Donovan destaca que algumas árvores emitem compostos orgânicos voláteis que, na interação com outros químicos presentes na atmosfera, podem produzir ozônio, que é danoso. Além disso, aglomerações de árvores tendem a capturar material particulado em suas folhas e casca, o que pode ter o efeito de manter alto o nível de poluição em áreas reduzidas, ao impedir que o fluxo de ar remova os poluentes.
Em outras palavras, as árvores de fato trazem uma série de benefícios em termos de poluição atmosférica. Mas ainda há uma série de fatores complexos para serem levados em conta em relação ao tipo de árvores plantadas, sua localização e características. Por outro lado, há uma série de estudos que corroboram a tese de que o plantio de árvores urbanas traz benefícios na redução de temperatura e da emissão de carbono.
Quando todos os benefícios à saúde forem levados em conta, deve ficar evidente a necessidade de se investir mais no plantio de árvores urbanas, acredita Donovan.
Para os pesquisadores da The Nature Conservancy, o plantio de árvores, isolado, não vai resolver o problema da poluição nem conter o aumento da temperatura mundial. Mas é uma forma relativamente barata de resolver pelo menos parte do problema. E de lambuja melhorar a qualidade de vida de milhões de pessoas, dizem.
“Não estamos, de forma alguma, defendendo que o plantio árvores pode substituir outras ações”, diz McDonald. “Mas sendo uma das ferramentas disponíveis para as cidades resolverem dois grandes problemas, faz muito sentido usá-las”.
Com contribuição de Chris Mooney
Tradução: Naiady Piva