Para parte dos motoristas de automóveis particulares, ficar parado no trânsito enquanto o ônibus, a bicicleta e até o pedestre a ultrapassa em faixas exclusivas pode parecer uma injustiça. Mas a segmentação da via pública por diferentes modais vem sendo uma medida recorrente em grandes cidades para resolver congestionamentos. Priorizando o transporte coletivo e a bicicleta, gestores públicos acreditam que diminuirão a quantidade de automóveis particulares no dia a dia das metrópoles.
Com um histórico de vias segregadas ao transporte coletivo, Curitiba dá os primeiros passos na implantação das faixas. Essa estrutura mais simples de priorização do ônibus, com tinta e tachões, já está disseminada em cidades populosas como Londres, São Paulo, Rio de Janeiro e Bogotá e até em municípios médios como Juiz de Fora (MG) e a paranaense Londrina.
Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), explica que as faixas e os corredores segregados devem ser projetos complementares. “Cada projeto se adapta para o perfil da via onde ele está sendo implantado”, disse Néspoli. A canaleta, por exemplo, é perfeita para vias com características expressas como a Linha Verde ou a Avenida das Torres (quando já não houver mais torres). Mas já não é a melhor solução para vias arteriais, como as ruas XV de Novembro e Conselheiro Laurindo -- ambas com projetos já implementados.
A segregação das vias e o estímulo ao transporte coletivo surgem como alternativas ao alargamento do sistema viário, modelo que se mostrou pouco eficaz no médio prazo. Paulistanos que o digam. Em 2010, o então prefeito José Serra concluiu uma obra de R$ 1,5 bilhão para alargar a Marginal Tietê. Cinco anos depois, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) divulgou que os congestionamentos por ali aumentaram, em média, 80%.
Mas especialistas apontam que a implantação da faixa tem de vir acompanhada de outras medidas. “Precisa haver racionalização da frota coordenada com a demanda. Em São Paulo, a impressão inicial era de que as faixas não davam certo. Mas hoje já não há mais questionamentos”, defendeu Lincoln Paiva, presidente do Instituto Mobilidade Urbana. A capital paulista conviveu com um fenômeno comum pós-implantação das faixas. Como os ônibus circulavam mais rapidamente, eles chegam antes ao destino e passavam a ficar mais tempo parados no ponto final. Por isso, há a necessidade de adequar as tabelas de horários de partidas nas linhas beneficiadas com os corredores exclusivos.
São Paulo ganhou 410 quilômetros de faixas exclusivas nos últimos três anos. Até então, havia 90 quilômetros. No ano passado, a prefeitura divulgou que a velocidade média do transporte coletivo na cidade aumentou 67,5% – passando de 12,1 Km/h para 20,3 Km/h. Também no ano passado, a pedido da Gazeta do Povo, a Urbs apresentou dados que mostraram redução no tempo de viagem das linhas que trafegavam nas faixas já instaladas em Curitiba.
Salvador suspendeu faixas por ter congestionado linhas de ônibus
Crítica comum feita por motoristas de automóvel particular, o congestionamento causado pela implantação de faixas exclusivas de ônibus fez a prefeitura de Salvador rever a implantação de duas faixas na capital baiana. Em novembro de 2013, as avenidas Juracy Magalhães Júnior e ACM chegaram a ganhar esses corredores. Mas dias depois da implantação, a fiscalização foi suspensa. À época, a justifica do município foi de que a via acabou congestionando o tráfego dos ônibus que circulavam por ali porque havia muitas linhas. A promessa era de que mais estudos fossem feitos no local para a retomada da priorização. Mas até hoje as faixas permanecessem desativadas, apesar de outras terem sido implantadas em outras vias de Salvador.
Apesar de defender a política de priorização do transporte coletivo como um todo, o arquiteto e urbanista Lucio Gomes Machado afirma ser um “mito” imaginar a extinção dos automóveis particulares nas grandes cidades.”É claro que o transporte coletivo tem de crescer. Mas São Paulo, por exemplo, é caracterizada por uma diversidade de serviços e as pessoas precisam estar em vários lugares da cidade durante um mesmo dia, microcapilaridade que o transporte coletivo não consegue fazer. Então , vamos ter que continuar resolvendo problemas viários, espaciais e de estacionamento”, afirma.