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Para cientistas, talvez tenhamos que viver em cidades feitas de ossos ou cascas de ovo

Como os originais, ossos e cascas de ovo artificiais são compostos de proteína e minerais. Segundo cientistas, poderiam  ganhar resistência o suficiente para servirem como “materiais de construção”. | /Bigstock
Como os originais, ossos e cascas de ovo artificiais são compostos de proteína e minerais. Segundo cientistas, poderiam ganhar resistência o suficiente para servirem como “materiais de construção”. (Foto: /Bigstock)

A hipótese foi levantada por bioengenheiros da Universidade de Cambridge, no Reino Unido: se realmente chegarmos a mais de 9 bilhões de pessoas em 2050, talvez precisemos de construções mais “orgânicas”. Michelle Oyen, pesquisadora que trabalha já há alguns ano dentro da instituição com a área de biomímica, ou seja, com processos e soluções copiados da natureza, está literalmente pensando em cidades feitas de ossos ou cascas de ovo ou qualquer composto orgânico que ofereça resistência e, ao mesmo tempo, possa facilmente decompor-se. É um passo adiante de outros pesquisadores que, por exemplo, estudam como produzir concreto e aço, os dois grandes elementos das construções urbanas contemporâneas, de forma mais sustentável. “O que nós estamos tentando fazer é repensar a maneira como fazemos as coisas“, disse ela à assessoria de imprensa da universidade.

Em seu laboratório, com pesquisas financiadas pelo setor de engenharia das Forças Armadas dos Estados Unidos, Michelle constrói pequenas amostras de ossos, que poderiam ser usados com propósitos mais óbvios, como o desenvolvimento de implantes para o corpo humano, mas também poderiam ganhar escala e serem usados como materiais construtivos de baixa emissão de carbono. A cientista teve essa ideia porque viaja frequentemente entre o Reino Unido e os Estados Unidos e sempre se sentiu “culpada” por toda a emissão de poluentes de suas idas e vindas. “Mas a verdade é que, embora as emissões causadas pelas viagens aéreas sejam significativas, aquelas provocadas pela produção de concreto e aço, elementos com os quais a maioria das cidades é construída, são bem mais”, observou Michelle.

Como os originais, ossos e cascas de ovo artificiais são compostos de proteína e minerais. Nos ossos, a proporção entre os dois elementos é quase igual – os minerais dão dureza aos ossos e os deixam difíceis de quebrar, enquanto a proteína lhes proporciona durabilidade e resistência contra fraturas. Ainda que os ossos possam quebrar isso é algo relativamente raro e eles ainda têm a vantagem de ser autocuráveis – outra característica que o engenheiros estão tentando imitar dentro do laboratório. Em relação às cascas de ovo, 95% da composição delas é de minerais; 5% de proteína. Mesmo essa pequena quantidade de proteína torna as conchas resistentes, considerando o quão finas elas são.

Muito resumidamente, o trabalho no laboratório de Michelle consiste em amostras sendo mergulhadas em misturas como cálcio e proteína (nesse caso colágeno), depois em água, depois em fosfato e mais proteína, e assim sucessivamente até que um pequeno pedaço de osso ou casca de ovo surja. Para facilitar esse processo, repetitivo, a equipe desenvolveu pequenos robôs de Lego. Pensando longe, é um processo que ser reproduzido em maior escala, com maiores robôs e quantidades de minerais e proteínas. E é algo que pode ser feito em temperatura ambiente, o que já sinaliza uma economia de energia durante o processo.

Obstáculos

Mas pode ser que leve algum tempo antes que estejamos vivendo em casas feitas desses materiais. Primeiro, porque o colágeno usado para essas amostras vem de fontes naturais, ou seja animais. Uma das questões que Michelle está investigando é se um derivado não-animal ou mesmo um polímero ou uma proteína sintética poderia ser usada no lugar do colágeno natural. Outra questão é que pensar a construção com novos materiais levaria, invariavelmente a uma revolução nessa indústria. “Mas se nós queremos realmente derrubar os níveis de emissão de carbono, então eu acho que é isso o que nós devemos fazer”, ressaltou Michelle.

E a madeira?

Outro pesquisador da Universidade de Cambridge, o doutor Michael Ramage, do Departamento de Arquitetura, está indo por um caminho menos ousado. Ele tem vários projetos em andamento direcionados para a aplicação da madeira – um dos mais antigos materiais de construção da humanidade – para outros tipos de construção além da tradicional, e mais altos, bem mais altos. Um deles é para um arranha-céu de 300 metros de altura para abrigar a prefeitura de Londres.

Assim como outros materiais naturais, o primeiro benefício do uso da madeira como um material de construção seria sua característica renovável. A pesquisa de Ramage também está investigando outras possibilidades da madeira, como a redução de custos e de tempo, formas como melhorar a resistência a incêndios e de diminuir consideravelmente o peso dos prédios. “A premissa fundamental é a de que madeira e outros materiais naturais estão subutilizados e nós não damos a eles crédito suficiente”, disse Ramage à assessoria de imprensa de Cambridge.

O maior prédio de madeira de pé hoje é um de 14 andares em Bergen, na Noruega, mas Ramage tem ambições “mais altas”. “As cidades do futuro poderão não parecer muito diferente [das de hoje] – até lá, é possível que você nem possa identificar imediatamente se uma edificação é feita de madeira, aço ou concreto. Mas pode ser que sejam muito mais silenciosas, com prédios de madeira sendo pré-montados e depois apenas colocados no lugar, gerando um quinto do tráfego de caminhões que uma construção a base de concreto gera.”

Segundo Michelle, as propriedades dos ossos e da madeira são muito similares. “Só porque podemos fazer todos os nossos prédios de concreto e aço não significa que devemos. Mas isso demandará uma grande mudança”, finalizou ela.

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