Nove parques ou áreas verdes de Paris foram fechados devido à crise dos ratos| Foto: Pierre Terdjman/New York Times

Nas manhãs frias de inverno, a maioria dos parisienses passam apressados pela bela praça da torre medieval de St. Jacques, que fica fechada nesta época do ano. Mas, de tempos em tempos, fazem uma pausa, assustados com o barulhinho nas folhas caídas, ou desconfiados de algum movimento em meio à folhagem verde-escuro.

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Seria um pássaro? Um gato? Um cachorrinho? Não. É uma ratazana. Não. São três ratazanas. Não. Preste atenção: são 10 ou 12 ratazanas com seus pelos acinzentados chafurdando nas folhas secas do outono.

Paris está enfrentando sua maior crise de ratazanas em décadas. Nove parques e áreas verdes foram fechadas parcial ou completamente. Alguns, como o Champs de Mars, onde fica a Torre Eiffel, estão sendo “desratizados” pouco a pouco.

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“Essa é a primeira vez em 39 anos que vejo uma situação parecida”, afirmou Gilles Demodice, gestor do departamento de controle de pragas de Paris, que passou boa parte de sua vida adulta trabalhando para o município.

Algumas áreas infestadas não podem ser completamente fechadas, como a Boulevard Richard-Lenoir, que atravessa um bairro com poucas áreas verdes e é adorada por mães acompanhadas de carrinhos de bebê e atletas amadores – além de, aparentemente, também ser um local preferido por famílias de ratos.

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A invasão das ratazanas é um problema antigo em Paris – e, ao mesmo tempo, um problema novo. Além disso, trata-se de um problema difícil de resolver. Em 2014 o município havia prometido uma desratização completa.

No século XIX, os ratos aterrorizavam e enojavam os parisienses. Afinal, todos sabiam que cinco séculos antes, as criaturas haviam trazido a peste bubônica do Mediterrâneo até a cidade.

A praga tomou conta de Paris, assim como boa parte da Europa, matando cerca de cem mil parisienses, algo em torno de 30 a 50 por cento da população da cidade na época. Ao longo dos quatro séculos seguintes, o problema foi recorrente. Não surpreende, portanto, que a experiência tenha deixado Paris com uma aversão milenar aos roedores.

Atualmente, ninguém fala em livrar Paris de cem por cento dos ratos. Mas por que o problema está pior do que no passado?

“Não sabemos exatamente o porquê. Acredito que as áreas subterrâneas estejam superpovoadas, já que o habitat dos ratos geralmente é nos esgotos, debaixo da cidade, não na superfície”, afirmou Demodice.

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“Nosso trabalho consiste em empurrá-los de volta para baixo”, afirmou.

Regulações europeias podem ser as “culpadas”

Mas por que os ratos estão se proliferando? Seria culpa do bode expiatório predileto do continente – a União Europeia e seus burocratas sem face?

Sim, pode ser. Novas regulamentações adotadas por Bruxelas, a capital da União Europeia, forçaram os países a mudarem a forma como utilizam raticidas, afirmou o Dr. Jean-Michel Michaux, veterinário e diretor do Instituto Técnico e Científico de Animais Urbanos de Paris.

A maneira clássica de envenenar ratos envolvia o delivery de lanchinhos mortais, já que os funcionários dos parques colocavam pellets envenenados diretamente nos buracos onde os ratos viviam, ou passavam veneno em pó nas rotas subterrâneas utilizadas pelos ratos.

O veneno podia ficar preso ao pelo das ratazanas e “quando o rato fosse se limpar, ele se lamberia, engoliria o pó e estaria automaticamente envenenado”, afirmou Michaux.

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Em ambos os métodos, o rato entrava em contato direto com uma substância mortal. Geralmente, morria dois ou três dias mais tarde. O veneno é um anticoagulante que causa desidratação, hemorragia interna e morte. Entretanto, o método antigo podia facilmente contaminar a água e o veneno poderia ser ingerido por animais domésticos e pessoas, apresentando um risco especialmente elevado para crianças e gestantes, de acordo com Michaux.

Agora, a União Europeia exige que o veneno fique protegido em pequenas caixas plásticas, e os ratos precisam buscá-lo ativamente.

Ratos vivem ao melhor estilo Ratatouille

Contudo, em Paris as ratazanas não têm dificuldade de encontrar uma refeição completa a poucos metros de qualquer toca – ao menos nos arredores da Torre de St. Jacques. E, ao que tudo indica, eles preferem baguetes com manteiga e presunto, maçãs e restos de macarrão com presunto cru e ervilhas frescas.

A reprodução acelerada dos ratos é uma das razões que deixa os roedores sempre um passo à frente na competição pela sobrevivência.

“Os ratos são capazes de procriar a cada três semanas”, afirmou Michaux. “A maturidade reprodutiva dos filhotes é alcançada em seis a nove semanas e, muito rapidamente, a segunda geração já começa a se reproduzir, assim como a terceira, a quarta, e assim por diante”, afirmou.

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Levando-se em conta que uma ratazana prenhe tenha entre quatro e cinco filhotes por ninhada, os números crescem exponencialmente. Embora o veneno possa representar um perigo para os seres humanos, o mesmo vale para os ratos – ainda que ninguém esteja sugerindo que a peste bubônica possa voltar.

Sem risco de uma nova peste bubônica

A espécie de rato responsável pela peste negra, como a praga era conhecida, o Rattus rattus, um rato negro que chegou à Europa por volta de 500 a.C., não é o mesmo tipo de rato que está enfestando os parques de Paris.

O rato que causa alarme na capital francesa é o Rattus norvegicus, uma espécie relativamente recente na Europa, tendo chegado de 150 a 200 anos da Ásia. Embora não seja fácil ficar doente após entrar em contato com um deles, esses animais são portadores de doenças como salmonella e leptospirose.

Atualmente, a ratazana acinzentada de Paris também é uma moradora constante e familiar nas ruas, embora não chegue a ser a melhor amiga do homem: afinal onde quer que existam pessoas, também há ratos, afirmou Demodice.

Quem ouve Demodice, que passou boa parte da vida observando os ratos, chega quase a ter simpatia pelos roedores. “O rato é um animal muito inteligente e atlético”, afirmou.

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“As ratazanas cumprem um papel muito importante para nós, já que não precisamos cuidar do lixo que elas consomem. Isso significa que são muito econômicas e, quando estão nas redes de esgoto, também ajudam a limpar o interior dos canos com os pelos.

“Isso quer dizer que precisamos manter os ratos por perto. Eles são mais ou menos nossos amigos, mas precisam ficar no subsolo. É só isso que pedimos: que fiquem no andar debaixo.”