Esperar que o poder público resolva o problema dos animais domésticos abandonados ou mal cuidados é uma utopia e quem vive diariamente com a questão é quem diz isso. “Enquanto cada um não fizer a sua parte, não vai ter jeito”, diz a presidente da Sociedade Protetora dos Animais de Curitiba (Spac), Soraya Simon.
Assim como outros especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, Soraya também vê propostas de candidatos à prefeitura de Curitiba como a criação de um hospital veterinário público como algo que não vai resolver o problema.
“Quem vai usufruir desse hospital é, provavelmente, quem já tem condições de cuidar do seu animal, que tem um carro para leva-lo até lá. (...) Algumas ONGs defendem a castração gratuita e universal. Mas se a pessoa tem condição, faz parte [da guarda responsável] pagar pela castração, mesmo que em valor mais acessível.”
Para Soraya, o foco do município precisa estar no atendimento e orientação das comunidades mais carentes, nos animais em situação de risco, na facilitação do acesso a especialidades caras como a ortopedia, e na educação da população sobre guarda responsável.
“Tudo [intermediado] pela prefeitura. No caso do atendimento à população carente, o ideal seríamos ter, da mesma maneira que funciona no SUS, agentes comunitários fazendo o cadastramento dos animais, orientando e atendendo essas famílias em postos”.
Segundo informações divulgadas pela prefeitura de Curitiba, as equipes da Unidade de Vigilância de Zoonoses (UVZ), da Secretaria Municipal de Saúde, fazem trabalhos de orientação e palestras em conjunto com os 10 distritos sanitários da cidade, mas o que a presidente da Spac e os especialistas pedem é a criação de um espécie de “SUS para os animais”, guardadas as devidas proporções de investimento.
Isso e um investimento pesado em educação para guarda responsável, acredita Soraya, seria fundamental para aliviar o trabalho da Spac e outras tantas entidades e cidadãos.
“No último fim de semana [retrasado] tivemos de resgatar uma égua no bairro Uberaba. Era domingo à noite, os órgãos da prefeitura estavam fechados e nós tivemos que ir até lá. Também nos últimos dias recebemos uma denúncia de Almirante Tamandaré sobre cães debilitados, mas a pessoa que nos chamou não se deu ao trabalho de acompanhar os animais [até que a gente chegasse]. Fui dois dias até lá e não encontrei os animais. Basta ligar para gente e dizer que a responsabilidade é nossa? Não pode ser assim.”
Entre dívidas e boa vontade
A Spac precisa de ajuda sempre. No site da instituição, há várias orientações sobre como colaborar. Soraya conta que, em média, o trabalho da ONG custa cerca de R$ 50 mil ao mês, mas nunca é possível suprir isso. “Só em INSS devemos R$ 490 mil. Também temos R$ 4 mil em dívidas com ração e mais de R$ 20 mil com medicamentos”, conta Soraya, sem dar conta de enumerar todos os débitos da instituição.
Com a sede em Colombo pronta – e já ocupada com a capacidade máxima –, Soraya conta que o desafio agora é procurar um novo imóvel para alugar para abrigar a clínica que funciona no bairro Santa Cândida. “Estou visitando alguns imóveis, mais precisamos de um com condições adequadas para receber uma clínica, que atenda às exigências da vigilância sanitária e também que possa receber um alvará [para esse tipo de atividade]”. A casa onde a Spac realiza hoje atendimentos clínicos nem sempre tem as condições ideais para a realização de alguns procedimentos. Há dois anos, a instituição chegou a ser alvo de reclamações formais de professores da UFPR que disseram ter desistido de uma parceria com a Spac por falta de condições de trabalho no imóvel.
Nota fiscal
Além das doações diretas, pelo menos 12 instituições sem fins lucrativos e voltadas à proteção animal estão cadastradas no Programa Nota Paraná (a Spac é uma delas), do governo estadual. Funciona assim: para ajudar os animais abandonados e amparados pelas ONGs, o consumidor deve doar às instituições as notas fiscais pedidas no momento da compra sem solicitar o registro do CPF no documento. É preciso ficar atento. Com o CPF na nota fiscal, os créditos vão para o próprio consumidor e não podem ser doados.
Futuro das Cidades e Eleições 2016
Detentora de vários prêmios e sempre presente nas primeiras posições entre as cidades do Brasil e da América Latina não é fácil encontrar áreas em que Curitiba não tenha evoluído ou mesmo não seja referência. Nessas Eleições 2016, Futuro das Cidades se propôs a encontrar essas áreas. Esta é a sexta reportagem nesse sentido. A primeira tratou sobre o que Curitiba tem a aprender sobre rios mais limpos. A segunda, sobre a falta de mapeamentos dos imóveis desocupados. Ainda falamos sobre o porquê de Curitiba ainda não ter um bilhete único no transporte e sobre as atribuições dos municípios em segurança pública. Escrevemos também sobre como as políticas de moradia não podem se resumir a construção de casas .