Quando o Uber começou a operar em Curitiba, em março deste ano, a polêmica sobre o aplicativo já se arrastava há oito meses na Câmara Municipal. O primeiro projeto sobre o tema foi protocolado em agosto de 2015 pelo vereador Chico do Uberaba (PMN). A regulamentação é vista como a melhor forma de evitar um “stress social” causado por Uber e outras setores de economia compartilhada. Stress que ficou evidente na noite da última sexta-feira (24), em que conflitos entre Uber e táxi culminaram em perseguições, agressão e carros depredados. Especialistas consultados pela Gazeta do Povo comentam os motivos que levaram a situação a chegar ao extremo das “vias de fato”, e o que pode ser feito para impedir novos conflitos no futuro.
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Costurar uma boa regulamentação
Criar uma regulamentação que seja “boa para todo mundo” não é tarefa das mais simples. A indecisão é ruim para todo mundo - o município deixa de arrecadar, o motorista do Uber trabalha na ilegalidade, o taxista enfrenta concorrência irregular e o usuário utiliza um serviço instável. Uma lei têm de incorporar todos estes interesses sem deixar brechas, explica o coordenador de pós-graduação da Universidade Positivo, Leandro Henrique de Souza. A coisa fica ainda mais difícil pois o Uber é uma “tecnologia disruptiva”, ou seja, não é só a cor do carro que muda em relação ao táxi, mas todo a lógica do serviço, incluindo a forma de pagamento. Uma regulação, portanto, deve repensar o modelo de negócios tanto de Uber e aplicativos quanto do táxi. A lógica de que o taxista não é proprietário do seu carro, por exemplo, pode ser chacoalhada. Para levar tudo isso em conta, o poder público precisa ouvir os setores em conflito e a sociedade. Além disso, há impeditivos legais sobre até que ponto o município pode regular, que precisam ser resolvidos. Para o ex-presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PR), Marcelo Araújo, não cabe ao município regular o serviço do Uber, que considera irregular. Seria preciso adequar o serviço de aplicativos à legislação nacional, que obriga quem presta serviço de transporte a ter placa vermelha, opina.
Ano eleitoral dificulta decisões sobre temas polêmicos
Nem sempre é simples para os políticos tomarem posicionamentos sobre questões polêmicas em ano de eleição eleitoral. Como a disputa entre Uber e taxistas têm maior apelo para um segmento da sociedade – e não para a população como um todo – o tema não deve invadir com força a campanha para a prefeitura, opina o cientista político Fabricio Tomio, da UFPR. Já entre os vereadores, o apelo é maior. Primeiro pela exposição: eles estão em contato direto com manifestantes que vão a sessões da Câmara Municipal, por exemplo. Além disso, são mais suscetíveis a votos e boicotes de grupos de interesse. Aspecto em que os taxistas têm vantagem, pois já têm sindicatos e associações formais para pressionar os governantes. Por outro lado, alguns parlamentares e futuros candidatos podem buscar visibilidade encampando projetos de regulamentação. Para Tomio, o mais provável é que a solução para o problema fique para depois das eleições, em outubro.
Fiscalização insuficiente
Sem regulamentação, o serviço do Uber é considerado irregular pela prefeitura de Curitiba, que estabeleceu a multa de R$ 85 como operação padrão para os motoristas flagrados dirigindo Uber. Foram 75 operações com abordagem a 350 carros até agora, segundo o município. Motoristas do Uber estimam que haja mais de 1000 veículos em operação na cidade. Para o advogado Marcelo Araújo, a fiscalização é insuficiente, e o poder público “fecha os olhos” para o problema ao não agir de forma mais efetiva. Uma ação de inteligência - que não se resuma a abordar os carros na rua - poderia impedir o serviço do Uber, o que teria evitado a chegada às “vias de fato”, como ocorreu no último fim de semana.
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