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Protesto em outubro de 2013, no Rio, teve blacks blocs, atuais vilões das manifestações | Ricardo Moraes/Reuters
Protesto em outubro de 2013, no Rio, teve blacks blocs, atuais vilões das manifestações| Foto: Ricardo Moraes/Reuters

Opinião

Lei, para que te quero?

André Gonçalves, colunista e correspondente em Brasília

É batata. Para cada tragédia que gera comoção nacional há uma reação imediata em Brasília – alguém aparece com um projeto de lei milagroso que evitará que o problema se repita. Em fevereiro, o episódio da vez foi a morte do cinegrafista Santiago Andrade, atingido por um rojão quando cobria uma manifestação no Rio de Janeiro.

O governo federal logo se apressou para dizer que estava formulando uma proposição para coibir violência nos protestos e enviou ao Congresso Nacional – que já tem 16 textos sobre o assunto em tramitação. Há mais de um mês repete-se que o texto vai ficar pronto "na semana que vem". E nada.

Como era de se esperar, a poeira do caso Santiago baixou. A ideia de proibir o uso de máscaras durante as manifestações, por exemplo, também foi perdendo força. Somada à crise com o PMDB, é difícil dizer que a aprovação sai até a Copa.

Algumas mudanças na legislação parecem realmente fazer sentido. Mas será que isso vai impedir a violência? Já não existem leis sobre homicídio, dano ao patrimônio e desordem no país?

Como sempre repete um dos maiores especialistas em Direito Penal do país, o paranaense René Dotti, uma lei nova bastaria para o Brasil: aquela que fizesse todas as outras serem cumpridas.

Discussão

Conheça os principais temas que estão sendo debatidos no projeto de lei para coibir violência em manifestações que o governo federal quer enviar ao Congresso:

Mascarados

O governo desistiu da ideia de proibir o uso de máscaras. A proposta deve apenas garantir à polícia autoridade para determinar que o manifestante se identifique.

Vandalismo

O texto deve sugerir punições mais duras, acima de quatro anos de prisão, para casos de depredação de patrimônio. Atualmente, quem provoca danos à propriedade não pode ficar preso preventivamente.

Lesão corporal e homicídio

O agravamento de penas para crimes cometidos durante as manifestações também deve se estender para casos de lesão corporal e homicídio.

Armas

Durante as manifestações, o porte de armas ou objetos que possam ser utilizados como tal, como bastões, também deve ser considerado crime.

Máquinas fotográficas

O texto deve vedar expressamente que policiais tomem de jornalistas e manifestantes aparelhos como celulares, máquinas fotográficas e filmadoras usadas para registrar os protestos.

Abuso policial

Está em discussão a proibição total do uso de armas letais por policiais durante as manifestações. Também pode haver restrições para o uso de armas com balas de borracha.

Aviso prévio

A proposta deve estipular regras para o aviso prévio de realização das manifestações às autoridades. A exigência já está prevista na Constituição, mas não implica na necessidade de autorização.

Fonte: Gazeta do Povo.

O governo federal decidiu realizar consultas informais com juristas, especialistas em Segurança Pública e líderes partidários antes de fechar o projeto de lei para coibir a violência em manifestações. O diálogo tem sido conduzido, desde sexta-feira, pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. A proposta vai abordar a criação de regras para o uso de máscaras em protestos, o agravamento de penas para atos de vandalismo e a proibição da apreensão de câmeras pela polícia.

A estratégia atrasou os planos iniciais do governo e pode fazer com que o texto não seja aprovado até o início da Copa do Mundo, dia 12 de junho.

Até ontem, Cardozo já havia conversado com advogados, representantes do PCdoB e da Secretaria-Geral da Presidência, órgão do governo que faz a interlocução com movimentos sociais. As ideias iniciais divulgadas sobre a regulamentação das manifestações provocaram reações até de setores do PT. O medo é de "criminalização" de ações feitas por entidades como o Movimento Sem-Terra.

A assessoria do Ministério da Justiça informou que todas as alterações legais serão balizadas por dois incisos do artigo 5.º da Constituição. O 3.º diz que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". O 16.º estabelece que "todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização" e exige "prévio aviso à autoridade competente".

Até agora, a principal polêmica é quanto ao uso de máscaras por manifestantes. Depois de estudar a proibição, o governo deve flexibilizar a proposta, apenas esclarecendo que a autoridade policial pode determinar que o manifestante se identifique, mas somente em casos com risco de violência.

"Quando a Constituição fala em vedação ao anonimato trata de outras situações, como quando alguém escreve um texto para difamar outra pessoa. A meu ver, o texto constitucional garante ao cidadão que se reúna pacificamente, mesmo mascarado", avalia o juiz federal e professor de Processo Penal da UFPR, Sérgio Moro.

Em relação ao agravamento de penas, a proposta se choca com a última reforma do Código Penal, de 2011, que proibiu a prisão preventiva para crimes considerados "leves", com pena menor ou igual a quatro anos de prisão. A norma se encaixa nas penas para depredação de patrimônio privado (um a seis meses) e público (seis meses a três anos).

"Quem é apanhado depredando até vai para a delegacia para que seja lavrado o flagrante, mas não pode ficar preso. Há casos em que a lei aprovada em 2011 talvez tenha ido um pouco longe demais", diz o magistrado.

Crise política na base aliada afeta votação do projeto

Em crise com partidos da base aliada puxados pelo PMDB desde o início do ano, o governo deve enfrentar dificuldades para conseguir emplacar o projeto de lei sobre as manifestações na Câmara dos Deputados. A pauta do plenário está trancada desde o ano passado pela proposta que estabelece o marco civil da internet – outro tema considerado prioritário pela presidente Dilma Rousseff."Do jeito que as coisas estão, qualquer texto que seja de autoria do governo ter problemas", admite o vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR). Projetos de autoria do Poder Executivo precisam primeiro da aprovação dos deputados para depois seguir para o Senado. O Ministério da Justiça já adiantou que a proposta sobre as manifestações terá urgência constitucional, o que pode agilizar a tramitação.Além das dificuldades de negociação política, o tema não é uma novidade no Congresso. Doze projetos do gênero estão em tramitação na Câmara e foram transformadas em um substitutivo pelo deputado Efraim Filho (DEM-PB). O texto também prevê o aumento da pena para danos ao patrimônio provocados em protestos.

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