O governo federal apresentou, na quarta-feira (31), um balanço dos principais dados da segurança pública no Brasil em 2023. Segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), o país teve 40.429 homicídios no ano passado, o número mais baixo desde que os dados anuais começaram a ser consolidados pela pasta, em 2010.
No evento, o agora ex-ministro da Justiça Flávio Dino e outras autoridades atribuíram a ações do atual governo a queda na violência, sem ponderar que há uma tendência de redução dos homicídios desde 2018, depois do fim da primeira era PT na Presidência da República, que se encerrou em 2016. Uma das causas sugeridas por Dino para a redução na criminalidade foi a política de desarmamento da população.
"Tivemos o fim dessa era de banalização do acesso à arma", afirmou, em referência às medidas do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). "É possível tecer um panorama em que nós temos a redução do armamentismo irresponsável e não temos crescimento das taxas de criminalidade violenta – pelo contrário –, rompendo definitivamente aquela suposta relação de causa e efeito em que 'mais armas, menos crimes'. Nós mostramos que é 'menos armas, menos crimes'", complementou Dino.
Na divulgação dos dados nas redes sociais, o Ministério da Justiça usou um gráfico deturpado da série histórica de número de homicídios anuais entre 2010 e 2023. Veja abaixo como o gráfico divulgado nas redes do ministério sugere uma redução muito maior nos assassinatos entre 2022 e 2023 do que o gráfico real.
A redução de 4,1% de 2022 para 2023 é muito menor do que a ocorrida de 2018 para 2019, quando a diminuição dos homicídios foi de 19,2%. Ainda assim, no gráfico do governo, as duas quedas estão representadas com dimensão semelhante. No gráfico fidedigno, a queda de 2022 para 2023 é claramente bem mais discreta do que a diminuição ocorrida de 2018 para 2019.
O jurista Fabricio Rebelo, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), classifica a imagem usada pela gestão petista nas redes sociais como uma "manipulação gráfica" que distorce "grosseiramente sua representatividade estatística". "A representação já deixa bastante claro que o governo pretende utilizar politicamente os indicadores que agora anuncia, tentando não dar ênfase ao fato de que as maiores reduções históricas da série de homicídios se estabeleceu no governo anterior", afirma.
Ele também contesta a ideia de que as políticas de desarmamento tenham algo a ver com a redução nos crimes. "A retórica desarmamentista se mostra integralmente ideológica, desamparada de qualquer dado científico minimamente sério, tanto que qualquer tentativa de a justificar acaba esbarrando em malabarismos estatísticos que causariam vergonha a qualquer pesquisador minimamente respeitado", diz.
Para Rebelo, uma análise objetiva da realidade sugere o oposto do que afirmou Dino. "Durante as várias fases da legislação nacional sobre armas, justamente aquelas mais permissivas ao acesso do cidadão a esses instrumentos de defesa foram as que corresponderam a menores índices criminais, sendo igualmente verdadeira a correlação oposta", observa.
O especialista ainda destaca que uma das medidas do próprio ministro, a da exigência de recadastramento de armas junto à Polícia Federal, acabou comprovando que os equipamentos legais não caem nas mãos de criminosos. Aproximadamente 99% das armas foram identificadas por quem as possuía junto à PF, o que, para o especialista, põe em evidência "o absoluto devaneio ideológico em que consiste a tese de que armas legais abastecem criminosos".
Manutenção da redução de homicídios precisa ser lida com cautela, diz especialista
Rebelo considera arriscado buscar fatos isolados para explicar as oscilações nos indicadores de criminalidade. Ele avalia, contudo, que é normal que a tendência iniciada em 2018 não se rompa instantaneamente com a troca de governo.
Para o especialista, várias medidas adotadas desde 2018, como "políticas e posturas públicas de enfrentamento e intolerância ao crime - rompendo com a vitimização dos criminosos", além do cerco ao narcotráfico e do "incentivo para que o cidadão pudesse se defender" - acabaram enfraquecendo as organizações criminosas e "transmitindo o recado público de intolerância ao crime". Esses movimentos, segundo ele, sempre se estabelecem em tendências, e o que se vivenciou em 2023 ainda pode ser fruto dessas políticas.
"O grave risco está, justamente, no que vem pela frente, com a inversão desse discurso e a adoção de políticas de desencarceramento, abrandamento de penas e impedimento à autodefesa. Com essa fórmula, fatalmente essa tendência de queda havida nos últimos anos começará a se inverter", alerta.
O primeiro ano de governo, na visão de Rebelo, "não apresentou uma única diretriz sequer voltada ao combate à criminalidade". Ele avalia que a pasta da Justiça esteve "perdida entre investigações de desafetos políticos e perseguição a possuidores de armas legais, o que não traz absolutamente nenhum benefício à segurança pública e, por óbvio, não pode ser apontado como determinante de qualquer redução".
Por último, o especialista recorda que os dados do Ministério da Justiça são preliminares, colhidos junto às secretarias de Segurança Pública dos estados, e que os números oficiais sobre homicídios no Brasil só serão consolidados por volta de outubro deste ano, pelo DataSUS, sistema mantido pelo Ministério da Saúde.
Lula está acordado e passa bem sem sequelas após cirurgia cerebral de emergência
Confira os detalhes do que houve com Lula e o estado de saúde após a cirurgia; acompanhe o Entrelinhas
Milei completa um ano de governo com ajuste radical nas contas públicas e popularidade em alta
Prêmio à tirania: quando Lula condecorou o “carniceiro” Bashar al-Assad
Soraya Thronicke quer regulamentação do cigarro eletrônico; Girão e Malta criticam
Relator defende reforma do Código Civil em temas de família e propriedade
Dia das Mães foi criado em homenagem a mulher que lutou contra a mortalidade infantil; conheça a origem
Rotina de mães que permanecem em casa com seus filhos é igualmente desafiadora