Brasília A greve dos servidores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que já dura dois meses, começa a criar uma situação inédita nos hemocentros do país. Em vez da falta de sangue, os centros estão correndo o risco de sofrer com a escassez de kits (reagentes) que testam a qualidade do sangue doado. Por lei, antes de qualquer transfusão, o sangue tem de ser submetido a 11 testes. Entre eles, aids, hepatite C, sífilis e vírus causadores de alterações no fígado.
De acordo com Dante Langhi Júnior, diretor da Sociedade Brasileira de Hematologia, os estoques dos laboratórios que vendem os kits aos hemocentros no país vão durar apenas poucos dias. Os fiscais da Anvisa são responsáveis pela liberação de qualquer carga que chegue ao país. Com a greve, medicamentos, insumos utilizados na fabricação de remédios, alimentos e cosméticos, entre outros, estão parados nos portos. Os reagentes usados para testar o sangue coletado estão na lista de produtos retidos.
Segundo o Ministério da Saúde, o problema da falta de reagentes é pontual. "Até quinta-feira, não tínhamos notificação de problemas generalizados", informou a assessoria de imprensa da pasta.
"Sem os kits de análise, não há transfusão", diz Dalton Chamone, diretor do Pró-Sangue, em São Paulo, o maior hemocentro da América Latina. Existe também o risco de faltar bolsa usada na coleta de sangue. "Nunca vi coisa parecida", constata Chamone. O Pró-Sangue, que usa mil kits por dia, ainda tem estoque para durar mais três meses. "Mas, se continuar, vamos sofrer. Os hemocentros do interior já estão começando a pedir kits ao Pró-Sangue." A situação do hemocentro da Santa Casa, em São Paulo, que usa 170 kits por dia, é um pouco pior. "Nosso estoque de kits dura mais 20 dias", conta Mauro César de Andrade, gerente do lugar.
A greve começa a preocupar o interior de São Paulo. No hemocentro de Ribeirão Preto, que distribui sangue para hospitais de mais de 80 municípios, o estoque é mantido graças a uma compra emergencial de bolsas para armazenamento de sangue. Mas a previsão é que os estoques durem mais três semanas. Os bancos de sangue da Paraíba estariam com o mesmo problema.
Reivindicação
Os grevistas reivindicam equiparação de salários entre os funcionários novos, admitidos por meio de concursos, e os mais antigos. A diferença entre os salários-base pode chegar a até R$ 2 mil, segundo os grevistas. Nesta semana, dirigentes de associações ligadas ao setor de saúde planejam uma reunião com a ministra da Casa Civil Dilma Rousseff, e com o diretor da Diretoria Colegiada da Anvisa, Dirceu Raposo, para detalhar os prejuízos do setor com a greve.
A greve atinge 60% dos 1,4 mil funcionários da Anvisa que trabalham em portos, aeroportos e fronteiras, responsáveis pela vistoria das cargas que chegam ao país.