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Um grupo de lideranças evangélicas com viés socialista lançou no começo de julho a Bancada Evangélica Popular (BEP), um movimento político que quer desassociar os evangélicos da imagem de conservadores.
“Nosso setor evangélico tem participado de forma negativa na política, com lideranças e um projeto de poder que não combinam com os valores do evangelho. Ferem a laicidade do Estado, cultivam a cultura do ódio e prejudicam a luta por justiça social”, disse o grupo em uma publicação em 14 de julho.
Entre os fundadores da Bancada Evangélica Popular – todos do estado de São Paulo – estão pastores e ativistas evangélicos ligados a movimentos de esquerda, como a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, o Coletivo Inadequados e o Evangélicas Pela Igualdade de Gênero. Eles fazem parte de igrejas protestantes como a Comunidade Cristã na Zona Leste (CCZL), a Igreja Metodista da Luz e a Igreja da Garagem.
O plano da BEP é intervir diretamente na política, entrando em partidos e elegendo nomes de sua escolha. “É nosso propósito ocupar as câmaras e assembleias com uma bancada evangélica popular, que lute e defenda os direitos de nosso povo”, anuncia o grupo. “À luz da palavra de Deus, queremos promover políticas públicas concretas que cessem com a desigualdade social e promovam justiça, paz e dignidade para todas e todos.”
Viés socialista é proclamado às claras
Embora em alguns momentos a Bancada Evangélica Popular se apresente como mera alternativa ao que denomina “cultura do ódio” dos políticos evangélicos que hoje exercem mandatos no Brasil, o movimento não deixa de proclamar às claras seu viés socialista. Em vários momentos, apresenta visões bem próximas às do marxismo clássico, como o rechaço aberto ao capitalismo.
O pastor Ariovaldo Ramos, que no ano passado publicou uma carta em apoio ao ex-presidente Lula, é um dos idealizadores da BEP. Em transmissão ao vivo no Facebook para lançar o movimento, em 5 de julho, Ramos disse que “a fé cristã sempre foi socialista” e que é inevitável que a Bancada Evangélica Popular atue somente com partidos que tenham o socialismo como bandeira. “Nós temos um projeto socialista, que é o projeto cristão”, disse o pastor.
Entre as bandeiras da BEP, Ramos mencionou a luta pelo meio ambiente, pela igualdade de gênero, pela “igualdade entre todos os seres humanos”, o antirracismo e o fim do capitalismo “como um sistema feroz, selvagem, que premia a acumulação e que estabelece a exclusão de seres humanos”.
Samuel Oliveira, ativista e membro da Comunidade Cristã na Zona Leste (CCZL), tem sido o principal porta-voz do movimento. Em um vídeo recente do movimento Jornalistas Livres, ele afirmou que a BEP se pretende como um contraponto ao “[...] setor mais conservador, e totalmente entregue, vendido e comprado pelo sistema financeiro, pelo capital e por toda uma elite, uma classe dominante, que usa da sua suposta identidade evangélica para poder conduzir as massas do nosso povo evangélico”.
Progressismo nos costumes também faz parte do ideário da Bancada Evangélica Popular
“Paz e bem a todos, todas e todes” (sic), diz a BEP na legenda de apresentação do vídeo de lançamento da iniciativa. A adesão à ideologia de gênero é frequente nos conteúdos publicados pelo movimento.
A simpatia por bandeiras caras aos movimentos progressistas contemporâneos, como a ideologia de gênero e as causas LGBT, também fica clara nas falas dos membros e nos comunicados publicados pela BEP. “A igreja evangélica passa uma mensagem muito ruim desde alguns anos para o país, dando a impressão de que nós somos um povo reacionário, pró-capitalista e repleto de fobias. Isso não é verdade”, afirmou o pastor Ariovaldo.
No manifesto publicado em seu site, a BEP diz que quer cuidar “de todos os oprimidos e oprimidas por esse sistema que tem ceifado as vidas dos pobres, e principalmente das mulheres, dos negros, dos LGBTs, dos estrangeiros, dos indígenas, e de todos aqueles e aquelas por quem nosso Cristo, pela graça maravilhosa, entregou sua vida na cruz”.
Por enquanto, mesmo com a participação de pastores conhecidos em alguns meios evangélicos, a BEP ainda engatinha em apoio popular: sua página no Facebook, espaço virtual onde o movimento foi lançado, tinha cerca de 500 curtidas até a publicação da reportagem.