O uso de máscaras dentro das escolas tem deixado pais e educadores preocupados. Eles argumentam que o acessório, além de não ser usado corretamente pela maior parte das crianças, acaba prejudicando o desenvolvimento da linguagem, socialização e reconhecimento de emoções. As máscaras também dificultariam a prática de atividades físicas por parte dos pequenos. Por causa disso, diversos grupos têm tentado mudar os atuais regulamentos sobre os protocolos de saúde que, via de regra, dizem que o uso de máscara é obrigatório dentro das salas de aula.
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Pelo menos 17 grupos de discussão sobre o assunto estão se articulando para tentar flexibilizar o uso de máscaras pelas crianças. Eles estão espalhados por estados como São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Piauí e Rio Grande do Sul, além do Distrito Federal, e usam a internet para conquistar apoio e organizar ações, como a colocação de outdoors pelas ruas das principais cidades brasileiras.
Um desses grupos é o Pais pela Educação, do Espírito Santo. Ele foi criado pouco tempo depois do carnaval de 2020, quando a pandemia de Covid-19 levou ao fechamento das escolas em todo o país. O grupo de discussão nasceu da preocupação dos pais em como ficaria a educação de seus filhos e funcionou como um meio de compartilhar experiências e também se mobilizar. “Enquanto o governador e prefeitos fizerem campanhas políticas, abrindo apenas o que lhes convém para fazer politicagem, as escolas estão sendo um cenário de ordens absurdas e inconstitucionais”, lamenta Cláudia dos Reis, uma das coordenadoras do grupo.
Pedagoga e neuropsicopedagoga, ela também tem três filhos, de 18, 13 e 11 anos de idade, e conta que atualmente uma das principais preocupações dos mais de 4 mil participantes do grupo é a obrigatoriedade do uso de máscaras dentro das salas de aula. Segundo ela, desde a reabertura das escolas e reinício das aulas presenciais, os pais têm relatado casos de crianças que passam mal por terem de fazer as aulas de educação física usando máscaras. Para ela, as crianças e adolescentes acabaram prejudicadas pelo uso político da pandemia. “Há muitas vidas se perdendo. Não é somente um vírus que está destruindo a nação; há também essa obrigatoriedade do uso de um objeto que não teve eficácia”, defende Cláudia.
Saúde debilitada
Também fundado logo após o fechamento das escolas em 2020, o Escolas Abertas Paraná é outro grupo engajado na defesa do fim da obrigatoriedade do uso de máscaras dentro das escolas. A advogada Aline Leal Kuss, uma das coordenadoras, explica que o objetivo inicial era garantir que as crianças pudessem estar nas salas de aulas. Por isso, eles se mobilizaram pela abertura urgente das escolas, mas “sempre com base na ciência e focando na segurança e no bem-estar das crianças”, ressalta Aline.
Agora, a mobilização do grupo é contra as máscaras. Aline cita diversos estudos científicos que questionam a eficácia das máscaras, especialmente as de pano, como medida de prevenção ao coronavírus. Ela lembra que são justamente essas as distribuídas nas escolas públicas do Paraná. Ainda de acordo com ela, outros estudos, feitos na Alemanha e nos Estados Unidos, comprovaram que o uso contínuo de máscara aumenta a quantidade de dióxido de carbono inalado pelas crianças e pode levar a sintomas como dor de cabeça, sonolência e fadiga.
Na página do Instagram do grupo, essas argumentos são mostrados em forma de mensagens detalhadas. “Nada do que publicamos aqui é baseado em achismos. Nós somos mães e pais, que se preocupam com a saúde dos seus filhos, e buscamos sempre além do que nossos olhos podem ver num primeiro momento”, diz uma das postagens.
Outro argumento de Aline contra o uso de máscaras é a existência de protocolos de saúde, como a restrição de acesso à escola por parte de outras pessoas, higienização constante e rápida identificação de casos suspeitos ou possíveis surtos. Para ela, as crianças foram as mais prejudicadas com a pandemia, pois nem à escola puderam ir, e agora que podem, precisam fazê-lo usando máscara. “Muitas crianças sequer conhecem o rosto de seus professores e de seus amigos. No momento em que estamos, nada mais justo do que flexibilizarmos primeiro para elas o uso de máscaras, enquanto nós, adultos, podemos seguir usando, de forma a permitir que a infância seja, enfim, livre”, afirma.
Embora as máscaras ainda sejam exigidas em todo o estado do Paraná, incluindo nas escolas, Aline está otimista. Ela conta que o grupo já conseguiu apoio de parlamentares, vereadores e deputados, que já declararam apoio à pauta e estão atuando pela flexibilização do uso de máscaras por crianças de até 12 anos, seja dentro das salas de aulas ou nos pátios das escolas. Para divulgar a causa, até uma campanha de arrecadação online foi criada para custear outdoors pela capital paranaense e cidades vizinhas.
Escolas também começam a se posicionar
Não são apenas pais que estão engajados no debate sobre o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras nas escolas. Mariana Pereira, sócia-diretora de uma escola particular em São Paulo (SP), tem provocado e educadores e outros colégios a também se posicionarem sobre o assunto. Ela explica que, pelo menos até agora, todas as decisões em relação ao fechamento e abertura das escolas e sobre os protocolos a serem usados no retorno das aulas presenciais têm ignorado completamente os educadores. “A educação também é uma ciência, e nós - educadores e pedagogos - também precisamos ser ouvidos. A educação precisa ser colocada no lugar que merece, na posição de prioridade”, diz ela.
Ela explica que, além dos problemas causados pelo longo período fora das escolas, agora as crianças acabam tendo de enfrentar também as limitações impostas pelo uso da máscara. Falando especialmente das crianças menores, ela ressalta que o equipamento dificulta o desenvolvimento da linguagem, tanto verbal quanto não verbal, afeta a capacidade de desenvolver laços e empatia e de reconhecer emoções, além de ter impacto até na respiração e postura das crianças. “As janelas de aprendizagem da infância são muito expressivas porque se as crianças não alcançam certas habilidades nessa fase, é muito difícil recuperar depois”, afirma.
Assim, ela entrou em contato com outros diretores de escolas particulares de São Paulo e, juntos, elaboraram uma carta direcionada às secretarias de Saúde e Educação da cidade. No documento, eles cobram que as escolas, em caso de flexibilização, sejam tratadas como prioridade. Como em todo estado de São Paulo o uso de máscaras passou a ser opcional em áreas abertas, Mariana e os outros diretores do grupo querem que a flexibilização chegue às salas de aula. “Nós somos agentes ativos da educação, somos responsáveis pelos nossos alunos e não podemos ser passivos nessa situação. Máscaras só devem ser usadas em casos extremos”, defende.
Benefício não comprovado do uso de máscaras
Estados como Santa Catarina e Rio Grande o Sul já deixaram a cargo dos pais decidir sobre o uso ou não de máscaras por crianças. Em Santa Catarina, por exemplo, as crianças de até 12 anos foram desobrigadas a usar o equipamento, tanto em ambientes internos quanto externos. O governo catarinense ainda orientou que crianças de até 2 anos de idade não devem usar máscaras; que as de 2 a 5 anos devem usar apenas sob supervisão de um adulto e as de 6 a 11 anos podem usar sem supervisão.
Medida semelhante foi tomada no Rio Grande do Sul por meio de um decreto publicado no final de fevereiro deste ano. Conforme parecer técnico do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), da Secretaria Estadual da Saúde (SES) do RS, que embasou a medida, ainda que a legislação federal preconize o uso obrigatório de máscara para pessoas acima de três anos, nos últimos 24 meses não se apresentaram evidências robustas que comprovem o benefício da obrigatoriedade do uso de máscaras em algumas faixas etárias. O Cevs ainda ressalta que “não há base técnica que suporte a obrigatoriedade de máscaras indiscriminadamente na faixa etária de três anos até 11 anos”. Atualmente, o decreto está suspenso por meio de uma liminar judicial, impetrada por um grupo de pais ligados a partidos de esquerda.
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