Auxílio
Ensino do idioma começou em ONG com turma de sete alunos
Antes que a prefeitura abraçasse os haitianos por meio das aulas, a Casla Latinoamericana uma ONG que ajuda migrantes com todo tipo de assessoria, inclusive jurídica improvisou aulas de português aos sábados pela manhã. Em pouco tempo, a turma que começou com sete alunos já contava com mais de 90.
"Foi aí que pedimos esse apoio da prefeitura", conta a internacionalista Fabiane Mesquita. "As pessoas os veem como fugidos, bandidos, gente que vem tomar o emprego dos outros. Muitos não tem documentação, então a Casla procura casas para eles ficarem e um professor aqui acaba sendo fiador", diz Fabiane.
Preconceito, burocracia e falta de políticas públicas para o migrante são as dificuldades apontadas pelos estrangeiros que se arriscam no país. "Um dia peguei um jornal, e perguntaram: haitiano sabe ler? Só porque não falamos português acham que somos burros", recorda Fednel Pierressaint, que quer estudar Medicina na Universidade Federal do Paraná (UFPR).
"A universidade não é para estrangeiros, é difícil entrar. O Brasil é um país caro. Nos falta muita coisa", completa Johndy Choute, 31 anos, três deles em Curitiba. Gerente de supermercado no Haiti, onde deixou esposa e dois filhos, ele tem planos de, futuramente, "morar" nos dois países. "Mas falta segurança para vir com a família," diz.
Quando decidiu deixar o Haiti, há sete meses, o professor de Física Fednel Pierressaint, 24 anos, não imaginava que o idioma seria uma barreira tão grande, talvez até maior do que o preconceito enfrentado para ser um cidadão no Brasil. A exemplo de seus mais de mil conterrâneos que, estima-se, vivem na região de Curitiba, Fednel tem mais estudos que boa parte dos brasileiros, fala francês e crioulo (um dialeto haitiano), mas, mesmo assim, não consegue emprego melhor do que assentar tijolos na construção civil. A alternativa para tentar mudar esse cenário surgiu há pouco mais um mês: lições de língua portuguesa.
Fednel e outros 40 haitianos de Curitiba se reúnem nas noites de segunda a quinta-feira, na Escola Municipal Professor Brandão, no Alto da Glória, para aprofundar o contato com o idioma. "O que eu quero é, de dia em dia, falar melhor a língua, para explorar minha capacidade. Nunca pensei em trabalhar na construção. Não é minha vocação", diz Fednel, pausadamente, em um português claro prova de que as aulas têm ajudado.
A professora, Ciomara Amorelli Viriato da Silva, não fala francês e nunca tinha ensinado a língua materna a estrangeiros. "Minha experiência era com a formação de professores indígenas para alfabetização de crianças em português. Mas não é difícil. Fazemos teatro, desenho no quadro, e um aluno mais avançado explica para alguém que não entendeu", conta.
Os alunos têm se esforçado. Mesmo depois de uma jornada estafante, os haitianos encontram forças para caminhar quilômetros a pé e assistir às aulas. "Quero fazer Medicina, mas sem o certificado de fluência no português, você não faz nada", explica Josué Matxis, 24 anos.
Há sete meses em Curitiba, onde mora com outros haitianos em uma casa alugada pela empresa de construção civil em que trabalha, o jovem ganha R$ 1 mil por mês. No Haiti, a remuneração era de três dólares por hora para aulas de Física e Matemática.
Sonho
Cursar o ensino superior é um sonho compartilhado por grande parte dos migrantes, como Dina Jean, que é passadeira em uma lavanderia do Batel. "Quero falar muito bem, me explicar bem, para estudar Farmacologia", conta. Acompanhada do marido, Dina abandonou o trabalho em uma ONG internacional de assistência social e deixou os dois filhos, de 3 e 6 anos, aos cuidados da irmã. Em Curitiba, com muito custo, o casal alugou uma casa no bairro Centenário. "Foi muito difícil conseguir alugar. Não quero trazer os filhos, a língua é difícil, é tudo difícil", lamenta.
Para a professora Ciomara, os relatos dos migrantes comprovam a necessidade da criação de um centro específico para o ensino da língua a estrangeiros. "Eles estão aqui ajudando a cidade. Há muitos na obra da Arena, do Pátio Batel, mas o salário é muito pouco. O que eles ganham em troca?", questiona.
"Eles foram iludidos", diz assistente social
Os atendimentos a haitianos são frequentes na Pastoral do Migrante de Curitiba desde 2011, quando eles começaram a desembarcar no país. Segundo a assistente social Elizete SantAnna de Oliveira, a migração é forçada pela inexistência de postos de trabalho no Haiti. "Eles vieram muito iludidos para cá, os coiotes [pessoas que fazem a travessia até o país] prometeram que ganhariam em dólar. Muitos contraíram dívidas lá, venderam o que não tinham para vir. E, agora, a angústia deles em mandar dinheiro para a família é grande," explica.
No Brasil, os haitianos acabaram criando uma extensa rede entre si, o que torna o país mais atrativo, apesar dos baixos salários. Não é difícil encontrar quem tenha vindo para Curitiba por causa de um amigo ou parente. Aqui, eles têm visto de permanência, registro em Carteira de Trabalho e CPF. Os que não têm seguro saúde na empresa são atendidos como qualquer brasileiro pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Mas os direitos plenos de cidadão são mais distantes. O Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) leva de um a dois anos para sair. Traduzir e reconhecer documentos é outro processo caro e demorado. "A organização do governo precisa ser maior. Deveria existir uma secretaria municipal para o migrante, por exemplo", ressalta Elizete.
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