Sérgio Said Staut Júnior é um advogado típico – desses que qualquer um chamaria para defender uma causa. A diferença fica por conta do campo em que atua – a dos direitos autorais (lei 9.610/98). O ofício o obriga a abrir mão da formalidade para discorrer sobre supostos plágios do Rei Roberto Carlos, citar longas-metragens como O Povo contra Larry Flynt – cinebiografia do magnata da imprensa pornô norte-americana – e decifrar as relações perigosas de Dan Brown com as fontes em que bebeu para escrever o best seller O Código da Vinci.

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Na voz de Sérgio Staut, o discurso ganha um tom didático, quase civilizatório, provando que os direitos autorais estão mais próximo do cotidiano do que se possa imaginar. Basta pensar no balcão de fotocópias da faculdade ou na tarefa escolar dos filhos feita com a ajuda da santa internet.

Aos 29 anos, doutorando em Direito das Relações Sociais pela UFPR e um livro publicado – Direitos autorais: entre as relações sociais e as relações jurídicas (Ed. Moinho do Verbo, 2006) – ele não tem sossego desde que se tornou uma referência no ramo. Além de cursos de extensão lotados em duas universidades, volta e meia é chamado para dar entrevistas na tevê e em programas de rádio, assim como a prestar socorro em missões quase impossíveis – aquelas em que empresas e cidadãos comuns esbarram na falta de tato para lidar com os delitos cometidos em plena era da reprodução da imagem e do texto.

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Confira trechos da entrevista do advogado à Gazeta do Povo.A escola estimula pesquisas em enciclopédias e muitas delas se resumem a cópias. Não seria um incentivo indireto a desrespeitar os direitos autorais?(risos) De fato, passei a minha infância usando a Barsa e a Mirador sem que meus pais e professores falassem em direitos autorais. Hoje, a internet é essa fonte de violação, pois é nela que os trabalhos de escola se resolvem. Quem faz cinco ou seis cópias de um CD também fere direitos, ainda que não seja um crime, já que não tem finalidade econômica. No Brasil vigora uma certa desvalorização dos bens imateriais. Somos cientes de que não podemos levar um vaso de uma casa, uma caneta de um escritório, mas vemos com naturalidade fazer uma cópia de 30-40 linhas de um autor, sem citar a fonte. Os brasileiros em geral sentem dificuldade em entender a dinâmica dos direitos autorais?Prefiro dizer que a internet, ao facilitar o acesso à informação e à reprodução, potencializou essa dificuldade. Ficou muito fácil violar os direitos autorais. Sou professor, dou aulas em algumas faculdades e existe a chamada monografia de final de curso. Alguns estudantes, infelizmente, acabam indo à rede em busca de trabalhos, tomando a obra alheia como se fossem sua. Numa das instituições em que leciono, um aluno apresentou um projeto brilhante. Acabou contratado por uma grande corporação, que adotou a proposta do rapaz. Só que ele tinha utilizado o projeto de um ex-aluno de uma outra universidade. O autor descobriu e entrou com um processo contra a empresa. O desdobramento pode ser sério, embora se deva destacar que as idéias não são tuteladas pelos direitos autorais.Que exemplo citaria sobre uso de idéias?O ocorrido com o escritor Dan Brown, autor de O Código da Vinci. Ele utilizou em seu livro uma tese acadêmica desenvolvida por dois pesquisadores. Os autores o processaram por violação dos direitos autorais. No início, Brown cometeu um equívoco na defesa, dizendo que nem havia lido o material. Depois foi descoberto que não só tinha lido como anotado. Um escritório especializado o ajudou no processo, amparado no argumento de que as idéias não são tuteladas pelos direitos autorais. Se fosse assim, haveria uma barreira no desenvolvimento da cultura. Ao dar uma aula, por exemplo, eu teria de pedir autorização aos autores que pretendo citar. O que não posso é reproduzir palavra por palavra do que aqueles autores disseram. Dan Brown cometeria contra os direitos autorais se tivesse reproduzido as linhas da tese. Como utilizou uma idéia, pôde dizer que os autores o convenceram de tal modo que até fez um romance.Entramos na era da banalização do plágio?Sim. Resta saber quando é que uma cópia vai constituir plágio. Se eu reproduzir uma frase de um livro sem colocar a fonte vou estar lesando os direitos autorais, com certeza. Se cito o autor, não estou. Se não há o direito de citação e uso a obra alheia, preciso da autorização do autor. Quando um intérprete canta a música de um compositor, idem. Amanhã ou depois, gostei tanto dessa entrevista que decido utilizá-la com meus alunos. É uma reprodução. Para não ferir o direito autoral, devo pedir licença.A legislação dos direitos autorais é nova, mas se pode dizer que já tenha alterado o relacionamento com as fontes?Nunca, pelo menos aqui no Brasil, houve tanta preocupação com os direitos autorais. Há também um fator de mercado: estamos falando de uma propriedade. O conhecimento dos direitos autorais se tornou fundamental para não cometer violações que amanhã ou depois possam trazer problemas financeiros.Em que ponto a lei é mais suscetível?O sistema protege muito mais a indústria que explora os direitos autorais do que o autor. Vou dar um exemplo. No preço de capa de um CD, um autor ganha de 7% a 13%. O resto fica com a gravadora e com as lojas que vendem o produto. Vamos levar em conta que além do autor da música tem o intérprete, que pode ser uma banda. Todos esses autores de fato ficam com 7% a 13%. A saída para alterar essa conta é a organização dos autores, busca por espaços alternativos, trabalhar melhor a função social da propriedade intelectual. É preciso lembrar que a sociedade tem um dever de divulgar a cultura. Muitas vezes é mais importante para um autor que sua música circule na internet do que ter de penar para dividir 7% entre várias cabeças.

Interatividade

Você conhece alguma iniciativa educacional que ensina crianças e adolescentes a respeitar os direitos autorais? Qual?

Envie sua história para o e-mail leitor@gazetadopovo.com.br.