Uma "norma de execução" editada pelo governo federal aumenta de um para quatro os critérios a serem usados em desapropriações de terras para fins de reforma agrária no país. Agora, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) avaliará não só a produtividade da área, como ocorre hoje, mas também se o proprietário cumpre as leis ambientais e trabalhistas e, ainda, se o imóvel atende às exigências de bem-estar dos seus trabalhadores. Mesmo sem dados oficiais, a superintendente do Incra no Paraná, Cláudia Sonda, diz que a medida amplia as possibilidades de desapropriações no estado.
A medida, válida para todo o país, mexe diretamente com o Paraná, onde os bolsões improdutivos, passíveis de desapropriação, estão cada vez mais raros. Até hoje, 5% do território paranaense, o equivalente a nove vezes o tamanho de Curitiba, já foram destinados à reforma agrária. Nesses 4.065 km2 vivem 19.510 famílias em 311 assentamentos. E o estado ainda precisa dispor de mais 1,5% de sua área para alocar as 6 mil famílias que aguardam acampadas na beira de estrada ou em propriedades ocupadas. Os fiscais do Incra já estão autorizados a usar os novos critérios nas fiscalizações.
Até então, consideravam-se apenas critérios de produtividade, medidos pelos graus mínimos de 80% de utilização da terra e de 100% de eficiência na exploração. Mas os critérios da "norma de execução", publicada anteontem no Diário Oficial da União, ainda precisam ser definidos por meio de portarias interministeriais. No caso ambiental, envolvendo os ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente. Em princípio, desapropriações poderão ser feitas apenas em casos de crimes ambientais, como destruição de mata nativa, poluição de rios, entre outras agressões, ficando de fora as infrações administrativas.
A chefe da Procuradoria Federal Especializada do Incra no Paraná, Josely Trevisan Massuquetto, diz que a medida do governo não traz novidade, já que a função social da propriedade e seus quatro critérios consta desde 1988 no artigo 186 da Constituição Federal. Esses critérios já poderiam estar sendo aplicados sem essa "norma de execução", mas com ela o ato administrativo ganha mais legitimidade. "Há uma visão equivocada de quem pensa que a propriedade só precisa ser produtiva. Ela tem de ser produtiva, cumprir as leis ambientais e trabalhistas e ser fator de bem-estar social", diz Josely.
Muito antes dessa norma, o Incra já havia ingressado na Justiça com ações de desapropriação de terras em Santa Catarina e em Minas Gerais, no primeiro caso por crime ambiental e no segundo, por quebra do bem-estar social em decorrência do assassinato de cinco trabalhadores rurais dentro da fazenda, em 2006. Os processos estão em fase final de tramitação. Com a nova norma, o Incra precisará contar, por exemplo, com laudos do Ibama para as questões ambientais, do Ministério do Trabalho para a trabalhistas.
Críticas
A União Democrática Ruralista e a Sociedade Rural Brasileira dizem considerar a medida "abusiva", por dar superpoderes ao Incra. O presidente interino da Sociedade Rural do Paraná (SRP), Fernando Prochet, considerou inoportuno o momento da edição da medida pelo governo, justamente quando se discute mudanças no Código Florestal brasileiro. Segundo ele, a SRP está atenta à necessidade de inovações e já convidou organizações como a WWF e SOS Mata Atlântica, além de políticos como o ministro Reinhold Stephanes, para discutir questões relacionadas ao meio ambiente e produção agrícola. "O produtor rural é o maior defensor do meio ambiente, e de repente publica-se uma medida sem considerar que o produtor tem a dizer", critica.