Apesar de os investimentos em ciência, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento no Brasil terem aumentado na última década, o país se mantém na contramão da tendência internacional: o setor público ainda investe mais do que o privado e os pesquisadores seguem restritos às universidades. O investimento passou de 1,30% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2000 para 1,57% em 2009. Mas a estrutura de financiamento permaneceu inalterada: 54% dos investimentos são feitos pelo poder público e 45% por empresas. Os dados são do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
A relação é bem diferente em países desenvolvidos que são referência em inovação e tecnologia. Nos Estados Unidos e Japão, o setor privado foi responsável em 2008 por 67% e 78% dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, respectivamente. Nesses países, as empresas detinham 75% do total de pesquisadores, como doutores e mestres. No Brasil, as empresas contavam com apenas 26%, em 2008, reflexo da presença maciça de pesquisadores em universidades dos cerca de 200 mil profissionais, 135 mil trabalhavam nessas instituições.
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação não divulgou ainda os dados do último ano sobre os investimentos, no entanto, especialistas reforçam que as proporções entre o financiamento público e privado e entre pesquisadores nas academias e na iniciativa privada permanecem as mesmas.
Na prática, o cenário brasileiro está em alerta em relação às metas de desenvolvimento estabelecidas para os próximos anos, afirma o reitor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Carlos Eduardo Cantarelli. "Perdemos muitos pesquisadores para o exterior, justamente em função dos poucos investimentos feitos pela iniciativa privada no país", diz ele, que cita a engenharia como uma das áreas estratégicas mais afetadas. "Principalmente porque precisaremos de gente qualificada para as muitas pesquisas que surgirão nas áreas de nanotecnologia e exploração do pré-sal."
Competitividade
Para o reitor da UTFPR, a resistência das empresas em investir em novas tecnologias e pesquisas também compromete a competitividade dos produtos brasileiros nos mercados externos. Em outros países exportadores, como a China, 72% dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento são feitos pelas empresas. Na Coreia do Sul, o total de recursos utilizados no desenvolvimento de novos produtos e tecnologias chega a 3,3% do PIB nacional.
"Todo o investimento do governo não se traduz em retorno para a sociedade: depois de formado, o pesquisador não encontra no mercado apoio para a continuidade de suas pesquisas", analisa a economista Solange Lima Barbosa, doutora em Administração da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Projetos unem universidades e empresas
Como forma de incentivar pesquisas na área de ciência e tecnologia, tanto dentro das universidades como no setor privado, programas do poder público têm surgido como alternativas para pesquisadores e empresários. A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) investirá até o fim de 2012 cerca de R$ 75 bilhões no Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que prevê recursos a serem aplicados, na forma de crédito, em projetos inovadores de empresas. Por outro lado, o Finep segue sendo uma das principais fontes de recursos para universidades, tanto públicas quanto particulares somente neste ano, seis projetos já foram contratados no Paraná, com a previsão de R$ 9,3 milhões em repasses.
Outro mundo
Em nível municipal, a Agência Curitiba de Desenvolvimento, ligada à prefeitura, tem procurado aproximar empresas e universidades, por meio do Programa Tecnoparque (veja box). Uma das principais parceiras do programa é a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), que conta atualmente com 21 empresas instaladas nas imediações da instituição, utilizando laboratórios e pesquisadores.
"O Tecnoparque não é apenas um aluguel de espaço. Por meio desse trabalho em conjunto com as empresas, nossos pesquisadores estão vendo resultados práticos, seus produtos estão sendo colocados no mercado e patentes estão sendo registradas", relata o pró-reitor de de Pesquisa e Pós Graduação da PUCPR, Waldemiro Gremski. "A vida do pesquisador muda, ele percebe que existe um outro mundo onde sua criatividade é mais útil", completa.
Brasil, nota A em teoria
A maior presença de pesquisadores nas universidades põe o Brasil no topo da lista da produção científica do mundo. O país é o 12.º no ranking de artigos publicados em periódicos internacionais, sendo responsável por 2,7% de toda a produção científica mundial. As principais áreas estudadas em publicações nacionais são as Ciências Agrárias e Ciências dos Animais e Plantas, segundo o Ministério da Ciência, Tecnológica e Inovação.
Por outro lado, o Brasil é somente o 46.º no número de registro e concessões de patentes de novos produtos e tecnologias. Em 2009, o país teve 148 registros concedidos, contra 9.566 novas patentes conquistadas pela Coreia do Sul. Para o diretor de Operações Tecnológicas do Instituto de Tecnologia para o Desenvolvimento (Lactec) a prática acadêmica de priorizar as publicações ao invés de formar parcerias para projetos com indústrias e empresas é também responsabilidade do baixo financiamento privado.
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Interatividade
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