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Isolados na China

A Muralha da China, um dos principais pontos turísticos do país: símbolo maior de quando o país era dominado por dinastias centenárias e vivia isolado do restante do mundo | Wikimedia Commons/ Ahazan
A Muralha da China, um dos principais pontos turísticos do país: símbolo maior de quando o país era dominado por dinastias centenárias e vivia isolado do restante do mundo (Foto: Wikimedia Commons/ Ahazan)
Destroying Chinese War Junks, do inglês Edward Duncan : batalha da Guerra do Ópio |

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Destroying Chinese War Junks, do inglês Edward Duncan : batalha da Guerra do Ópio

Não é de se estranhar que quase tudo o que usamos de eletrônico tem embaixo a escrita Made in China. O país, sozinho, é responsável por produzir 95% dos aparelhos de mp3, 75% dos brinquedos e 65% dos monitores que existem no mundo. Este forte comércio cria­­do com os outros países – que levou os chineses a ser a segunda po­­tência mundial – se deve à abertura econômica. Mas esta troca comercial está longe de fazer parte do que historicamente foi o país asiático. A China já esteve totalmente fechada ao mundo: no final da Dinastia Ming (1368-1644), os chineses se voltaram para si e só se abriram novamente, à força, quando tiveram de enfrentar o vício que massacrou boa parte da população. As duas guerras do ópio contra a Inglaterra (1839-1842 e 1856-1860) levaram à decadência o círculo imperial dinástico que inevitavelmente teve de dar boas-vindas para a república (outubro de 1911) – um novo formato político que esse ano completa um século."A China historicamente está pendulando sempre em se abrir e se fechar. Toda vez que ela consolida o poder, se fecha e, depois, se abre por causa das invasões", explica o professor de história das relações internacionais Severino Ca­­bral, membro do programa de pós-graduação em Estudos Es­­tra­­tégicos da Universidade Federal Fluminense. O que levou inicialmente a China a se fechar para o resto do mundo, ainda no período imperial, é um tema que divide opiniões.

Até o século 17, o país era soberano nas navegações e tinha produtos que despertavam o interesse do mundo inteiro (seda, chá, o pa­­pel, a bússola e a pólvora, que ha­­via criado). Os chineses sabiam que eram autossuficientes, pois tinham uma agricultura altamente especializada, mas mantinham o co­­mércio aberto porque ouro e pra­­ta sempre interessaram a qualquer nação. A decadência da Di­­nastia Ming e a ascensão da Di­­nastia Man­­chu (1644-1911), po­­rém, trouxe algumas novas características para o império chinês.

"A [dinastia] Manchu consolidou áreas da conquista mongol na China e configurou esta placa que vai da Manchúria até o Tibete, conhecida como China Interior. Era, agora, a China com maioria chi­­nesa", afirma Cabral. Como a Dinastia Manchu esteve mais centrada no domínio territorial, ficou baseada em uma elite de guerreiros e cavaleiros e não mais em navegadores. "Por isso o país teve es­­te elemento de repulsa com o restante do mundo", comenta Cabral.

Numa visão mais ampla, a China sempre teve dificuldades em lidar com os estrangeiros, se­­gundo o historiador André da Silva Bueno, da Faculdade Es­­­ta­­dual de Filosofia, Ciências e Le­­-­tras de União da Vitória. "Quem fecha a China é a última dinastia, que faz uma política terrível de segregação. Este império lança o país no atraso, bane as pesquisas, é contra o uso de armas de fogo [por temer que elas fossem usadas contra o imperador] e desestimula os chineses a me­­lhorar de vida."

A autossuficiência da China é outro fator que a levou o país a não se abrir para outros países, de acordo com o professor de História e Sociologia João Gilberto da Silva Carvalho, da Universidade Veiga de Almeida. "A China não precisava dos produtos produzidos no ocidente. Quando a Dinastia Manchu acaba com as grandes navegações, por causa dos altos custos, o país se fecha", diz Carvalho.

Abertura

No século 19, após o ópio (produzido na Índia) ter sido "clandestinamente" inserido na China e viciado boa parte da população, o país foi forçado a abrir seu mercado novamente depois de conflitos armados com a Inglaterra que ficaram conhecidos como as Guerras do Ópio. "O ópio não fazia parte do costumes chineses, mas foi introduzido e virou uma praga social que só fez sobrar os últimos resquícios do poder e cultura imperial", afirma Severino Cabral. A população estava viciada e o imperador proibiu a entrada de ópio no país. Enquanto isso, a Grã-Bretanha tentava abrir este comércio. O resultado foi uma série de revoltas.

Depois de ser forçado a se abrir comercialmente, o império chinês entrou em decadência e a república foi inevitável (em 1911). A China, conforme explica Cabral, chegou a se fechar novamente de 1966 a 1976, durante a Revolução Cultural (Mao Tsé-tung tentou reverter o fracasso da economia chinesa e isolou o país). Mas, com a volta da repressão em 1971, teve de se reabrir. O grande líder responsável pela abertura da China foi Deng Xiaoping, que sabia que, para o país se tornar poderoso e forte, deveria ter uma economia poderosa e forte. "Isso é impressionante. Em três décadas a China se tornou a segunda economia mundial, cresce 10% ao ano e hoje é um dos países que modera a crise deflagrada no mundo", explica Cabral. O que é difícil explicar, inclusive historicamente, é como um país segue preceitos socialistas e tem uma economia capitalista que beira a selvageria.

O grande símbolo separatista

A Grande Muralha da China é o símbolo mais característico do isolamento do país. A sul e a leste, a China é separada dos outros países por mar, a oeste pelas cordilheiras do Himalaia e a norte pelas muralhas que hoje têm 6,4 mil quilômetros. Em alguns trechos, as muralhas inicialmente foram feitas para separar divisas (funcionavam como uma espécie de aduana). Mas, quando o império unificou todo o país que estava segmentado, a muralha começa a ganhar mais vulto. Dife­rentes dinastias e construíram, unindo as partes já existentes. "É um perío­do em que o território tinha muitos chineses, mas não existia ainda a China. Para constituir esta unidade, foi feita a muralha. Tudo o que estava dentro dos muros era a China e o que estava fora era o resto", explica o historiador Severino Cabral. Impor­tante lembrar, porém, que a Grande Muralha nunca impediu que os outros povos atravessassem e conquistassem a China. "As muralhas são a exposição dos regimes mais fechados que a China teve", afirma o historiador André da Silva Bueno. É a marca da política isolacionista dos chineses.

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